Assim no shopping como no mundo (?)

           Cansada de andar e ver sentei-me no banco da praça de alimentação, em princípio para que as pernas recuperassem as forças a fim de que depois alcançassem depressa o primeiro ponto de ônibus. Porém, passados dois minutos, dentro dos quais apenas via vultos coloridos cruzarem a minha frente, instantaneamente, como num transe, eu não era mais um corpo pesado e encostado num canto qualquer: os vultos passaram a ter formas, intenções. Lá estava eu, embevecida... absorvendo e descrevendo em minha agenda aquilo tudo, aquele todo, sem que tenha premeditado este estranho passatempo.
            Consumidores passam, desfilam de shorts, bermudas, mini-saias, sempre algo apropriado para o verão do Rio - se bem que nem sempre tão apropriado. Esbarram-se no percurso de léguas em busca de algo que se repete a cada vitrine. Desfilam sob enfeites de Natal pendurados entre os preços e suas ambições de consumo.
           Um vigilante de uniforme preto, porta um rádio com o qual se comunica com outros colegas espalhados pelo shopping. Estaria observando os consumidores, ou os suspeitos, como eu, que não estão consumindo? Uma servente da limpeza aproxima-se dele e cochicha alguma coisa rapidamente, seguindo logo após na direção do toalete.
           Adolescentes em grupos, senhoras em duplas, sozinhas, olhos maratonistas cuja linha de chegada é a boca do caixa de qualquer loja... perdão, melhor que seja loja de grife. À porta dos cinemas aglomeram-se crianças acompanhadas de mães, tias, avós.
           São férias escolares e, para os que não viajam, no meio de semana pegar uma sessão parece a melhor opção, o preço do ingresso cai pela metade e a oferta do gênero infanto-juvenil aumenta. Temos que se levar em conta a falsa impressão de estarmos mais seguros dentro destes imensos galpões refrigerados de luxo e lixo também.
           Aqui, a administração preza muito pela limpeza. De 10 em 10 minutos, passa uma servente com sua pá e vassoura. Estes profissionais são treinados para refazerem o trabalho muitas vezes como se fosse a primeira, apesar de grandes lixeiras estarem bem dispostas por toda a área.
           Parece um espaço ecumênico. Mas só parece. A comida ali oferecida? Chinesa, italiana, árabe, os self services, salgadinhos nacionais, os Mc'D. da vida, entre outros. A propósito, não encontrei ainda em algum lugar nestes shoppings o brasileiro acarajé.
           Pô! quer mais brasileiro? Em alguns lugares aqui do Rio encontramos baianas vestidas à rigor, melhor dizendo, mulheres vestidas à baiana - aquela tradicional saia rodada e branca que o mundo conhece dos Carnavais no Sambódromo, mas sem tanto brilho e colorido, claro - vendendo a picante comidinha. Não são tão comuns como as carroças de pipoca, churros e cachorro-quente, mas elas existem, têm seu mercado”.
           Neste ponto bateu uma tamanha vontade de comer o tal do acarajé, que resolvi largar a teoria e sair em campo na tentativa de provar o que havia escrito... na verdade não queria provar nada, eu estava é com fome mesmo, e fome de acarajé - não sei o motivo, minha gente! Saudades de Salvador? Também.
           Bem, fechei minha agenda, pois agora eu tinha um objetivo, uma missão, eu sei lá. O que sei é que andei por todas as praças de alimentação daquele shopping e não encontrei o dito cujo. Fiz de tudo para não ficar tão aborrecida assim.
           Lembrei-me das palavras de uma baiana que dizia que acarajé pra valer mesmo só o de Salvador, e indaguei mentalmente o que diria ela do acarajé de shopping center... uma lástima - imaginei a resposta – “inadmissível substituir a brisa marinha, o afoxé, por ar viciado e tecnopop, ó xente!”.
           Então resolvi tomar "tendência" e não forçar mais ainda os caminhos da globalização.
           Pensando bem, acho que não resistirei, e algum dia farei uma busca na Internet por um delivery acarajés.

Tânia Barros

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