Visita no sítio: perigo iminente!
Não sei quem cunhou a expressão "selva de pedra" para definir aquela anomalia conhecida como urbe; se Janete Clair ou algum eremita. Sertanista não foi, pois aquele aglomerado de cimento e asfalto se parece com tudo, menos com uma selva. Selva é mato, é misto de bicho, árvore, água e gente diferente. Isso é selva; urbe é doença inventada pela humanidade, cujo objetivo deve ter sido juntar os fregueses mais próximos das lojinhas. E ponto final! Se discutir
comigo leva uma estilingada, ou um disparo certeiro da minha zarabatana.
Não se assuste, foi forma de dizer. Não vou espetar seus fundilhos com uma seta embebida de curare, embora não possa negar que me daria enorme prazer. Nem se acanhe diante daquela placa "Cuidado, urbanóide! Minas anti-tanque pela frente, pise com moderação!" lá na curva que traz ao meu ranchinho amarradinho de cipó. Tem mina nenhuma! É só um formigueiro de lava-pé estrategicamente entrincheirado para você chafurdar seu Nike 2- andares dentro e sair pulando feito pipoca em caçarola destampada. É reconfortante observar e-tês urbanos às voltas com as mazelas do campo; um passatempo inofensivo.
De fato, sou até generoso com gente da cidade. Crio inclusive uma galinha com etiqueta de validade grudada nas penas do rabo, para os pimpolhos dos convivas citadinos identificarem o animalzinho que costumam ver, em nudez explícita, nas gôndolas dos supermercados. Ficam felizes que só no zoológico e logo querem levar uma peninha de lembrança e mostrar na escola. Precisam ver seus olhinhos apavorados ao passearmos nalguma picada, quando os mando calar as matraquinhas para não atrair os leões! Parecem estadunidensezinhos, que eu chamo carinhosamente de "meus pequenos Simpsons, venham passear com titio Indiana". Bondade é virtude de que não abro mão.
Confesso que me divirto mais quando levo papais e mamães a um "safari" pelos arredores. Como primo pela profilaxia em detrimento de pânicos repentinos, sempre lhes peço que fiquem atentos a qualquer movimento nas folhas caídas; pode ser alguma sucuri disfarçada de tubo de PVC. Não desgrudam os olhos do chão, os domados. E dão alegres pulinhos a qualquer estalo de galhos e folhas secas.
Caso alguma saracura dê um piado na capoeira, acalmo-lhes o surto histérico explicando que são apenas gritos de guerra de alguns Sioux dissidentes, por questões sindicais, cujos antepassados viviam na Disneylândia, e que não correremos risco de vida se as mulheres lhes oferecerem os espelhinhos de maquiagem que devem ter trazido nas bolsas.
O estratagema em geral não falha. Voltam ao rancho a passos "allegro ma non troppo", fazem as malas e pinicam rapidinho rumo à segurança de suas gaiolinhas com playgrounds e abundantes florestas de meio quarteirão paulista devidamente cercadas e cadastradas na escritura, onde brotam 2,1416 pés de alguma madeira nobre alardeada pela incorporadora ainda na planta.
De resto, deixam hilariantes lembranças, além de razoável volume de garrafas pet vazias, meios potes de cremes e protetores
solares a burlar o cheiro bom da banha após fritar uns saborosos torresmos.
Vão-se as pedras e fica a paz na selva.
Alberto Carmo