Há pessoas que amam
as assinaturas na brancura dos papéis timbrados e ficam de tal modo
dependentes do ritual de assinar recomendações, que perdem
a fronteira do ridículo e passam a assinar tudo que encontram pela
frente como se a vida, diante de tanto poder, fosse apenas um guerreiro
vencido.
Não digo que vida
seja tão forte a ponto de não ficar ameaçada pelas
assinaturas. estaria contrariando grande parte da história do mundo.
Mas digo que a vida nunca vai ser soberana na cabeça de quem levou
a vida inteira a admirar sua assinatura como a rainha velha do espelho
da história de Branca de Neve.
O ritual da assinatura é
interessantíssimo. Há os que assinam rapidamente e passam
ao papel seguinte, numa demonstração de domínio pleno
do que assinam. Há os que precisam ler várias vezes, aceitar
a sugestão e ainda assinam temerosos. Há os que assinam com
cara de herói. Há os que nunca assinam, com medo.
Há assinaturas e
assinaturas e não é muito difícil classificar as pessoas
pelas assinaturas que ficam como um carimbo da personalidade. Já
viram a assinatura dos homens simples como são silenciosas e tranq:uilas?
Já viram que as grandes figuras nunca assinam nada sob a luz dos
refletores?
Em matéria de assinatura,
o tipo mais perigoso é aquele que usa a assinatura dos outros. Não
no sentido da falsificação, mas no sentido da transferência
de prestígio, como se uma simples assinatura fosse capaz de resolver
todos os problemas, compensar as deficiências, reembolsar a vítima
de todos os defeitos congênitos.
Gosto de olhar as pessoas
que lançam um desafio e uma questão e, quando o debate alcança
o clímax, retiram do bolso um papel e mostram a assinatura. Reparem
que logo depois esboçam um sorriso silencioso, desses de dentes
fechados, olhos fixos na vítima como uma águia que exibe
a sua presa entre as garras.
Ainda há os que colecionam
assinaturas e são capazes de ficar horas e horas revendo as portarias
do seu currículo, os ofícios religiosos, os recortes de jornais.
Param diante das assinaturas mais importantes como se fosse um grande momento
de emoção. Fecham a pasta, recolocam na estante da sala e
dormem cheios de felicidades.
Assim tem diso a vida dos
que amam as assinaturas. Não sei quantos são, como fazem
nos dias sem assinatura, do que são capazes quando não recebem
um papel timbrado. os amantes de assinatura são prepotentes para
seus subalternos e profundamente subservientes para os superiores. Vivem
felizes e nem notam que desrespeitam a vida.
Vicente Serejo