O que é que eu sou do Loyola?
Não, não me refiro ao santo, pois o meu santo é outro. Não fui jesuíta e sim salesiano. Sou mais Dom Bosco e/ou Domingos Sávio.
Estou falando do Ignácio de Loyola Brandão, aquele que brande aos domingos no Cidades e na cidade.
Eu sei que existe um grau de parentesco entre nós dois. Além da já velha amizade (desde a Última Hora do Samuel, em 62, quando éramos bem mais jovens do que nossos filhos), além do fato de sermos modelos e atrizes, perdão, jornalistas e escritores, além do fato de ele torcer pelo Linense e eu pela Ferroviária, existe algo entre nós além da morada do sol e a cidade das escolas.
Peço sua ajuda, leitor/a.
É que, antigamente, os graus de parentescos eram bem mais definidos, a coisa era clara, simples. Não havia esta libertinagem parentesca que existe hoje. Tinha avô, pai, filho, primo e tio. Depois sogra, sogro, genro e nora (fora os cunhados e as cunhadas que eu nunca tive). E não se falava mais nisso. Qualquer parente se enquadrava dentro destes status.
Mas o mundo girou, a lusitana rodou e a gente foi ganhando uma nova parentada. Por exemplo, o Nirlando Beirão, que é casado com a minha ex-mulher, a Marta Góes. Claro, é meu parente. Este grau já está definido. Ele é o meu comborço.
Mas tem uns parentescos ainda não nomeados. Por exemplo e muito comum: um homem tem um filho e casa-se com uma mulher que tem outro. Juntos, têm um terceiro. Portanto, este filho é irmão dos outros dois. E os outros dois não são irmãos entre si. São o quê? São aparentados, é claro. Afinal, ambos têm um irmão comum. E esse caso, hoje em dia, é quase corriqueiro. Seriam o quê? Co-irmãos? Ou irmãos-por-tabela?
O meu caso com o Loyola, mais especificamente. Tenho dois sobrinhos, o Mario e o João, que são irmãos dos filhos dele, o Daniel e o André.
Então, os filhos dele seriam meus quase-sobrinhos? Ou sobrinhos-tortos?
Continuando o raciocínio, meus filhos são primos do Mario e do João e não são nada dos irmãos deles? Não é esquisito? E eu e o Loyola? Os filhos dos Loyola são irmãos dos meus sobrinhos.
Como é que chama esse meu parentesco com o Loyola, senhoras filólogas? Se até o nome filóloga existe (e não trata dos filhos), acho direito ter um nome para esse parentesco.
Como se isso não bastasse, um desses meus sobrinhos (irmão dos filhos do Loyola) parece que tem um romancinho com a filha do Mateus Shirts, a Maria. Logo, a Maria - que já é minha afilhada - passa, também, a ser minha sobrinha. Logicamente que essa minha sobrinha passa a ser cunhadinha dos filhos do Loyola. Donde se conclui que o Loyola passa a ser parente do Mateus. Com que nome?, eu pergunto.
E eu e o Mateus, como nos chamaremos? Co-sogros-quase-pais-tios? A coisa é tão confusa que parece até que eu e o Mateus temos uma filha comum. Ou que o Loyola é avô dele mesmo. E eu tio da primeira mulher do Loyola.
É preciso dar nomes aos bois e aos bezerrinhos. Outro dia, a Talita, uma jovem atriz me contou uma história incrível.
Estava ela a fazer um comercial. Ela, com 20 anos e o par romântico - sim, era um comercial romântico - era um garoto da mesma idade. A cena era um beijo na boca. E comercial, grava-se trocentas vezes a mesma cena. Depois de beijar o rapaz pela centésima vez, começam a conversar, papo vai, papo vem, ela diz:
- Então você é filho do Nelson Pereira dos Santos? Eu sou neta.
- Então eu sou seu tio!
E era. E continuaram a gravação, sem levarem muito em conta o - como é mesmo o nome? - o incesto. O simpático incesto.
E assim anda a vida aqui nesse fim de milênio. Já arrumaram até nome pra confusão que vai dar nos computadores no dia 31 de dezembro de 1999, à meia-noite. Chama-se bug. O bug do milênio.
E esse bug familiar, como fica?
Repito: o que é que eu sou do Loyola? Além de fã, é claro.
Mário Prata
Publicado em O Estado de São Paulo, 2/6/1999.
Fonte: http://www.marioprataonline.com.br/obra/cronicas/prata990602.html