E OS HOMENS?
Não acreditei ao olhar Nádia esta manhã. Roupa de ginástica, turbinada, e cabelos com algumas mechas cor-de-rosa sobre o tom louro. Consegui apenas dizer como ela havia se modernizado.
Ela, então, passou a narrar sua via-crúcis. Há alguns meses, vinha freqüentando um clube para desimpedidos. A princípio tudo corria bem, porém o número de mulheres foi aumentando à medida que o de homens, diminuindo. Quando perguntavam por alguns que andavam sumidos, a resposta era: morreu, enfartou, está com câncer na próstata... Com isso, criou-se um problema sério. Havia setenta e cinco mulheres para vinte homens. Elas reclamavam sobre a falta de parceiros para as danças.
Após diversas reuniões, ficou decidido que o mais racional seria a utilização da venda de tíquetes ao custo de um real, o que daria direito às mulheres a dez minutos de dança com determinado parceiro. Como o déficit era de homens, obviamente apenas elas comprariam os tíquetes. O dinheiro seria empregado na divulgação do baile através de folhetos distribuídos em pontos estratégicos da cidade.
E assim foi feito. Nádia, contudo, sentia-se humilhada com a história. Não aceitava. Desde sua separação de Gilson, após trinta anos de casamento, ela procurava um meio de fugir da solidão, que sempre vinha com suas garras afiadas....
No entanto, contou sorrindo sobre o baile de gala que era realizado uma vez por mês no clube. Para que isso ocorresse, elas convidavam José Maurício, um rapaz sarado, moreno, e alugavam para ele se apresentar no baile, smoking, sapatos, e lhe ofereciam um lauto jantar ao término da noite de gala. Todas que colaboravam no aluguel do smoking tinham direito a várias danças com ele. No fim, o prazer era mútuo!
Voltei a sentir a tristeza de Nádia... Havia um quê de insatisfação no seu olhar. Perguntei. Ela, então, me disse que se sentia triste por estar descasada e que, no fundo, esses bailes eram pura fuga da realidade triste na qual vivia desde sua separação. Arrependera-se. Ela deveria ter ficado com Gilson, apesar da traição. Seria melhor que viver nesses bailes malucos!... E começou a chorar! Eu animei-a, dizendo que isso era comum até entre jovens, que as meninas também disputavam os meninos e que realmente havia mais homem do que mulher. O que poderia falar diante do que ouvia? Contei um monte de mentira, e ela acreditou! Aquelas mentiras piedosas!
Pediu-me que comparecesse a um dos bailes, frisando que eu poderia conhecer algum homem interessante. Eu concordei. Estranhei, pois ela conhecia meu marido. Somos casados há doze anos... Seria uma sinal de arteriosclerose? Disse a ela que iria ao baile de gala e dançaria com José Maurício, pois eu, como ele, era marombeira de academia, e certamente nos daríamos muito bem!
Ela, então, disse:
— Bel, concordo, mas não fique jogando charme pra ele, declamando suas poesias eróticas, pois senão como ficaremos? A escassez já é grande e você aparece com novidades... Pode ir, mas fica calada e apenas dance! Não nos ofusque!
Todas as mulheres se empenhavam muito para uma conquista, segundo ela. Era silicone no peito, na bunda. Botox, preenchimentos, no rosto. Cortes e tinturas nos cabelos... Gastavam uma fortuna para ver se conseguiam um par fixo, mas tudo ia piorando, a ponto de agora terem que pagar para garantir um par.
Assim, jurei que não declamaria poemas eróticos. E logo eu, que sequer sei fazer poemas eróticos!
Irei ao baile de gala, e já escolhi o poema para declamar. Será o "Labaredas...". Não sei se agirei corretamente, porém, quando ela falou que não o fizesse, lembrei-me do único poema erótico que já fiz na vida... e, claro, declamarei para ver se no fundo ajudo aquelas mulheres! Quem sabe ouvindo os poemas eles se animem, parem de morrer, de enfartar, e passem a viver essa imensa festa que é a vida, para a qual a idade não se constitui em nenhum empecilho.
"Labaredas..." vai levantar o pessoal, com certeza!
Belvedere Bruno