TUTANKAMON E EU

Eu estava no Egito em 1989.

Formou-se uma  excursão quase que só de amigos, mas eu pedi que me deixassem na tenda de um árabe no deserto, pois minha pressão baixa não ia permitir que saísse por ali no calor do meio-dia para visitar tumbas de faraós - tumbas vazias, diga-se de passagem. Para mim, só havia interesse na tumba do faraó Tutankamon, cujo corpo voltara ao túmulo - se bem que, suas "quinquilharias " continuassem no Museu do Cairo.   

Fiquei sentada sob um "puxado" da tenda observando os filhos do dono esculpirem estatuetas de deuses egípcios em alabastro. O pai não fazia absolutamente nada... a não ser dormitar apoiado num bastão, com as pernas estendidas na areia. As crianças trabalhando sob o calor intenso.

Chegando meus companheiros, nos dirigimos à tumba de Tutankamon. Claro que a vida moderna já providenciara todo o conforto para os turistas. Perto da tumba abriram um bar.

Como o túmulo só abriria às três horas da tarde, ficamos bebendo refrescos para fazer hora.

No Museu do Cairo, diante de tanta riqueza em ouro, marfim, pedras semi-preciosas, algo me impressionara muito... O buquê de flores secas que ali estava, retirado do caixão de ouro, o último sarcófago, dos outros encaixados; no que estava enfim, o corpo do Faraó.  

Sob uma tampa de ouro que cinco homens custaram a soerguer, estava o testemunho de uma estação dA natureza, depositado pelas mãos agora vazias de presença - as mãos da mulher do Faraó de dezoito anos. Ela não mergulhara o rosto no ouro duro e frio, ela chorara por entre as flores.


Ao se aproximarem as 15 horas naquele deserto, fomos nos reunindo na rampa de descida para o túmulo. E foi então que as coisas começaram a acontecer...

Eu estava tão ansiosa que construí um casulo na eternidade, e, sem me dar conta ali me refugiei.

A responsável pela visitação do túmulo chamava as nações. Em dado momento, ouvi: "Brasil"!

E tudo o mais desapareceu! Uma amiga me garantiu que desceu comigo, mas, eu não a vi, como também não vi mais ninguém...  Todos desapareceram!

Desci por uma rampa, e chegando na sala onde estava o esquife, me vi dentro de um camarote, como que num teatro. Uns metros adiante, inalcançável, estava o caixão.  Sobre a múmia, uma máscara de ouro.

Num curso de egiptologia, eu ouvira do professor, constantemente, uma afirmação:

— Tutankamon foi um rei inexpressível. Morreu cedo e nada fez.

Mas uma vibração desconhecida havia à sua volta. Explodi num pranto que não conseguia parar.Tudo desaparecera à minha volta até eu me dar conta de que tinha de ceder o lugar para os outros, e, comecei a subir a rampa ao lado - vazia a rampa e vazio lá em cima.  Eu devia estar agindo como autômata ou sonâmbula, porque não me recordo como me reuni aos amigos, como viajei  de volta ao Cairo.

A Eternidade e as flores preservam a ausência de vida.

"Olhai os lírios dos campos...  e nem Salomão em toda sua riqueza se vestiu como nenhum deles!"

Clarisse de Oliveira

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