É noite e deslizo com meu carro pelas ruas quase escuras de minha cidade. Ao lado ela me acompanha. Uma sucessão de vias, árvores e lua. Desvio de buracos e placas furadas à bala. Na saída de um colégio reduzo a velocidade, quando alguém passa rápido em frente ao carro, com um virar de rosto assustado. Esse alguém salta para o outro lado da rua e apressadamente vai embora, tomando seu rumo, quando ela fala num tom fora do normal:
— Meu professor!
— Quem? Cadê?
— Aquele homem que cruzou a rua rapidamente ali atrás. Foi meu professor de biologia. Nossa, quanto tempo e ele ainda está aqui dando aula...
Seu sonho era estudar medicina, mas sem recursos, virou professor de biologia num colégio perdido qualquer. Casou e tem uma mulher doente e uma filha linda, de dez anos. Mas não, isso foi há dez anos, a filha agora já tem vinte. Pelo jeito seus sonhos ficaram alojados na saudade dos tempos, seus ideais acabaram findando nas mãos do destino. Uma boa pessoa, como tantas.
Paulo Pegoraro