Aeroporto
Aquele grupo além, só é grupo porque vai partir. Existe para desaparecer daqui. Estou longe. Há sempre distância entre o que faz a fotografia e os que ficam na fotografia. Uma distância eterna. Porque o fotógrafo nunca parte de onde esteve. Fica, para sempre, por detrás da fotografia que fez, por todo o tempo que a sua imagem durar.
Há uma ponta de cor, no negrume de recortes que compõe esta imagem: é a sinalização que indica a porta de embarque F9. E, no entanto, essa não é a porta daquele grupo. Só passou a relacionar-se com ele porque se grudou à fotografia. O fotógrafo assim o quis. À distância.
É fácil perceber que está ali um homem de negócios em fim de carreira, a caminho da derradeira e decisiva reunião da sua vida profissional. Dois jovens apaixonados, colados um ao outro, têm auscultadores nos ouvidos e ouvem a música do seu mundo virtual. Há crianças ensonadas que não percebem porque as condenam à violência daquele momento. Há homens e mulheres de idade que praticam os sorrisos militantes de quem está de férias. Mais ao fundo, vê-se a cabeça reclinada de uma mulher conformada, que lê um livro. Paira um som pesado de vozes sussurradas. Lá fora, do outro lado do vidro, arrastam-se lentamente os vultos dos aviões, como monstros cansados.
Faço a fotografia e guardo depressa a câmara. Os altifalantes chamam para o embarque. E vou. Eu sou daquele grupo. Sou aquela sombra lá no meio.
Carlos Pinto Coelho