CRÔNICA SANTISTA

                        Primeira terça-feira de junho, reunião às quinze horas na Universidade. Corro feito louca para chegar no ponto de ônibus e aguardo o circular 4 durante vinte minutos. Quando ele chega, enorme, balançando-se de um lado para outro, como se rebolasse, há uma multidão esperando-o. E quem se rebola somos nós, espremidos no corredor, em pé. Eu e uma conhecida jogamos conversa fora. ”Que calor”, diz ela. “Ouvi dizer que o tempo vai mudar, trazendo ventania”, respondo. “Não sabia que estava tão quente”, continua ela. “Tenho medo de que chova muito e as ruas fiquem alagadas. Deveria ter ficado em casa”, termina desanimada. Olho-a e penso o mesmo, enquanto o ônibus vai em direção à Conselheiro Nébias. “Vou descer na Gota de Leite”, avisa-me. “Desço antes”, respondo-lhe sorrindo para que ela, sem culpa, ocupe o lugar que vagou. A homarada continua sentada sem importar-se com as senhoras prensadas no corredor.

                  Seguro-me bem, pois o ônibus vai virar à direita para entrar na Conselheiro Nébias. Para surpresa de todos ele passa direto! – Ei! Esqueceu de entrar na Conselheiro! grita a multidão. –E, agora, o que faço? Nunca estive nesta linha! diz o motorista. Fico atônita! Deus do céu! Ele está guiando um ônibus lotado e não sabe o itinerário! – Entra na próxima! grita a multidão. O ônibus vai cauteloso e passa a Rua Ângelo Guerra – Por que não entrou? grita metade da multidão. – Porque é contramão! responde a outra metade. O ônibus bamboleia seu corpanzil, devagar, pela avenida da praia. – Entra na Rua da Paz! grita um senhor confortavelmente sentado. O motorista titubeia: não conhece os meandros daquele bairro.– Será que consigo voltar pra Conselheiro? diz ele. Num piscar de olhos a rua fica para trás. – E agora, o que faço? lamenta-se o “motô”. – Entra no Canal 3! grita o senhor, supimpa conhecedor do tráfego da cidade. – Será que dá? geme o motorista. De repente, ouço-me gritando junto com todos. – Entra no Canal 3! Ele entra e eu fico alarmada: “Cruz credo! Isso pega!” No primeiro farol o motorista pede orientação. –Em qual rua eu entro? pergunta referindo-se à Pedro de Toledo e à Minas Gerais. A multidão se divide. – A primeira! – A segunda! Eu, faço coro com o senhor sentado. – A segunda! O motorista obedece e o ônibus bamboleia, cansado de tanta indecisão, arrastando-se pela Minas Gerais, parando na esquina da Conselheiro. Muitos usuários descem, descontentes.

                   Aberto o sinal, sinto um frio na barriga : “e se o motorista virar à direita e retornar à praia?” Suspiro aliviada quando ele retoma a Conselheiro, na direção certa. Dou o sinal e o ônibus amarelado, bamboleante, indeciso, nas mãos de um pobre motorista estressado, distraído ou despreparado, pára no terceiro ponto. Desço, depressa. Muito engraçado! Viu nas mãos de quem colocamos nossas vidas? Depois dizem ser implicância quando reclamamos do transporte coletivo da cidade. Qualidade de vida? Só se for da sua, cara pálida.

Neiva Pavesi

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