A VIDA É CURTA DEMAIS PARA NÃO SER GENEROSA

Sofri bastante com as brincadeiras, mudava de rua ou do caminho da escola para não atravessar o corredor polonês ou ser ofendido na frente de quem eu gostava. Mudava de apelido com a mesma facilidade que migrava de campo de futebol. Eu nunca me importei de ser ofendido, eu me importava com o sofrimento de quem me amava e estava junto. Eu me envergonhava pelos outros em mim. Tantas vezes fiquei isolado em minha cadeira, esperando o sinal para escapar de qualquer gozação. Ainda corro com a respiração quando escuto um sino. Essa vulnerabilidade, desproteção, me antecipava aos que eram deslocados por um detalhe físico, um desajuste social, uma diferença. Eu me sentia responsável por aqueles que se calavam. É como se minha mãe dissesse na minha consciência antes de ir para o trabalho: 'cuida bem de teus irmãos menores'. Escrever é não calar as mãos. É proteger o fogo como quem tapa um filho com o próprio corpo.

Fabrício Carpinejar

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