A praia de Ipanema hoje pareceu-me estranha. Ameaçada pela possibilidade de não mais ser minha. Distanciava-se de mim, enquanto temia perdê-la. Dei-me conta, então, de que há dois anos não é mais a mesma. Lá, já não encontro amigos. A água hoje turva em nada lembra Ipanema dos bons tempos do Posto 9, quando o clima era de festa. Temendo não tê-la, constatei que há muito ela já não me pertencia. E voltei para casa sem cumprimentar amigos. Como um estrangeiro de visita numa praia estranha.
Como um rio sem berço, fonte sem nascente, voltei para o bairro que hoje me abriga, que leva meu nome sem conhecer-me e no qual transito reparando para familiarizar-me. Se eu tiver que deixar o Rio de Janeiro, ou se aqui ficar, refaço meus laços. Hoje, a cidade não me acolhe. Hoje, alimentam-me as lembranças. Os hábitos mudaram. Estive alheia. Saí do coma. Onde estou, então, se aqui não é minha cidade? Investigo os cantos que me abrigariam, pra descobrir novos recantos, fazer novos amigos, cultivar os antigos como rosas, como vinhos. Renascer madura, rio novo que irrompe do escuro da terra para o solo fronteiriço. Perdi Ipanema hoje, como na infância perdi a Praça Malvino Reis, meu pai e o Minas Tênis Clube.
E outras cidades, onde ficam?
Há um ano estou estudando para um concurso e eis que sai o edital, e a lista com as cidades onde há vaga (uma). SE eu passar, tenho que listar as cidades em ordem de preferência.
Onde tem praia, cachoeira, rio? Onde é roça? Onde tem universidade? Onde é perto do Rio? Onde não tem inverno?
Rio Branco, Arapiraca, Macapá, Barreiras, Camaçari, Teixeira de Freitas, Juazeiro, Vitória da Conquista, Colatina, Imperatriz, Araçuai, Conselheiro Lafaiete, Curvelo, Governador Valadares, Montes Claros, Paracatu, Poços de Caldas, Dourados, Rondonópolios, Cuiabá, Marabá, Santarém, Garanhus, Petrolina, Teresina, Cascavel, Foz do Iguaçu, Maringá, Ponta Grossa, Porto Velho, Boa Vista, Bagé, Cachoeira do Sul, Carazinho, Caxias do Sul, Ijuí, Lajeado, Novo Hamburgo, Passo Fundo, Rio Grande, Santa Maria, Santana do Livramento, Santo Ângelo, São Leopoldo, Uruguaiana, Lages, Araçatuba, Araraquara, Barretos, Franca, Marília, Presidente Prudente, Palmas.
Estou numa roleta. Não dá pra parar agora. É como um trampolim. Uma vez lá em cima, é fechar os olhos e pular.
Querida Glória,
Não se desespere. Você não precisa necessariamente
morar em Juazeiro. Há também Arapiroca, digo, Arapiraca,
Acuaí, digo, Araçuai, Ponta Grossa (ui!), Caralhinho, digo
Carazinho e até um Garanhão, digo, uns, Garanhuns. Enfim,
há várias opções para todos os gostos. Quem
sabe você nem vai mais querer voltar. Pense bem.
Beijos
Sérgio
(Posso viver sem esses cariocas malucos?)
Glória Horta