Pulando de BR em BR, atravessando
este Brasil que ainda não foi descoberto pelos brasileiros, mas
que é tão fascinante que já criou uma raça
que vem de fora para explicá-la aos nativos, os "brasilianistas",
chegamos em Ijuí.
Estaciono aqui, em breve
parada, para prestar homenagem ao meu companheiro de viagem pelo Brasil
e pela vida: Anselmo Caparica. Juntos fizemos um rali por todo o Brasil.
Homem hábil, experiente, "fuçador", bandeirante convicto,
foi a sustentação desta peregrinação que durou
dois anos seguidos e mais outra temporada de um ano. Ambos pilotávamos
as três Brasílias que se sucederam uma a uma, nessa maratona:
Gabi — a loura, Joinha, amarelo-gema e Horácio, a verde-metálica.
Esta última, a única Brasília de sexo masculino que
tivemos. Ao Anselmo, Príncipe do Pium, senhor das estradas, companheiro
inexcedível, os meus agradecimentos e o desejo de juntos refazermos
"ad eternum" o nosso próprio roteiro.
Ijuí é a capital
da soja. Os trigais abundam na região. Mas a soja é a grande
cultura que atinge os municípios vbizinhos. Sem dúvida alguma
é uma região que provoca euforia. Mares de soja. Todos plantando,
fartura, progresso. Santa Rosa, Carazinho, Passo Fundo, toda essa vasta
região mergulhada em soja.
Em Passo Fundo, enquanto
esperava Anselmo dentro do carro, um desses impertinentes meninos lavadores
de carros, irritado com minha negativa de lavar a Gabi, a loura, ameaçou-me,
atrevidinho, a riscar o carro com um prego.
— Pois risque, se for homem!
— ripostei.
Não é que
o machinho gaúcho, de lata na mão e prego em riste, veio
em minha (do carro) direção, pronto a provar sua virilidade?
Num átimo saltei do carro e corri por cima do pivete, que ficou
aparvalhado com minha atitude tão pouco previsível em uma
senhora dos pagos.
Desceu a ladeira, dando
o que podia. Assim mesmo consegui tirar-lhe a lata das mãos e corri,
chutando-a ladeira abaixo.
Parei, cansada e já
satisfeita com a exemplificação. O difícil mesmo foi
encarar a platéia escandalizada que se formara na escadaria do prédio
em que estava estacionada a Gabi, o pivô do escândalo.
Naquele dia a história
correu a cidade.
Alcyone Abrahão
Do livro: "Não coloque o macaco diretamente sobre o pavimento", Goiânia UNIGRAF, 1983, GO