A simples celebração da existência. A poesia que vem com ardor, quase verde-sumo. Esse mistério nas folhas, nas palavras, na ausência. Eu mergulho no silêncio, donde entro em contato com algo inexplicável. O corpo sem corpo avança com a aparência de uma lufada de um agudíssimo olhar. Então fecho os olhos e escrevo o que lembro na pele do que habita dentro de cada um de nós: “Sempre em nós, mesmo quando falo em mim” . Ah, o silêncio é, antes de qualquer coisa, um semelhante, um círculo de abstrações do bem e do mal. Aprofundando o cenário e a situação, sonhei que estava no mato, obstinado, sem livros ou histórias de amor, nem uma palavra escrita nem um inútil cigarro. O não usual, a terra inexplicável, o vivo. Os sons, as cores, os desenhos de luz. Os equinócios, as constelações, as centelhas. Uma terra onde comeria o que encontrar, dormiria com os insetos, falaria com as árvores. Ofereço-me, sim, ofereço-me, Tumulto Silencioso!. Eu acordo em certas noites crendo que por instantes surpreenderei um anjo. Ele fará um sinal para eu fica quieto. Sentirei o cheiro de alfazema e compreenderei tudo, inclusive os insossos sorrisos, o vazio insaciável, a tão-somente fúria. Eu tive que viajar, mudar a minha vida, para desaprender a vida que não olha nos olhos, guardar no arquivo morto as alegrias histéricas. Hoje eu me satisfaço, por exemplo, lendo poesia. Então leio para o silêncio:“Ó minha Graça, ó Vida de repente,
que loucura medonha e que alegria!”
(Jorge de Lima, Invenção de Orfeu)
Se o mais secreto de todos
lançar uma Palavra
sobre a imensidão da noite
qual o significado de tal conspiração?
Eu serei capaz de ver a queda da tal Palavra invisível
inundando as sombras e o vazio?
Será uma Palavra indelével em forma de enigma
ou virá clara, definitiva,
pronta para ser absorvida por leitores solitários?
Se o mais secreto de todos
desconhecer a língua dos homens,
as letras, o alfabeto, a poesia
terá a compaixão de confessar
a sua dissimulada ignorância?
E nós, os bichos sem juízo, o que faremos
com os confins do silêncio eterno?
A mágica do nada
injuria nossos corações.
Os objetos, mais atentos do que os possessos, aguardam
sem ânsia a Palavra possível.
Nada é necessário, nada, nem mesmo a
giratória espera dos objetos e dos homens.
Mas se a Palavra febril despedaçar
untuosa, úmida, dissoluta? Quem será o responsável?
Quem poderá conter a salvação nenhuma?
Antonio Júnior