Peñiscola, Península em português, terra de origem
do Papa Luna, é uma praia de sonho, reconfortante, pacata e adorável.
Não faltam referências nesta recatada, agradável
e pequena cidade ao Papa Luna, sendo este o íntegro e virtuoso Papa
Benedito XIII, mudado em 1411, por causa do grande Cisma do Ocidente, para
esta fortaleza sobre o mar azul a coroar uma espécie de exígua
península alta e rochosa, convertendo o seu castelo templário
em palácio e biblioteca pontifícia.
O clima é ameno, excelente para bronzear a pele corporal na
Primavera e no Outono, quente e tórrido no Verão, o areal
largo e extenso com quase uma dezena de quilómetros de areia fina,
o mar temperado de azul turquesa, há palmeiras tropicais nos seus
jardins e orlas costeiras, as austeras muralhas do castelo são robustas
assim como as abóbadas quinhentistas de arco em ponta que as entrecortam.
A cidade antiga de ruas estreitas, tortuosas e degraduadas, apresentam
medievais pedras trabalhadas, estão bordejadas de artesanato e roupas,
cangalherias de toda a espécie, roupas e cerâmica, metais
trabalhados, encimam-nas o Templo Paroquial da Virgem do Socorro, com traça
gótica do séc. XV.
Mas, se Peñíscola é sítio de descanso e
recreio, excelente para a prática de exercício pedrestre,
de footing, é também restaurador de boa cozinha, e se se
quiser requintar um pouco mais, dá-se um pulo ao lado, a Benicarló,
cidade antiga, e porto de pesca por excelência, com restaurantes
sóbrios, mas de apurado serviço gastronómico para
peixe e marisco. A paella e o Fiduá são pratos bem apresentados,
saborosíssimos, a preços módicos. Passa-se muito bem
meio mês a comer peixe de todas as formas e feitios. O anexim popular
com sotaque catalão, aí usado com frequência: ..."lo
peix a qui s'el mereix", o que quer dizer: o peixe a quem o merece, diz
tudo; cozinhado como é, nesta Costa de Azhar, deixando que, pela
sobriedade com que é cozinhado, fique retido na confeição
todo o seu sabor natural, relativo à sua espécie, ele é
e só pode ser apreciado por todos os gostos de pessoas que gostem
de se sentar à mesa... mas degusta-o, certa e particularmente, a
gente que gosta e sabe comer uma boa refeição sem necessidade
de grandes ostentações.
As pessoas são simpáticas, não se vislumbra miséria
nas ruas, as feiras semanais são dignas de se ver, pelo facto de
serem concorridas e alegres, divertidas e atractivas; nelas se expõe
o que há de melhor na região: gado, artesanato, fruta, doces
regionais, mel, enchidos e queijos de superior qualidade, roupas e calçado
barato e "recuerdos". Dar uma volta pelas redondezas, é reconfortante,
há as planícies enormes e aráveis, e a elas sucedem-se
as montanhas com oliveiras, laranjeiras e figueiras.
Peñíscola é das poucas praias em Espanha que mantém
muita originalidade, carregada de História tal como está;
por lá passaram fenícios e gregos, cartagineses, romanos,
bizantinos e árabes; ela é ao mesmo tempo lugar de culto,
de arquitectura, de praia e mar despoluídos, de gastronomia, beleza
e calmaria. Com bons Hotéis, ir aí na Primavera é
deparar com um local de encanto e de sonho. Do Porto lá, são
mil e duzentos quilómetros que se fazem num dia, se se utilizar,
como meio de transporte, um automóvel confortável equipado
com um bom aparelho hi-fi, instalado a quatro colunas no habitáculo,
podendo ainda parar-se duas ou três vezes para comer e visitar uma
ou outra cidade aparecida no trajecto, que as há muito interessantes.
Recordo Salamanca, Medina del Campo, Madrid e Valença. A seguir
para quem já está aí, uma ida a Barcelona completa
a sede de recreio e conhecimento.
Cada praia, cada monte, cada parque, só podem ser apreciados
pelos olhos enevoados que temos atrás dos nossos olhos de azeitona
ou de castanha. Os olhos são as lentes que observam o mundo com
muita crueza, o que não exprime nada a não ser a sua rudeza.
A névoa que está por trás dos olhos, é que
transfigura a rudeza em prazer. Vê o que queremos ver, observa o
que é matizado pela nossa alma com a sede da beleza que está
no nosso interior. Por isso, descobrimos paraísos onde às
vezes eles estão em consonância com os que encontramos dentro
de nós, apreciamos com as mais agradáveis sensações
e emoções, os que, ao estar dentro, estão também
e concomitantemente fora de nós... somos nós quem dá
a verdadeira dimensão do mundo reflectido num filtro cultural até
ao nosso eu, que capta, interioriza e exterioriza essa emoção,
e é o Céu que vamos descobrindo ao juntar todos os paraísos
terrestres, os quais, ano após ano, vamos reunindo na nossa memória,
aquele Céu que nos espera quando voltarmos à origem. Tendo-o
descoberto, o Céu, descobrimo-nos e prendemo-lo para a eternidade...
prendemo-lo, enquanto o nosso estado precário, parecer definitivo,
para que demos a ideia de que a humildade é uma virtude a preservar.
E é, sem sombra de dúvida.
Armando Figueiredo (Daniel Cristal)