No rancho fundo, bem pra lá do fim do mundo, onde a dor e a saudade contam coisas da cidade, um compositor amado cantava em versos o Brasil do seu amor, terra de Nosso Senhor.
Vestindo uma camisa amarela, Ary Barroso naquele dia resolvera deixar de lado a música e foi para o asfalto namorar. Encontrou-se com sua amada, Suzana Flag, infelizmente uma mulher de vida fácil, cujo destino era pecar.
Com Ary, em versos ardentes, tornou-se escrava da paixão, vivendo intensamente uma fantasia como musa de escritor vivido, fazendo amor como nubente em núpcias de fogo, sob as mãos de um homem proibido.
Apesar do amor intenso, uma grande diferença os aguçava então. Suzana era torcedora apaixonada pelo Fluminense. Seu amado, querido e desejado era flamenguista roxo. Doente pelas cores do "Mengão".
Ary a amava com fervor, mas sentia uma dor aguda n'alma ao ver sua amada torcer para aquele time que lhe causava tanto horror.
Diferenças a parte, era época especial. Jogava-se a copa do mundo que era disputada no Japão. E lá foi o ilustre casal para a Terra do Sol Nascente assistir ao jogo final.
O vencedor mostraria suas garras de maior time do planeta e teria a consagração definitiva de campeão dos campeões.
O jogo disputado era pano de fundo para a traição ordinária que o destino traçara para acabar com aquele amor sem solução: __"Ninguém consegue amar o inimigo de seu clube do coração!"
Ao término do primeiro tempo, Suzana foi ao banheiro e se perdeu na multidão. Naquele esfrega-esfrega, o calor de corpos ardentes roçando sua imaginação a incendiara, deixando-a com inebriante tesão.
Sob um céu estrelado, desejos a levaram para inusitada ocasião. Suas mãos encontraram outras mãos que empunhavam uma bandeira de seu tricolor das laranjeiras.
O sangue ferveu de emoção e sob o símbolo de sua vida ela se entregou a um novo amor que lhe incendiou o coração.
Seu inesperado amante chamava-se Nelson Rodrigues e também a desejara com enorme efusão.
A cor da traição manchava a camisa amarela e a dor mostrava sua face: Ary chorava a perda de sua amada pelos quatro cantos da solidão.
Num repente, suas lágrimas embaçando a desatenta visão quase o impediram de gritar gol. O Brasil saia do zero em jogo de decisão.
Para que chorar? A taça estava tão perto que nada mais valia a pena à não ser torcer pelo Brasil campeão.
Sobre aquele gramado verdejante, o centroavante canarinho em veloz jogada ruma para a meta adversária e arranca mais um grito preso na garganta da multidão: É gol...é gol...é gol do Brasil!!!!
E Ary canta febril: ôôôô...Brasil...ôôôô...Brasil!!!!!
Não há problema que resista, nem há crise que nela se invista. O futebol é a magia da solução.
O juiz apita o final da partida e a multidão louca invade o campo em alucinada comemoração.
Num lance do destino, Ary encontra Suzana abraçada a Nelson cantando a vitória da seleção. A alegria é maior...menor é a traição.
O futebol lava a alma e juntos, felizes, cantam a vitória da seleção: " É penta...é penta...é pentacampeão!
E segue a vida como ela é. Bonitinha, mas ordinária!