Picareta
Certa vez, estacionei o fusca ali à altura do prédio da APLUB para comprar jornais, no Abrigo Central, na banca do Almeida, antes de ir fartar o bandulho no Ideal Clube. Ao voltar para pegar o carro, defrontei-me com um colega de Colégio Sobralense, sobraçando pesada pasta de medicamentos de que fazia propaganda. Estendi os braços, carinhosamente, para saudá-lo e perguntar-lhe como ia. Ele, também muito carinhoso, replicou: “Não vou bem porque não sou jornalista picareta”.
Depois vi que lhe assistia razão para tanta amargura. Fôramos colegas. Escrevia no jornal, no rádio, na televisão. Ia encarar minha lagosta no restaurante de minha preferência, freqüentado pela elite do Estado. E ele ainda ia ouvir desaforos ou palavras de desdém dos médicos a quem ia apresentar as novidades em matéria de remédios.
Logo me refiz do agravo, porque era jovem, o fígado saudável, o prato saboroso e o uísque da melhor qualidade. Apenas a Deus agradeci o ter-me prodigalizado tanta coisa boa. E lhe supliquei jamais ser tocado pela amargura ou pelo ressentimento.
Lustosa da Costa