AQUI OU ACOLÁ, CADA COISA NO SEU TEMPO...
Nada como atravessar fronteiras geográficas para expandirmos os limites do nosso território interno. Foi pensando nas oportunidades de crescimento pessoal que escolhi o México como destino, um país lindo, de rica história e com um povo caloroso e gentil. Nesse cenário, a Península de Yucatán, berço de uma das mais antigas e avançadas civilizações da era pré-colombiana, os Maias, seria o local de pousada.
No entanto, o que me aguardava não era mais uma das minhas viagens de aventura pelo mundo a fora – sem lenço nem documento – desta vez viajava com a família: meu marido e mais três aprendizes na arte de desvendar o mundo: minhas filhas de 10 e 13 anos e minha enteada de 6, o que fez TODA a diferença na assimilação dessa experiência...
Para começar, as quase 15 horas de viagem que tivemos de enfrentar até chegar a La Playa, incluindo mudança de aeronave e serviço de traslado até o hotel, nos mostrou como o exercício sacerdotal da paciência é imprescindível quando se trata de “atravessar fronteiras” viajando de classe econômica com crianças... eu quase cheguei a acreditar que as poltronas delas eram BEM menores que todas as outras...
Em compensação, nosso hotel era um desses lindos resorts construídos praticamente na areia da praia, diante do impressionante mar azul turquesa que banha o Caribe. Um lugar perfeito para descansar depois de passar o dia explorando os arrecifes, feiras populares, museus e ruínas maias da região. Isso, claro, se o grupo coincidisse em seus horários, preferências e idiossincrasias... e se a água cristalina e o simpático senhor de “sombrero”, que distribuía sorvetes gratuitamente para todos os hóspedes, não funcionassem como um poderoso imã que, praticamente, nos impedia de deixar as instalações do hotel.
Logo no primeiro dia fomos acordados bem cedo por um grupo de flamingos escandalosos que batiam ponto justamente no lago que ficava embaixo da nossa janela... Diante das reclamações infanto-juvenis, sugeri que esse “coral” fosse encarado como um ótimo despertador natural... que nos ajudaria a começar o dia bem cedo... A aceitação dessa “metáfora” foi quase nula. Outro detalhe curioso (e desesperador para as crianças) que caracterizou nosso dia-a-dia era o fato de a porta da varanda de nossa suíte ter que permanecer sempre fechada sob pena de termos nossos pertences furtados pelas famílias de primatas que visitavam freqüentemente o segundo andar. Fora isso, nossa suíte tinha como vista o verde exuberante de árvores frondosas nas quais, diariamente, pousavam dezenas de pavões, sim, pavões que alçavam vôo e se acomodavam com certa elegância nos galhos mais resistentes.
A deliciosa gastronomia mexicana, que como toda culinária regional revela particularidades culturais de seu povo, teve que ser degustada com parcimônia pela tríade jovem, já que até a sobremesa poderia vir temperada com uma pitadinha de pimenta... Nada que causasse o mínimo desgosto para as meninas, pois da caçula à primogênita todas parecem ter nascido configuradas para detectar lojas McDonald's a quilômetros de raio de distância... Assim, de posse de um “bom motivo” para apelarem, elas – mesmo sabendo que sou uma detratora veemente desse tipo de alimentação – me convenciam, vez por outra, a consumir a famosa refeição de plástico.
Mas, o ponto alto dessa viagem de dez dias foi a visita que fizemos aos dois renomados parques ecológicos da região: Xel-Ha e X-Caret. Todas as atividades oferecidas eram desenvolvidas ao ar livre e quase sempre envolviam água e/ou a companhia de animais, o que resultou divertidíssimo para as meninas. Mas, sem dúvida, as estrelas indiscutíveis desses lugares eram os golfinhos... e, como não podia deixar de ser, acabamos adquirindo um passe de hora e meia para que as crianças pudessem ficar nadando, alimentando, dançando e brincando com os encantadores delfins. Tudo isso devidamente registrado para a posteridade com uma filmadora profissional... Já que vamos embarcar no turismo óbvio, façamo-lo com um pingo de estilo...
Outro grande atrativo da viagem para a criançada e para minha mais absoluta frustração foi o dia de compras em Cancun... Para nosso espanto a mais excitada com a aventura consumista era a caçula, que se escrevesse com um pouco mais de desenvoltura já teria trazido pronta de casa sua própria lista de mimos e souvenires.
Bem, a verdade é que, dessa vez, minha intenção de visitar ruínas e museus, de nutrir nossa visão de mundo, de dilatar nosso saber cultural... não foi materializada por completo, ou melhor, não se realizou da forma como havia imaginado. Mesmo assim, devo dizer que extraímos dessa experiência resultados não menos valiosos. A família, em especial as crianças, se beneficiou muito ao ter que lidar com uma série de situações imprevistas e escolhas incomuns que se apresentaram ao longo daquele período. Foi bom para todos nós comprovar que a eficácia na comunicação depende mais da capacidade de ouvir o outro com atenção do que de dominar um idioma, que é difícil compreender e respeitar outros povos se não nos habituamos a compreender e respeitar as peculiaridades de cada membro da nossa família, que é essencial aprender a conviver bem em grupo, assim como saber discernir quando devemos liderar ou acatar nosso líder e, ainda, que é muito importante SENTIR profundamente as experiências em que mergulhamos antes de incorporá-las à nossa bagagem intelectual.
Por fim, a moral desta estória, sob o meu ponto de vista, é: nada melhor do que desfrutar cada vivência no tempo certo... no tempo de cada um.
Fernanda Loureiro