Na ciclovia

Vejo, na ciclovia, um homem sujo, com um dente preto quebrado, cabeça baixa, cara de dor, andando sozinho. Paro a bicicleta, meus olhos se enchem dágua e ouço gritos: Goooooooooolllllll!!!!!!!! Levo um susto danado e vejo na praia do Flamengo dois times jogando, um comemora. Olho para trás, ainda marejada, e lá se vai o homem desesperado.

Faço a manobra, separo dez reais da carteira e intercepto-o: Posso ajudá-lo em alguma coisa? O homem levanta os olhos arregalados e diz: Não preciso de nada. Mas sua cara é de muito sofrimento. Minha cara é assim mesmo. Tem certeza que não posso ajudá-lo? Não, responde, com medo. Aceita um Guaraviton (eu trazia uma garrafa na mochila). Ele dá um passo pra trás, talvez não saiba o que é um Guaraviton. É um refrigerante, digo. Tenho aqui, por favor, aceita. Ele aceita e eu sigo, na dúvida se a louca sou eu ou os transeuntes que passam por ele, indiferentes.

Talvez fosse apenas um canal no dente, concluo, lembrando a minha dor, que foi tanta, no metrô rumo ao dentista, que uma IDOSA ME DEU O ASSENTO!

Gória Horta

 

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