São sessenta dólares e dez...
Eu entreguei ao motorista sessenta dólares e uma moeda de dez centavos.
Não entendi porque o homem ficou nervoso e desandou a falar muito rápido e muito bravo. Repetia continuamente a palavra dez.
Pois então! Eu lhe dei os dez.
Meu tio apareceu, deu dez dólares ao motorista e resolveu a questão.
A meu lado, minha irmã ria até as lágrimas. Eu não entendia:
Pois não eram dez centavos? Ten cents?
Eram dez por cento.
Mas...
Meu tio, que só falava inglês, mostrou-nos a casa e disse que teríamos tudo o que precisássemos, sem preocupações e....
Eu me sentia tão orgulhosa de meu inglês! Entendi a palavra tip. Na lição nove de meu livro, havia uma lista de tips dicas de viagens que um amigo dava a outro: tenha sempre à mão um mapa e um dicionário de bolso, coisas assim.
Respondi a meu tio que certamente eu contava com seu auxílio para me dar todas as dicas necessárias. Minha irmã desandou a rir novamente e meu tio arregalou os olhos.
Você acabou de dizer ao tio que espera que ele pague todas as suas gorjetas e minha irmã tranqüilizou o tio, em seu inglês impecável.
Mas... tip não é dica?
Oh, poupe-me! E o contexto?
Mas que contexto?
Assim passaram-se dez dias. Eu dizia, por exemplo:
Nós iremos ao lago Louise depois do feriado se não chover.
Bem, como o guia falou em inglês, existe sempre a possibilidade de ele ter dito alguma coisa completamente diferente e minha irmã, sempre bem humorada, completava Nós iremos ao lago Heloísa antes do feriado mesmo que continue chovendo, por exemplo.
Que dias terríveis! Eu entendia todas as palavras-chave: lago, almoço, chuva e perdia todos os elementos de ligação: antes, depois,mesmo que, somente se etc.
Pedi à tia roupas de cama, por medo de errar na pronúncia da palavra lençol e acabar falando um palavrão.
Shit, explicou minha irmã, com sua elegante entonação.
Mas na excursão para as Montanhas Rochosas as coisas mudaram. Havia canadenses de Quebec e suíços que só falavam francês e foi minha vez de servir de intérprete para minha irmã. E, como ela estava em companhia do namorado, eu me sentei ao lado de uma irlandesa, muito doce e atenciosa, que viajava sozinha. Ela me fazia perguntas e mais perguntas sobre o Brasil e por sua vez contava-me sobre a Irlanda.
Eu me sentia cada vez mais segura de meu inglês e orgulhosa de meu progresso. Minha irmã, lá do seu canto, lançava-me olhares de aprovação e incentivo.
Todas as noites, no quarto, eu resumia para minha irmã as longas conversas que tinha com a irlandesa. Eu estava realmente muito satisfeita com a facilidade com que me comunicava com a nova amiga.
Então houve aquele almoço, em que perguntei para minha companheira se ela nos acompanharia na gôndola. Falei devagar, mas firme, pronunciando cada sílaba com clareza:
Do you go to the top of the mountain by gondola after lunch?
Seus encantadores olhos azuis me sorriram com simpatia:
Oh, yes! My tomato soup is delicious! and yours?
(Oh. Sim, minha sopa de tomate está deliciosa! E a sua?)
Sonia Rodrigues