Uma flor de muitas faces
Nos arquivos da Fundação Casa de José Américo, onde tenho pesquisado ultimamente, encontrei a coleção do Correio das Artes, desde o primeiro número. O Correio das Artes, suplemento cultural semanal deste jornal A União, teve seu primeiro número lançado em 25 de março de 1949, e é o mais antigo suplemento literário em circulação do Brasil. E os arquivos da Fundação são um excelente espaço para o pesquisador, com suas coleções de documentos e jornais preciosos para a história da região, muito bem cuidados e catalogados por funcionários apaixonados, com especial louvor para Hilda, Porcina e Ivone, e um elogio extra para o presidente da entidade, o advogado e escritor Flávio Sátiro Filho, à frente de tudo, atento e batalhador.
Entre tantas coisas interessantes, encontrei um artigo do crítico Aderbal Jurema, onde ele divulga um Congresso de Poesia promovido em Campina Grande em 1949 e nos dá uma visão do que era a cidade há cinqüenta anos. O artigo está publicado no Correio das Artes de 5 de maio de 1949, à página 10, e dele reproduzo alguns trechos.
"... a fabulosa e ianquizada Campina Grande, com os seus negociantes de ouro branco, os seus garimpeiros audaciosos, os seus mercadores de automóveis e geladeiras, os seus itinerantes de todos os recantos do país, numa confusão de todos os diabos e num progresso de todos os dias. Campina Grande é cidade de fama, muito conhecida em New York e Londres, Liverpool e Manchester, como o empório mais acintosamente progressista do "hinterland" brasileiro, espécie de São Francisco da Califórnia na fase áurea. No tempo em que o algodão era exportado para a Alemanha de antes desta última guerra corria mundo a anedota do sertanejo eufórico e gastador, acendendo seus "havanas" nas pontas das cédulas de quinhentos mil réis..."
"... Numa cidade destas preocupada com a cotação da bolsa de Wall Street e esquecida de Walt Whitman, (...) esse certame irá trazer um pouco de serenidade de lago naquele turbilhão amazônico de competições comerciais. E só assim cumpriremos o destino de não deixar que a Poesia seja abafada neste mundo pelo ruído das moedas trepidantes. Que a poesia em potencial, dos algodoais da Borborema, dos fundos dos rios onde brilha o diamante de Teixeira e das folhas verdes do agave que está vencendo o algodão, desabroche em maio como uma flor de muitas faces no seu imenso e universal lirismo."
No primeiro volume da coleção do Correio das Artes, onde pesquei esta pérola, há muitas mais.
Clotilde Tavares