Acabou o efeito do ópio, resta a amargura da realidade, sem poesia. Ela não espelha a beleza dos sonhos, mas sim acentua o cheiro fétido da latrina de todo dia.
A imagem que registra a conquista da fantasia, no picadeiro do circo futebolístico, é a Rua da Bosta, no Jardim Irene, onde um herói salvará vidas em nome da alforria.
Sou cem por cento, esperança: chegará o dia em que não veremos mais a morte de uma criança, esquelética nos braços da hipocrisia, enquanto caminhamos seguindo tola ideologia.
A discussão gera violenta explosão. Mata-se por religião, em nome de um deus de oração. Mata-se por educação: — "Com licença, morrerá por não abrir a porta da solução!"
O povo brasileiro precisa de um dia de reflexão. Um dia para mostrar o quanto é apenas massa de manobra de poderosos que jamais da ganância se distanciarão.
Não falo apenas do Zé Povinho. Falo de todos nós: advogados, jornalistas, professores, engenheiros, cientistas, letrados, intelectuais, profissionais liberais. Falo de todos, sem distinção.
Falo daquele que sabe e nada faz. Ou apenas esperneia achando que não há solução. Falo também daquele que nada sabe e acredita na política tradicional da idiota representação.
Proponho sairmos de casa e ocuparmos as praças para mostrarmos a realidade da Rua da Bosta que a todos abriga, sem redenção.
Proponho a marcha da verdade, rumo a uma nova nação. Não enfrentaremos políticos com suas idéias vãs e pensamentos de ocasião, mas sim a nossa pouca capacidade de mobilização.
Proponho sairmos às ruas para pensarmos e agirmos contra a nossa mediocridade existencial, aquela que nos faz omissos e telespectadores de televisão.
Proponho um dia de pensar: Vamos mostrar que somos agentes do nosso próprio caminhar, rumo à liberdade de agir e da conscientização de que somos responsáveis pela vida, qualquer uma, e não somente população amorfa de um Estado que pouco faz pelo nosso existir e respirar.
Um dia de reflexão. Fazemos isso toda hora, quer em glória a todo santo em procissão, ou mesmo em homenagem a algum homem que nos liderou em qualquer direção.
Seguimos a todos sem qualquer questionamento. Basta ser feriado para deixarmos nossos empregos e viajarmos para qualquer lugar onde seremos engolidos pelo tráfego, seguindo um veículo em ilógica locomoção.
Seguimos as contas mensais que pagamos divididas em vezes sem juros, em crédula certidão: Aproveite, estamos em liquidação!
Como somos tolos na busca incessante da nossa casa própria, construída com tijolo de prestação.
Proponho um simples dia de reflexão. Um dia de conversa, de amizade, de liberdade de sonhar e viver sem obrigação de morrer pela produção que jamais chegará à mesa de todos nós. Não saboreamos produtos de exportação.
É uma proposta ingênua, eu sei, mas atrevo-me a imaginar que ainda possa sua vida resgatar. Lembra-se quando sonhava com a igualdade entre os homens? Cante ainda aquela canção: Somos todos iguais, braços dados ou não!
É meu amigo, acha que não vale a pena? Está certo, estão chegando as eleições. Faça um xis num nome em exposição, depois volte para casa e ligue a televisão.
Com sorte, seu candidato será vitorioso e resgatará a dignidade de toda população. Teremos mesa farta, bons salários, emprego à vontade e uma vida cheia de felicidade.
Cá entre nós, você ainda acredita nisso, com sinceridade?
Douglas Mondo