No Japão, sim pode ser não

        Em 1964 eu estive no Japão como jornalista, fazendo a cobertura das Olimpíadas daquele ano. Nunca irei esquecer do lindo espetáculo presenteado, nem da correta organização dos nipônicos. Como por exemplo, poderia citar a maneira fidalga com que foram recebidos todos os jornalistas estrangeiros, que ficaram alojados na Press House. Esta era um edifício de apartamentos, construído com a finalidade de receber bem os correspondentes da imprensa dos outros países, através dos confortáveis cômodos (vendidos aos japoneses, após as Olimpíadas). E o que é mais importante: cada um de nós encontrou, ao chegar, em cima da cama, uma maleta com tudo que poderia ser útil durante a nossa estada no Japão.
        Havia, junto a maleta, uma carta que, dentro da tradicional humildade japonesa, quase nos pedia desculpas pelas ofertas, procurando explicar que haviam tomado aquela liberdade (?) porque "talvez tivéssemos esquecido algum daqueles objetos de uso pessoal". Na maleta havia de tudo: desde escova e pasta de dentes, até canetas e blocos para anotações:
        Com duas ofertas extras, colocadas ao lado: uma mini-televisão e um binóculo. Estes no final das Olimpíadas, foram-nos oferecidos, ao preço de custo. Os jornalistas que não quiseram comprá-los, tiveram que devolvê-los. Eu comprei o binóculo e, hoje, ele é uma grata recordação que mantenho do Japão, país que realmente me sensibilizou. Sonho até com o dia em que possa lá voltar. Sonho, possivelmente, irrealizável.
        Naquela ocasião, além dos jogos, fiz ótimas reportagens sempra companhado de Ronaldo Moraes, excelente colega e amigo, que faleceu tão cedo. Entrevistamos Akiro Kurosawa e Tochiro Mifume (para os que não sabem, respectivamente o mais famoso diretor e ator do cinema japoneses), fizemos um bom trabalho sobre a indústria de pérolas artificiais (porque são tidas como artificiais eu não sei, já que elas, a não ser pelo seu maior "núcleo", em nada diferem das naturais) e sobre os tradicionais teatros No e Kabuki.
        E conheci os japoneses mais de perto. Povo ótimo de se lidar, desde que se saiba como. Eu, por exemplo, sempre tive ojeriza a cartão de visitas. Os nipônicos adoram. É você conhecer um, e receber seu cartão na despedida. Depois de colecionar uma boa quantidade deles, e não dar nenhum em troca, percebendo o aborrecimento da outra parte, indaguei a respeito ao então simpático adido cultural da embaixada brasileira e ele me informou: "Aconteceu que, ao não retribuir, também com um cartão, o que você recebeu, está dando a entender que não deseja a amizade dele".
        Por isso, não fiquei surpreso ao tomar conhecimento de um livro, publicado em língua inglesa, de autoria de Masaki Imai, intitulado "Dezesseis maneiras para evitar dizer não".
        A obra tem uma finalidade: ensinar o estrangeiro a negociar com os japoneses. O nipônico, no início das negociações, ao invés de dizer não a uma proposta, diz sim. Isto, no entanto, não quer dizer que ele aprovou a transação. Ao contrário. Porque, logo a seguir ao sim, vem um porém. E é aí que o negociante japonês dá inicio a sua argumentação, que termina provando que o sim queria dizer não. Entenderam? Não, não é fácil, mas diz bem da alma desse povo, que não gosta de iniciar um diálogo com uma negativa.
        O fato é que, por não saberem lidar com os homens de negócio no Japão, muitos empresários estrangeiros quebram a cara.O livro de Masaki Imaí pretende ajudá-los a realizar boas transações naquele país.

Mário de Moraes


 
 
 
 

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