Sei que não foi atitude
das mais corretas, mas espiei pelo buraco da fechadura um pouco daquela
reunião. Discutiam vida desde felizes desconhecidos até o
Professor de Melancolia de Machado. Alguns exaltados, outros mais calmos;
a pauta da vez: felicidade.
Levantou a voz alguém.
Dizia que a felicidade é o grau máximo da evolução,
que todos a alcançaremos num quando qualquer, que isso, que aquilo.
Disse, disse, disse até que o mediador da reunião tomou-lhe
a palavra e concedeu-a ao ilustre professor. Esse, por sua vez, com seu
ar triste limitou-se a assinalar que a felicidade é uma ilusão.
Seguiu-se um silêncio.
Resolvi me retirar. Ia me
distanciando da porta enquanto a reunião se ia retomando. Quando
já estava bem longe, era possível ouvirem-se berros. O clima
estava esquentando, a discussão deveria estar interessante e tudo,
mas decidi discutir comigo mesmo o que era a tal felicidade, alheio às
opiniões daquele mundo de gente que tentava impor aos outros suas
próprias. Na discussão comigo, ao menos, nada me é
imposto e qualquer idéia que eu exponho é respeitada por
todos os que discutem.
A felicidade, disse-me,
não é a euforia desencadeada pela concretização
de um objetivo. Não é o período de contentamento máximo
consigo mesmo, quando o auto-orgulho toma proporções imensuráveis
e você se torna um mito diante de si. Não é a obtenção
do melhor dos empregos – o melhor para você, aquele com que você
sonha desde que começou a sonhar – ou do melhor dos amores.
Não é a sensação de dever cumprido por você
ter atingido o auge, não: isso tudo se chama alegria. Alegria às
vezes tamanha que você, por nunca ter sentido nada de tanta magnitude,
ousa chamar de felicidade.
Logo se descobre que, além
da magnitude, a volatilidade também é uma característica
inerente à alegria. Desfaz-se num lampejo de lucidez, quando a vida
momentaneamente escondida pela ilusão novamente se revela. Se a
alegria tiver sido proveniente da concretização do maior
dos sonhos, a vida real ainda trará consigo uma enorme tristeza:
desfez-se o grande objetivo com sua realização.
Num repente concordei com
o Professor de Melancolia de Machado: “a felicidade é uma ilusão!”.
Mas não, logo ratifiquei: ilusão é a alegria. Questionei-me,
então, o que era a felicidade para mim. Que eu falasse aquilo que
ela era em vez de aquilo que não era. Dei-me meu veredicto.
Felicidade é a vida
sem obstáculos e com sonhos. É estar ciente da possibilidade
de se concretizar tudo quanto é abstrato objetivo e ter forças
para realizar. É não se deixar dominar pelos sentimentos
extremos, seja a tristeza ou a alegria. É poder ser quem você
é e poder sonhar com o que você ainda pode ser. Ser feliz
é, simplesmente, viver.
Após finalizar minha
opinião, concordei comigo.
Bruno Bracco