ÍNTIMOS ESTRANHOS

Será mesmo que quanto mais perto, mais íntimo se é de alguém? Ou será maior o estranhamento ao perceber que o “outro” não é tão perfeito assim como idealizamos, e, pior, possui os mesmos desejos com os quais travamos grandes batalhas? Como bem lembra Woody Allen, todos dizem eu te amo, mas quem verdadeiramente ama? Existe um único modelo de amor que faz com que qualquer outra forma, que fuja a este, não seja amor?

Revendo, hoje, a memorável película cinematográfica “Closer”, não tive a menor dúvida de que o “amor” é uma construção social, e, por isso, torna-se tão complicado, quando nos vemos diante de alguém que nos traz uma ideia completamente diferente da nossa, em relação a tal sentimento. Na verdade, ele é o mesmo, o modo como o vivenciamos é que pode ser distinto, dependendo dos grupos sociais com os quais estabelecemos contato, destacando, aqui, a família, como muito determinante nesse processo, nossas leituras e vivências de mundo.

Em "tempos líquidos", como a pós-modernidade, tão discutida por Zigmunt Bauman, quanto mais perto ficamos, mais enxergamos o egoísmo e as contradições presentes nos relacionamentos, contradições, estas, típicas de toda e qualquer fase de transição.

Em uma cena, entre tantas outras importantes, as personagens Alice e Dan, um casal atravessando uma crise profunda de relacionamento, diante de traições de ambas as partes, travam um diálogo que me chamou muita atenção para a ambígua questão de: quem ama não abandona o outro ou quem ama, exatamente por isso, deixa o outro ir, quando a relação já não satisfaz. Eis aqui uma oposição de ideias, em relação ao amor, bastante polêmica. Acredito na segunda opção, pois, concordando com Carpinejar, intimidade é liberdade, e, considerando que não há como amar sem se tornar íntimo, por silogismo, para o pássaro do amor não há gaiolas (que me desculpem os românticos). Somos o que somos, sem máscaras ou representações. Não somos o desejo do outro, mas nosso próprio desejo.

Bem, assim deveria ser, porém, na prática romântica do amor, ainda sobrevivem os papéis do “rei” e seu “súdito”, isto é, aquele que dita as regras e aquele que é sempre submetido às mesmas, por razões diversas, mas seria alguma delas, o amor? Acredito que não abandonar uma relação que já não nos faz feliz, ir até o “que a morte nos separe”, não passa de uma ideia cristã de amor como sacrifício. Não quero dizer, entretanto, que não implique muitas vezes nisto, contudo tal sofrimento não pode ser o alicerce, como pregavam os românticos.

Na poesia cotidiana, contemporânea, não cabe mais rimar amor com dor. Estamos no tempo dos versos livres!!

Lembrando o célebre pensamento do grande filósofo francês, Sartre, “estamos condenados à liberdade”. Não adianta querer aprisionar ninguém, inclusive a nós mesmos, simplesmente não funciona, seria arrancar as asas do pássaro-amor, inevitavelmente ele morreria.

Temos o livre-arbítrio, o direito à escolha, por mais que, muitas vezes, pareça que não. No fundo, no fundo sempre estamos optando. Se é numa relação monogâmica ou poligâmica onde alçamos os voos mais bonitos, essa é uma opção nossa, todavia temos que ser honestos com quem vamos nos relacionar, a fim de não ferir ou decepcionar ninguém. Isto não é uma escolha, é um dever.

Nesse sentido, no filme, quem mais se aproximou do amor foi a linda protagonista Alice, interpretada pela maravilhosa atriz Natalie Portman, uma diva!
"Eu não posso tirar meus olhos de você", já dizia a belíssima canção da trilha sonora do filme "The blower's daughter", e foi assim que ficamos diante de Natalie, hipnotizados!

Chego à conclusão que o “perto demais” pode nos tornar cada vez mais distantes, pois é preciso, no mínimo, um espaço onde caibam nossas asas, de preferência abertas, porque o amor só dura em estado de voo...

Raivane Sales (RaiBlue)

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