Interior do Castelo de Abrantes |
Vista parcial de Abrantes |
Apontamento do ano de 1900 do Jornal do Comércio:
"Vila (hoje cidade) do concelho e distrito de Santarém, com 7.200 habitantes. È servida por caminho de ferro da Companhia Real. Está situada na margem direita do rio Tejo. Belíssimo panorama, fortificações antigas e túmulos do século XVl. Entre 1810 e seguinte foi cenário de batalhas contra Massena, general dos exércitos de Napoleão. O concelho tem 14 freguesias com um total de 27.450 habitantes".
A cidade de Abrantes ocupa uma elevação que domina o vale do rio Tejo e se situa no pontode encontro entre três regiões naturais (Ribatejo, Beira Baixa e Alentejo). Abrantes é uma localidade de origem muito antiga e que se desenvolveu em função de sua importância estratégica e dos meios de comunicação que a serviam (rio Tejo, estradas e, posteriormente, caminhos de ferro. A parte antiga conserva alguns edifícios dignos de nota, como a chamada Casa dos Almadas, que serviu de Paço Real, a Casa da Câmara e outras de tipo diferente.
ORIGEM DO NOME:
"Abrantes foi tomada aos mouros pelo primeiro rei de Portugal, D. Afonso Henriques, na madrugada de 8 de Dezembro de 1148. Sobre a etimologia da origem do nome, variam vários autores, do qual apresentamos um, o Dr. Januário de Mendonça (1953)":
"Uns escritores e estudiosos dizem que se teria chamado Hablad-antes, nome que tiveram a princípio em uma contenda havida em Cortes entre os procuradores de Abrantes e Torres Novas, sobre a prioridade, afirmando estes que deveriam votar primeiro, ao que El-Rei dissera aos de Abrantes. Habland-antes, palavras que os moradores tomaram para o nome de sua terra e, assim, eternizarem-se as suas regalias, e que com corrupção do tempo se mudou em Abrantes.
Outros, e entre eles o Bispo D. Frei João da Piedade, natural de Abrantes, nos seus apontamentos diz o seguinte: "Abrantes, minha pátria, a quem os antigos chamavam TUBUCCI, disputa primazias de antiguidade com as terras que mais prosápia têm de nobreza vetusta, por ser fundada pelos galos celtas 590 anos antes do nascimento de Jesus Cristo. O seu castelo foi conquistado aos mouros por D. Afonso Henriques, na madrugada de 8 de Dezembro de 1148. Era alcaide do Castelo umvelho mouro chamado Abraham Zaid. Este mouro ers senhor de quase todas as veigas da Ribeira de Abrancalha, que antigamente se chamava de Nossa Senhora da Luz, em razão da ermida que ali há e que traria os seus fundamentos do tempo dos godos, que os mouros consentiram aos Cristãos para ali fazerem as suas orações, e que estes, pelo facto de o mouro ser o senhor daqueles campos e para captarem a sua simpatia e afeição, começaram a chamar Ribeira de Abraham Zaid, que, com o decorrer dos tempos se converteu em Abrançalha.
Abraham tinha uma filha gentil, chamada Zahara, e um filho bastardo chamado Samuel, havida de uma cristã cativa em Soure (concelho de Coimbra), em 1118.
"Nunca Abraham descobriu este facto a Samuel nem a Zahara, ignorando aquele que era seu filho. Samuel amava extremosamente sua irmã e ela correspondia-lhe apaixonadamente, sem que Abraham conhecesse aquela afeição. Tomado o castelo pelos soldados de D. Afonso Henriques, Samuel ficou prisioneiro de um cavaleiro de apelido Machado, que devia ser parente de Mem Moniz de Gandarei. E vendo o cavaleiro que um dos soldados cristãos levava Zahara arrebatadamente, deixou Samuel entregue a boas vigias e foi socorre-la, salvando-a, indo entregá-la à guarda dum venerável monge de São Bento, do Mosteiro do Lorvão (perto de Coimbra), que vinha acompanhado de El-Rei. O cavaleiro Machado, fascinado pela beleza de Zahara, que tinha as feições muito parecidas com uma figura da Virgem Senhora dos Aflitos, que sua mãe lhe havia dado à hora da morte, e que ele com muita devoção trazia sempre, havendo já por vezes sonhado que ao escalar os muros dum castelo, salvaria uma donzela com quem casaria, julgou ver Zahara a virgem dos seus sonhos. (Esta tradição tem passado de pais a filhos por mais de quatro séculos e meio, e, entre os moradores de Abrantes). Querendo El-Rei remunerar os serviços de seu filho bastardo D. Pedro Afonso, ou, como outros querem, seu irmãos, deu-lhe o senhorio do castelo, nomeando-o seu alcaide-mor, mas ficando o cavaleiro Machado a exercer o cargo em nome de D. Pedro, deixando também El-Rei o monge de São Bento para o serviço espiritual dos fiéis.
D. Afonso Henriques mandou restituir Zahara a seu pai, e depois de tomar providências para segurança do castelo marchou para Torres Novas. O cavaleiro Machado, vendo-se alcaide do castelo procurou ganhar honrosamente o coração de Zahara, mas esta que amava muito Samuel, receosa de algum conflito, foi contar ao pai a paixão do alcaide, o mesmo fazendo ao monge. Este, que já estava ao facto de tudo, assegurou a um e a outro que o alcaide era um nobre cavaleiro, incapaz de esquecer os preceitos da honra.
O monge empregou os seus melhores esforços para a todos conciliar, não conseguindo abafar os ciúmes de Samuel, e um dia, quando o monge, o mouro Abraham e Zahara convenciam Samuel e reconciliar-se com Machado, julgando ela que Samuel estava certa da sua fidelidade, perguntou ao pai se o alcaide viesse procurá-la, não estando ele em casa, o deveria receber ou conservar a porta fechada, para ele julgar não estar ninguém em casa. Abraham que julgou ver nesta consulta uma ofensa à pessoa do alcaide Machado, respondeu :" Nada temo nem receio da tua virtude, Zahara, e tenho bastante confiança na honradez do alcaide: "abre antes a porta".
Samuel ouvindo estas palavras da boca de Abraham, perdeu o juízo e, como louco furioso, começou por toda a parte a desacreditar o velho mouro e sua filha, gritando sempre "Abre-antes --- Abre-antes"...". Esta palavras desfiguradas pelo vulgo agravaram também a pessoa do alcaide Machado, e dali em diante ao castelo de Tubucci começaram a chamar o Castelo de Abrantes.
A mãe de Samuel, antes de cativa, tinha prometida em casamento ao monge de Lorvão, que no mundo tinha o nome de João Gonçalves e era irmão de Gonçalo Gonçalves, a quem D. Teresa concedera em 1125 a vila de Soure (perto de Coimbra). João Gonçalves quando perdeu a noiva abraçou a regra de São Bento e, sabendo que Samuel era filho da mulher que tanto havia amado, tudo tentou para o salvar, conseguindo que Abraham e Zahara se fizessem cristãos e Samuel entrasse ao serviço do rei de Portugal, casando Zahara com Machado. Este acontecimento tradicionalmente se acredita como dando origem ao nome de Abrantes". (A lenda de Abrantes — Dr. Jo´se de Melo Sousa).
CASTELO DE ABRANTES: Do conjunto, que abrange toda a área antiga da cidade e incluía obras complementares de defesa, conservam-se, embora profundamente alterados em relação às suas características iniciais, o núcleo de dois fortes e troços das muralhas. À zona mais alta e mais facilmente defensável da cidade corresponde o núcleo mais antigo, que deve ter sido ocupado desde período muito remoto, embora indeterminável. O castelo, onde foram encontrados materiais pré-históricos e romanos, sofreu reconstruções e modificações profundas ao longo dos séculos XVll ao XlX, em consequência de lutas ali travadas e da necessidade de adptação da fortaleza à evolução das tácticas de guerra. A Igreja de Santa Maria e restos de muralha que correm nas suas traseiras são hoje os testemunhos visíveis mais antigos, visto que a própria torre de menagem foi profundamente alterada. A desocupação militar que possuía instalações no castelo permitiu o início de grandes obras de recuperação e reintegração, já puseram à vista elementos do maior interesse. Entre as numerosas obras fortificadas da Praça de Abrantes contavam-se os Fortes de Santo André e de São Pedro, ambos para a defesa do lado sul e dos acessos ao rio Tejo, que ainda se conservam. No interior do primeiro foi construído um estabelecimento assistencial e no segundo uma memória, da autoria do escultor Lagoa Henriques e do arquitecto Castel-Branco, alusiva ao condestável D. Nuno Álvares Pereira, que, segundo a tradição, no local teria acampado em vésperas da célebre Batalha de Aljubarrota (14-8-1385).
Remontando ao período da romanização, ou até a épocas anteriores, a antiguidade da fortaleza de Abrantes é facilmente entendida, pela privilegiada situação geográfica da cidade, que fica sobranceira ao rio Tejo e é ponto de convergência e ligação entre vários caminhos. A conquista de Abrantes esteve inserida numa estratágia de defesa e povoamento da margem norte do Tejo, cuja linha defensiva era mantida por três principais pilares — Lisboa, Santarém e Abrantes.
Pensa-se que a povoação terá sido conquistada em 130 antes de cristo pelo Cônsul romano Décio Juno Bruto que aí instalou a fortificação. Porém, a história do então Castelo de Abrantes só passaria a estar ligada a Portugal, muitos séculos volvidos, quando D. Afonso Henriques o conquestou, em Dezembro de 1148. Vinte e um anos mais tarde, o mesmo monarca conferiu-lhe carta de foral, estimulando o repovoamento local. E D. Afonso lll conferiu à fortificação grandes melhoramentos militares, que só seriam concluídos pelo seu sucessor (e filho) D. Dinis. Este rei viria mesmo a incluir o Castelo de Abrantes nos dotes do seu casamento com a princesa de Aragão, D. Isabel, mais tarde a Rainha Santa Isabel.
Fruto das suas magníficas condições, a fortificação de Abrantes tanto foi pousada de monarcas e familiares, como foi palco de grandes lutas da História de Portugal. Durante a dinastia filipina (denominação espanhola), porém, os tempos foram de desolação para este Castelo. Votado ao abandono, acabou por cair num estado de degradação. Deixara de ter tanto interesse estratégico, dado haverem diminuído as ameaças de possíveis invasões oriundas de leste. Mas o panorama acabaria por mudar. Em finais do século XVll, D. Pedro, confrontado com a hipótese de novas tentativas de invasão, remodelou o Castelo com avultadas obras de estilo Abaluardo, então em voga, e adaptou as muralhas às necessidades da artilharia, instalando terraços e canhoeiras. Ao mesmo tempo, este rei fomentou a revitalização de Abrantes e deu-lhe o título de praça de guerra de 1ª classe.
A praça voltaria a entrar na história quando, durante a terceira invasão das tropas napoleónicas, o marechal Massena martirizou a então vila, enquanto ali se abrigou à espera de reforços.
Hoje, ao recordar a história de Abrantes, lá continua a fortaleza. Do primitivo castelo medieval pouco resta, além da torre de menagem, já que os panos de muralha dessa época foram totalmente removidos no século XVll. O seu aspecto actual é o de um polígono irregular, cujos lanços de muralhas são limitados por baluartes de planta semi-circular, onde se rasgam as conhoeiras, os janelões e os torreões cilíndricos. Lá dentro ainda resiste o paço dos marquezes de Abrantes e algumas relíquias arquitectónicas, como a cadeia de arcos assentes em maciços pilares e as abóbadas de tijoleira. Cá fora, é o grande espectáculo da lezíria que continua a surpreender, que abrange um horizonte de 80 Km.
Importante local de passagem entre o Ribatejo, a Beira Baixa e o Alentejo, essa ligação fez-se a vau, por uma ponte romana, por barcas de passagem e pontes de barcas, e finalmente por pontes metálicas. Ainda hoje é visível na margem esquerda um conjunto monumental de pilares considerados como fazendo parte da ponte-cais romana que terá existido no local.
A cidade orgulha-se dos seus pergaminhos históricos. Fortificada por D. Afonso lll e D. Dinis, a quem se deve a torre de menagem, viu o seu território alargado pelas doações de diversos reis. No antigo Paço Real viveram por largo tempo, D. João ll e D. Manuel l e aí nasceram alguns príncipes reais. Em 1641, a vila foi agraciada com o título de "notável" por ter sido a primeira a proclamar a independência e a reconhecer D. João lV como seu rei e senhor.
Importante foi também o papel desempenhado durante as Invasões Francesas, já que a fortaleza era considerada a chave de defesa das Beiras. Invadida por Junot e pelo seu exército em Novembro de 1807, foi então ocupada e sequeada. Das suas riquezas artísticas, acumuladas ao longo dos séculos por dádivas de reis, infantes, condes e pelos Marquezes de Abrantes e outros nobre, só escapou o que alguns particulares conseguiram esconder em engenhosos abrigos. Mas em 12 de Agosto de 1810 travou-se nas proximidades da povoação uma batalha em que os franceses foram derrotados pelo exército anglo-luso. Mais tarde, desde 9 de Outubro desse ano até 7 de Março de 1811, a vila defendeu-se corajosamente contra o cerco das tropas de Massena, que acabaram por retirar.
A vila, que até final do século XVlll pouco se desenvolvera, começou então a expandir-se e a ganhar importância económica. Tivera quatro conventos, dois de frades (Santo António e São Domingos) e dois de freiras (Nossa Senhora da Graça e da Esperança), que pouca influência exerceram no seu desenvolvimento.
O Marquês de Pombal procurou reanimar a vila incrementando a cultura da seda, como fez em muitas outras povoações. Das 39.357 amoreiras importadas da Alemanha, enviou cerca de 3.000 ao Município de Abrantes, que as distribuiu pelos proprietários do concelho. Como sequência, desenvolveu-se uma riquíssima produção de seda que aumentou consideravelmente o comércio da povoação, reiniciando uma fase do crescimento, mais sensível sobretudo a partir do início do século XlX. Renova-se o comércio fluvial e a função de Abrantes como entreposto terminal.
Nessa época surgiu na margem esquerda um pequeno conjunto de casas. Era um bom local, já que o rio Tejo descrevendo uma larga curva, corre rápido na margem norte e lento na margem sul. Aí, em qualquer época do ano, podiam os barcos encontrar abrigo. Como o sítio era plano, o desembarque dos produtos tornava-se rápido e fácil. Pelos mesmos motivos, instalaram-se no local diversos pescadores. A construção de estrada acentuou a importância estratégica do Rossio ao sul do Tejo, cuja única desvantagem era a ausência de protecção contra as cheias.
Com a construção do caminho (estrada de) ferro em 1863, o comércio grossista voltou a estar centrado na margem norte. Novo aglomerado começou a surgir junto à Estação de Alferrarede (velha), que cresceu rapidamente, pois havia muito espaço e proliferaram os armazéns e mais tarde as indústrias.
O nascimento do Rossio ao sul do rio Tejo e depois de Alferrarede, representa duas fasess fundamentais do desenvolvimento de Abrantes, que ganhou assim dois polos de expansão interligados, pois quando a cidade começou a deslocar-se para as vias de transporte o povoamento passou a apoiar-se nessas vias, constituindo o Rossio a grande plataforma para o Alentejo e Alfarrede para a Beira. A cidade alta manteve-se como centro administrativo e cultural. O facto de esta ter estado rodeada de instalações militares impediu a sua expansão pelas vertentes, e as restrições camarárias em promover a urbanização na encosta sul, logo que ela se tornou possível, explicam em parte a expansão para a zona norte, mais húmida e sombria.
Em 1891, resolveu-se um grave problema com a inauguração de água potável a Abrantes, que, em 1916 se viu elevada à categoria de cidade.
Provar os doces regionais, principalmente a "palha de Abrantes" um doce feito de ovos e abóbora gila, é quase uma obrigação (uma docinha obrigação).
Das várias edificações existentes no Castelo só
uma resistiu às modificações, ampliações
e refortificações sucessivas: a Igreja de Santa Maria, que
em 1921 foi transformada em Museu regional e no qual são de salientar,
entre muitos valores artísticos, os azulejos hispano-árabes
e os túmulos e estatuária dos séculos XV e XVl. No
Castelo, o Jardim de São Pedro, com o coreto, lagos e cisnes, é
o recanto romântico por excelência, e não deve perder-se
a magnífica paisagem que se admira da torre de menagem (80 Km de
lezíria) e do Miradouro da Porta da Traição.