O poder do silêncio
A cada dia sinto que a melhor atitude é jamais falar sobre aquilo que desconheço. Como emitir uma opinião se não domino o assunto ou se não tenho informação suficiente para fazer algum juízo de valor? Parece óbvio, mas ao meu redor as coisas não são bem assim. Encontro gente tão “bem informada” que me assusto diante da minha ignorância de homem silencioso. Fico quieto no meu canto prestando atenção.
Aqui neste pedaço de chão beirando o Atlântico, há pessoas que passam a vida inventando histórias para romper seus silêncios. Acho que o mundo está perdendo sua capacidade de contemplação e precisa de muito barulho para se sentir confortável. Daí, também, a necessidade de inventar histórias ou de chegar em casa e ligar a televisão ou rádio ao invés de simplesmente sentar e sentir o corpo repousando no sofá. E quem ainda se detém a ouvir a água da torneira enchendo a mão de umidade cristalina pronta para amar a nossa face tão suada num fim de tarde de verão?
Soube há dias do desaparecimento de uma criança. Cartazes se espalham pela cidade, pela internet, por todo canto. Há uma rede de solidariedade para tentar encontrar a pequena Pâmela. Triste sina. Mundo cruel esse. No entanto, em apenas algumas poucas horas, ouvi histórias diversas, com versões as mais dramáticas sobre o encontro do corpo da menina. Estuprada, violentada, descrições com requintes de uma boa história de terror policial. E as pessoas falavam com uma convicção que parecia verdade! E ela, no entanto, ainda não voltou para casa. Histórias vão sendo inventadas para alimentar não sei que sentimento sádico. Hoje, de Pâmela, há apenas a saudade dos pais e a esperança de reencontrá-la.
Essa onda de fantasias parece que faz parte da cultura de nossa terra. Foi assim que meses atrás falou-se muito sobre a existência de um suposto estuprador rondando alguns bairros da cidade. Também suposições são feitas sobre os mandos e desmandos de um certo deputado. Em recente depoimento na Câmara Municipal, ele mesmo fez troça com o tema. Afinal, tudo de ruim que acontece na cidade tem o dedo do deputado, dizem os fantasistas de plantão. E de mentira em mentira, Pinóquio parece ser bem mais real entre nós do que apenas uma história de moral infantil. O pior é que as pessoas acreditam. Será mesmo que uma mentira bem contada vale mais do que mil verdades?
Cada vez mais amo o silêncio. Não apenas o silêncio físico, a ausência de ruído, mas, principalmente, o vazio da mente que se abre para contemplar a si mesma e ao mundo sem julgamentos, sem expectativas, sem mágoas, sem fantasias. Um amigo me convidou para, numa reunião familiar, dizer um poema, de improviso. “A poesia nasce do silêncio”, eu disse – e a voz foi seguindo os espaços vazios entre um acorde, um sorriso, um olhar atento. Eu não precisava inventar ou falar do que não sei. Era só deixar que a palavra fosse a guia do sentimento que me parecia mais puro. Minha convicção maior é esta: o mundo é feito de silêncios, de espaços em branco, daquilo que sentimos e chamamos de luz. O que é a luz senão o silêncio brilhando sobre e dentro de nós?
Camilo Mota