Amigos
perguntam-me como escrevo minha crônica, qual é o meu método,
o que é, afinal, uma crônica? Escrevo minhas crônicas
de uma assentada. Não tenho método de trabalho. Sou um indisciplinado.
Às vezes as escrevo nas horas de maior barulho, naqueles quinze
minutos de movimentação ao meu redor, quando me desligo,
ponho o papel na máquina e solto a franga, isto é, a inspiração.
Com a inspiração libertada e a emoção captando
o sentimento represado, os dedos caem aos montões na Olivetti.
Aí vem o que acho mais difícil: disciplinar o que escrevo,
pois são tantas as palavras querendo ocupar um lugarzinho no texto.
Dizia-me o poeta e cronista Brasigóis Felício que o poema
só se faz sangrando. Eu também diria que a crônica
tem muito a ver com o poema, pois sua estrutura, a sua elaboração,
exige também um pouco de sangramento. Sangramento aqui explicado
no sentido de dor, emoção, ternura, paixão, enfim,
todos esses sentimentos que sufocam a ânsia de viver.
Quando estou elaborando minhas crônicas, visto os parâmetros
emocionais, ponho minha vida em ré, entro em levitação
e passo a conversar com os deuses, ou melhor, com as deusas. É um
momento solene para mim. Cada crônica tem sabor de poema, porque
é feita com muita ternura, em minutos de recolhimento. Mesmo quando
busco a memória escondida no poste esquerdo do passado, como uma
lembrança, um vulto querido, um grito uma fala — tudo que evoca
saudade, sentimento — é possível transportar às páginas
da crônica, desde que eu esteja paramentado, isto é, embriagado
pelos fluidos da emoção. Emoção que rima com
solidão. Pois o escritor é essencialmente um homem resignado
à solidão. Um homem que carrega consigo um deserto, e quanto
mais se expõe à selva do asfalto, com suas idéias,
mais ele se fecha no quarto-crescente de suas dores emocionais. O cronista
é aquele escritor que sai de lanterna na mão alumiando vida
e redescobrindo novos caminhos. Um fato, um gesto, uma lágrima furtiva,
um sorriso, uma menina abandonada na Praça Cívica de nossos
olhos, tudo se transforma nas letras desse reinventor da vida.
O cronista é um homem comum, que tem o dom de ver o cotidiano com
os olhos da emoção.
José Mendonça Teles