Damascos
Vejo damascos em uma tigela branca. É de porcelana e, de dentro dela, reluzem os damascos, o que transforma — a tigela sobre a mesa — em um pote de ouro. Retiro um deles. Um damasco e, neste instante, é "o" damasco:
Antiquíssimo, com seus sulcos, suas marcas e, ao mesmo tempo, rígido e tenro no frescor de sua carne jovem. Textura de carne e pele. Textura de mucosa, eu diria. Lábios, partes íntimas. Damasco é íntimo e nobre. E tem a cor aquecida, solar, de entardecer - essa cor da viração do dia "em tarde ser".
Nessa virada do tempo, nasceu o damasco e se fez fruto. Com algo de sol, carne, Deus, gente. E um gosto doce e ácido, doce e ácido, ao mesmo tempo, ao mesmo tempo, para sempre, damascos.
Maria Helena Latini