A desdefuntização do Centro Cultural Mauro Cunha

Este episódio aconteceu em meados de 2007, na cidade de Guupi, no Estado do Tocantins. O Centro Cultural Mauro Cunha, que fica bem no centro da cidade, mais uma vez servia como palco para a realização de velório. Toda a vez que isso ocorria, o único espetáculo que se assistia era o caixão com um morto sendo velado no salão principal do recinto.

Eram tantos os velórios ali realizados que o Centro Cultural foi por mim batizado com o sugestivo nome de Defuntódromo. Até então, o poder público municipal parecia que não estava sensível aos apelos da classe artística que condenava veemente a transformação do local em Capela Mortuária, fato que paralisa todas as atividades culturais ali realizadas, até mesmo o funcionamento da Biblioteca Pública Municipal Professora Deusina, que fica anexo ao prédio.

Em abril daquele ano, cogitou-se uma parceria com a Maçonaria para que fosse criada o que seria a primeira Casa de Velórios de Gurupi. Funcionaria nas antigas instalações da Loja Maçônica da Avenida Santa Catarina. O projeto era arrojado (pra defunto nenhum botar defeito). Lá, finalmente, os nossos mortos poderiam ser velados em paz, sem que fosse preciso interromper as atividades artísticas e administrativas do Centro Cultural.

Também nessa mesma época, o próprio Conselho Municipal de Cultura aprovou, por unanimidade, uma resolução se colocando contrário a realização de velórios no Centro Cultural, mas de nada adiantou.

Para a surpresa da classe artística, algum tempo depois, outro velório era a atração principal do local.

Quero crer que para cada velório ali realizado, certamente o saudoso Mauro Cunha, (que ao morrer não foi velado ali), se revirava no caixão onde foi enterrado (ou do que restou dele), pois como grande artista que era jamais aprovaria que o Centro Cultural fosse usado para velar os mortos, já que entendia que a cultura é arte e arte é vida.

Para quem não conhecia a triste fama de Defuntódromo do Centro Cultural Mauro Cunha, chegava a ser estranho, até, o fato de num dia, ao se passar pelo local, se deparar com um monte de pessoas tristes e um morto bem no meio do salão. Já no dia seguinte, no mesmo local, se via um grupo de Street Funk ensaiando uma coreografia, ou mesmo a Banda Municipal tocando lindas marchinhas carnavalescas sob a batuta do maestro Alexandre.

Para se ter uma vaga idéia de como o Centro Cultural Mauro Cunha até então era visto por muitos como Casa de Velórios, na manhã do dia 30 de maio de 2007, quando ali acontecia uma reunião dos artistas com o presidente da Fundação Cultural do Tocantins, Júlio César Machado e o diplomata francês, Romaric Büel, ao ver toda aquela movimentação, pelo menos três pessoas haviam entrado ali para ver quem "havia morrido!"

Com todo o respeito aos familiares dos mortos, mas convenhamos, o Centro Cultural Mauro Cunha não é um local apropriado para velórios, a menos, que seja um velório artístico, bem alegre, descontraído com direito a aplausos calorosos após um final feliz, tudo, é claro, com a aquiescência do maior interessado: o falecido!

Felizmente, após muita reclamação da classe artística, finalmente, o prefeito resolveu proibir a realização de velórios naquele local. Quanto a tal Casa de Velórios, continua no plano do governo municipal, mas devido as constantes quedas nos repasses do Fundo de Participação dos Municípios, não se tem previsão quando e se será realmente construída.

Zacarias Martins

« Voltar