Eu queria fazer uma canção para a cidade de New York, para que todas as pessoas que vivem nela à noite pudessem ouvir e esquecer dos becos que escondem toda a sujeira das ruas depois das oito horas da noite.
Trago os olhos nos jornais e nos cartões postais que os olhos dos fotógrafos revelam nos folhetos pregados nos postes e dispostos nas vitrines ao lado de manequins que me fitam como se nada tivessem para olhar.
A Marilyn Moonroe me prende com seu jeito de deusa a me olhar dia e noite através da janela do pôster do cinema da esquina, e ela me convida para dormir sob as luzes de néon em um quarto qualquer de uma rua perdida da linda e noturna cidade de New York .
O telefone chama no canto do quarto na penumbra e a voz da telefonista enche o quarto de mensagens inexistentes de um amor perdido em algum ponto do passado. Em qual rua de New York eu possa estar ? Pergunto para as paredes dos muros escritos em grafites tão negros como a boca da noite que se abre sobre Mahattam. Em qual rua de New York City eu possa estar? Eu me viro pro espelho que me olha e me acompanha por tantos e tantos anos, com os mesmos olhos meus que não consigo fugir.
Através do braço escuro da rua que se abre lá fora, a penumbra dos beijos comprados e dados em carros que se passam, em quartos de hotéis, nas salas de cinemas; eu me calo.
A cidade de Nova York me engole vivo com suas historias de amor inacabado; com as cenas de teatro interrompidas porque o bandido fugiu no ultimo ato; e porque o trem que ia chegar as sete da noite só vai chegar logo mais, as oito e pouco; e por causa disto, as cartas nas caixas do correio ainda não foram lidas até agora.
Se sento em um banco na rua, as luzes de New York City me cegam e não me iluminam como a luz da lua, que ofuscada, esta tímida no céu a brilhar pálida. Não ouço a batida blue das guitarras nos bares de Chicago e nem o bandolim que chora pelas ruas de Nashville. Aqui o palhaço da Broadway desfila quase nu pelas ruas e canta canções que Bob Dylan esqueceu de compor e as deixou na gaveta de seu criado surdo-mudo.
Alguém toca um saxofone ao longe e um outro alguém assobia – satisfaction – do Rolling Stones.
Olho a lua no céu e as estrelas estão de férias para a cidade de Nova York. As estrelas da cidade brilham nas esquinas, seminuas e com sorrisos avermelhados de batom sabor de morango. Elas iluminam qualquer noite por algum punhado de dólares e depois somem nas ruas escuras desta cidade abandonada que se chama New York City.
Onde encontro um letreiro que me guie de volta a minha cama ao lado de minha amada ? – pergunto eu a todos os letreiros luminosos e coloridos da cidade de Nova York e eles não me respondem.
Olho um pôster de Rita Hayworth na parede de um imenso luminoso quadro e ela me olha com os olhos de paixão e eu fujo daquele olhar como o diabo foge da cruz. O olhar dela é faca de dois cortes que fere e corta. Volto as costas para os olhos de Rita Hayworth e finjo que não a vejo, e que nunca a vi...
No muro daquela rua, entre o lixo e a escuridão de um poste ao outro, uma mensagem grafitada na parede me acorda para abrir os olhos e passo pela mensagem como quem passa por uma lata de lixo.
Um carro passa em alta velocidade. Um avião risco o céu a esta hora da noite. Uma janela de hotel esta acessa lá atrás. Uma vitrine convida para a moda de amanhã. O vento passa desapercebido pela janela, assim como a lua esta desapercebida no céu da cidade de Nova York.
Nem todas as mensagens são decifradas pelos programas da tv e pelas ciganas que andam pelas ruas escuras de New York. A mensagem fica no muro estampada – Esperar não é saber – brilha na canção que o cantor já não canta mais madrugada adentro.
Rogério Lima
13/2/2003- 23 30 hs
Satisfaction – The Rolling Stones