UM MICO E UMA ROUBADA
UM MICO
Pensei, pensei, e desencavei esse mico da época que tentei fazer faculdade de Relações Públicas aqui em Santos. Parei no segundo ano por descobrir que o curso não existia. Não sei como está hoje, mas na minha época eu não aprendia praticamente nada. O único professor com quem aprendi algo foi o Iberê Sirna. Acabei indo para São Paulo e me formei publicitária pela Cásper Líbero mas, antes disso, ainda aqui em Santos e na FACOS, o curso de jornalismo recebia para uma palestra o repórter Caco Barcellos. Eu era super fã dele, e me ofereci para auxiliar no evento, nem que fosse para ficar repondo copo descartável.
No dia do evento, uma das meninas-chave da coordenação não apareceu, e me deixaram no lugar dela. Minha função? Apresentar as instalações da faculdade para ele, fazer um resumo sobre o curso, blá, blá, blá.
Eu, ansiosa por demais. Imaginem, O Caco Barcellos, admirava o cara. Como nos desencontramos (o primeiro erro), comecei a apresentar as instalações de onde estávamos, do último andar, descendo para o primeiro. Lá ia eu, tremendo feito vara verde, o gajo educadíssimo e disfarçando não perceber meu interno mas quase transbordante transtorno, e aquela turba atrás de nós, como se todos fossem visitantes. Eu abria uma portinha, explicação básica, olhadela, fecha portinha, vamos para a próxima. Nesse meio tempo, ele me disse alguma coisa sobre um trabalho desenvolvido na época, eu toda saltitante, me sentindo a companheira de trabalho e praticamente trocando de curso naquele instante, vou abrindo sem aviso a porta do laboratório de rádio, conversando já intimamente com meu mais novo amigo de infância.
Daí olho um momento para todo mundo, incluindo umas duas professororas minhas, que congelam. Não tinha dado tempo dele entrar ainda para sua conferida rápida, o que foi a salvação, pois havia aberto a porta do bannheiro feminino. A companheira de equipe, trocando de roupa lá dentro, entregue pelo reflexo no encontro dos espelhos.
Presença de espírito instantânea, continuamos o passeio com uma multidão muda, praticamente um serviço religioso e profundo.
Nunca mais me chamaram para atuar em nenhum evento. Assim, sem motivo.
UMA ROUBADA
Um grande amigo, daqueles que ralam e muito em cada trabalho - e que hoje merecidamente coordena os programas brasileiros no Festival Internacional de Curtas de SP, me convocava sempre como diretora de produção para seus curtas.
Produzi três sob a direção dele, um com outro amigo, e ainda morro de saudades de nossas épocas de total falta de grana, mas de criatividade à mil.
Como diretora de produção do "Último dia", tive que correr atrás de muitas autorizações com a polícia, para podermos filmar nas ruas com tranqüilidade. Algumas cenas que seriam rodadas aconteceriam perto de meu antigo apartamento, na Vila Mariana, então entreguei a documentação do projeto para o Posto da Polícia da Sena Madureira, que me receberam muito educadamente. Autorizações entregues, agora correria para encontrar objetos de cena. O Sr. diretor William, sempre ele, me solicita um item bastante fácil de se encontrar por aí:
uma porta.
A porta que seria usada nas cenas do esconderijo da personagem da Laís.
Pois bem, lá vou eu atrás de uma porta que atendesse as solicitações. E não encontrava nada. Só que, perto de onde eu morava, na Sena Madureira mesmo, existia uma casa onde outrora funcionava uma escola de inglês, que estava vazia mas cheia de trecos na entrada. Passei na frente por acaso, e fiquei de voltar mais tarde.
Taí uma coisa que não deveria ter feito: voltar lá.
Pois é. Mas eu fiz. Deixei as coisas que trazia no caminho em casa, e voltei lá. Aqui sublinho: deixei TUDO em casa, inclusive documentos (crianças, nunca façam uma coisa dessas!), só levando minha chave. Estava lá eu, com minha camiseta da Mostra Internacional de Cinema, subindo as escadarias da casa que antes parecia tão inocente, agora me desperta receios. Olho para os lados, e só vejo pedaços de madeira, papelão e caixas para todos os lados. E nada de porta. Resolvo entrar mais na casa para observar seu interior, quando de repente começo a ouvir barulhos. E então pessoas, uns três ou quatro homens, surgem do nada (do nada não, de debaixo daquela montoeira de papelão e madeira!), e me perguntam o que eu estou fazendo invadindo e mexendo na casa deles.
Gelei.
Começo a recuar, tentando explicar que estava ali a trabalho, que não procurava por ninguém, e pensando "como está longe essa porta de entrada. Seja esperta. Corra enquanto pode". Do lado de fora, escuto carros freando bruscamente, próximo ao local. Meu instinto não sei porque pensou : "é a polícia, ficarei bem". Policiais então entram na casa, nervosos, recolhendo as pessoas que estavam ali escondidas, invadindo aquela casa. Começaram a arrastar TODAS as pessoas, incluindo essa que lhes escreve. Comecei a tentar explicar que não era mendiga (olha o nível da situação!), que estava ali a trabalho, mas a policial que me segurava não queria saber de conversa.
Continuei repetindo minha história, quando, por sorte minha, uns dos policiais presente no local havia me recebido no dia em que deixei as autorizações para as filmagens no posto de trabalho dele. Ele acabou me reconhecendo e confirmando que eu deveria estar ali só a trabalho realmente. Agradeci, corri de volta para casa agradecendo por não ter acontecido nada pior. A porta? Bem, acabei não arranjando porta nenhuma. Por coincidência, ao irmos filmar na casa da Carol, encontramos uma dentro de uma caçamba. Se não fosse por isso, lá estaria eu novamente atrás de uma outra porta. E torcendo para não entrar em outra fria, como aquela de filmar no estacionamento dos mafiosos lá na Treze de Maio.
Mais isso já é outra história...
Aleksandra Pereira