Pipoca na manteiga
Quando passo pelo local onde se erguia a loja, fico cheia de passado. Daí, falo comigo: largue o passado no passado, dele, hoje, apenas os brechós se alimentam. Sorrio diante da bobagem do pensamento.
Eis que a lembrança de um perfume distante surpreende meu olfato. Olfato também tem memória. Cheiro de pipoca na manteiga...era o aroma da Sears, sua marca registrada.
Tudo o que se queria, por lá se encontrava, ou bem à vista ou meio às escondidas. Minhas visitas eram como as de um garimpeiro, busca que busca, mexe e remexe... assim eu sempre saía com uma sacolinha, mesmo que apenas comprasse um batom ou um par de meias coloridas.
O setor mais gostado, na verdade a minha paixão, era o dos casacos. Na época, São Paulo inda se fazia muito fria e as cores, os modelos, os tecidos eram lindos, aqueciam o corpo, a alma. Poucos deles eu trouxe para casa, outros tantos trago no que me resta de memória.
Talvez as raras oportunidades de adquirir um bem de maior valor, contribuíssem para o aumento do magnetismo local. A dificuldade, ou a impossibilidade, muitas vezes, infla a tendência, redobra o desejo.
Hoje, nem o perfume requintado do Iguatemi, nem suas vitrinas milionárias preenchem a ausência das araras da antiga loja, tampouco me trazem de volta o brilho dos olhos e a alegria de comprinhas à toa, as que me permitiam levar do lugar um pouco do encantamento.
Quanto ao aroma, no Iguatemi: Armani, Givanchi, Dior e tantos outros bailam pelo ar.
Do cheirinho de pipoca, hum...somente uma amanteigada lembrança.
Maria da Graça Almeida