Mãe
Tristes não, nem saudosos. Alegres, talvez.
Apenas certos de estender aos anos
Alcatifas de coroadas flores.

Não cúmplices, mas pedaços
De uma vida, a mesma, entrelaçados
Por fecundo sêmen, no estertor de
legítimo gozo
De humores a fluir com força:
Momento de evocar-me à luz.

À luz, à luz...Como vim
E vi-me feito à imagem
De Deus, dizem os crentes;
Do Homem, é o que diz Deus.

Há, sim, o entendermos-nos sempre.
Refazer das carnes após o amor de hormônios,
Multiplicar de genes, gestar com paciência,
Parir entre dores, odores, suores
E as sempre lágrimas.
Deu-me o plasma, e o sorvi como a vida;
Deu-me formas, palavras, cores, paladares,
Música, dimensões, poesia
E o sentir,
Que não se é poeta
Impunemente.

De risos, lágrimas, sucessos,
E de tristes, felizes, esperanças
E de entes queridos ou distantes,

A fé no verbo te eterniza em mim.

Este poema, escrito há alguns anos, integra meu livro “Sarau” (página 39).

Dona Lilita, minha mãe – ou Élia Borgese de Aquino Alves (não é Borges, mas Borgese) – nasceu em Conquista, Minas Gerais, em 19 de setembro de 1923 e desencarnou às 23h30 do último domingo, 21 de março, aqui em Goiânia.

Estranho, isso... Mesmo que a gente se imagine pronto, à espera do desenlace, fica num cantinho mais quente do peito um formigamento, e nos olhos, nos cantos dos olhos, uma lágrima de cada lado; teimosas, não aceitam voltar: derramam-se, abrindo caminho para outras mais, cada uma ressuscitando lembranças da infância, da meninice indócil, da juventude de protestos, da fase adulta em que nos julgamos sábios.

Os anos, porém, dão-nos conta de que, a cada dia e cada ruga, cada vez menos sabemos, cada vez mais buscamos conselhos, carinho e apoio. Cada vez mais, mais queremos aprender com a Mãe. Agora, dói...

Luiz de Aquino Alves Neto

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N. E.: Nossos pêsames à Luiz de Aquino, e nossa homenagem à sua mãe.

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