TOMAR (*)
(cidade mística)
 
 
Interior do Convento de Tomar
Janela manuelina do Convento de Tomar
Exterior do Convento de Tomar
 
Parece que o nome de Tomar, se não é propriamente árabe, foi, pelo menos resultante de uma arabização e por intermédio dos árabes o recebemos. Também segundo parece, foi a vegetação local e nas águas do rio Nabão, o motivo da escolha do nome, que anteriormente tinha sido potamónio, o que não prejudica o parecer, pois bem aceitável é a hipótese de os ouros terem dado ao rio um nome provocado pela abundância da tal planta — o tomilho — que se encontra em abundância neste rio. O tomilho, planta labiada, era conhecida dos gregos; mais tarde os romanos trouxeram o nome para a península (THYMUS), os mouros nacionalizaram-na segundo a sua índole da sua língua e foi assim nacionalizado, isto é, arabizado, que deu a forma "thomar" mais tarde Tomar.

Esta cidade, sede de um concelho cujos limites se aproximam daqueles que constam da doação do Castelo de Cera aos Templários, em 1159, conserva ainda inviolados os mistérios da sua origem e simbolismo arquitectónico.

Situada numa rota tradicional de transumância, a sua implantação no ubérrimo vale do rio Nabão, praticamente desconhecido e filão arqueológico riquíssimo particularmente para os especialistas do Paleolítico - embora infelizmente afectado pela industrialização, mais ou menos selvagem a que tem sido sujeito - obedece, pelo menos desde os tempos da ocupação romana, às regras seguidas para a eleição, sacralização e instalação territorial, quando o homem sabia organizar o seu espaço vital à medida e semelhança das configurações celestes que lhe presidiam.

As fontes dessa cosmografia sagrada encontram-se hoje diluídas em lendas e tradições sucessivamente revitalizadas até, pelo menos, ao século XVl.

Uma das mais marcantes é a lenda de Santa Iria, virgem mártir do século Vll, religiosa de um convento beneditino fundado por S. Frutuoso, que teria existido no local onde hoje vemos a igreja de Santa Maria do Olival: a Nabância. Este topónimo é desconhecido dos geógrafos antigos, o que aliás, não invalida a existência de um importante núcleo populacional que a moderna historiografia prefere designar por "Sellium" e que os frequentes achados arqueológicos confirmam.

E que dizer da mata dos Sete Montes, protótipo do recinto sagrado por excelência, habitualmente relacionada com as proezas iniciáticas templárias e o seu fabuloso tesouro — encantado?...

Sigamos, porém, o modelo urbanístico concretizado no século XV, ou seja já durante a vigência da administração da Ordem de Cristo, sucessora e herdeira dos bens e conhecimentos da Ordem do Templo (Templários), pelo infante D. Henrique, grande impulsionador dos Descobrimentos e iniciado nesta Ordem. A ordenação de Tomar, processa-se segundo uma cruz axial cujos braços são dirigidos aos quatro principais pontos cardeais.

Mas vamos situarmos no local onde se situa o Castelo e o Convento de Cristo...

Entramos no recinto ameado do Castelo pela Porta de San’Iago, que conduz à outra, designada por Porta do Sol, por onde se concretiza a entrada no terreiro de armas da fortaleza. Daí, imediatamente se torna patente a fachada dos Paços do Infante e a Charola dos Templários, dedicada a S. Tomás da Cantuária e limite primordial da muralha poente da cerca casteleja que Gualdim Pais terá restaurado, a partir de 1 de Março de 1160, com base no remanescente de uma anterior fortaleza, talvez da época romana e sucessivamente renovada e adaptada de acordo com os conhecimentos de geomancia, a que, aliás, a lenda da refundação se refere. O que, não obstante a brevidade requerida pela circunstância, será impossível escamotear é o rigoroso traçado a que obedece o plano de construção, tanto do Castelo como do Convento de Cristo. O singular simbolismo arquitectónico e iconográfico compendiado na fachada em que se rasga a conhecidíssima janela da Sala do Capítulo, (janela manuelina) se for decifrado, poderá permitir o entendimento do projecto e objectivos dos Cavaleiros de Cristo, esclarecidos guias do povo português com vista à instauração de uma fraternidade humana inspirada pelo Espírito Santo e coreograficamente preludiada pelo culto ao Paracleto, cujo auge coincidiu com o apogeu da expansão marítima liderada pela Ordem de Cristo e assumiu em Tomar uma forma próxima daquela que a Festa dos Tabuleiros hoje reveste.

Tomar foi conquistada aos mouros em 1147, por D. Afonso Henriques, e, mais tarde, em 1159, doada aos Templários . D. Gualdim Pais , mestre da Ordem, em 1162 concedeu-lhe foral.

Com a extinção da Ordem do Templo em 1312, foi por D. Dinis, com o consentimento do papa João XXll, fundada a Ordem de Nosso Senhor Jesus Cristo, com sede em Tomar. Em 1510, D. Manuel l concedeu-lhe foral novo e visitou-a durante muitos anos. Foi elevada à categoria de cidade em 1844 e no ano seguinte recebeu a visita de D. Maria ll.
 

CONVENTO DE CRISTO

O recinto conventual, que foi pertença, inicialmente, da Ordem do Templo e passou, no reinado de D. Dinis, para a égide da Ordem de Cristo, é um dos principais monumentos da arquitectura nacional, ode todas as etapas estéticas, desde o século Xll ao XVlll, se encontram ampla e profundamente documentada.

Penetrando no reduto do arruinado castelo templário, edificado por Galdim Pais em 1160, pelo portal nascente, e seguindo uma longa escadaria onde a cada passo se vislumbram vestígios seculares, entre os quais as ruínas da velha alcáçova templária e dos Paços Henriquinos, atinge-se a igreja e demais dependências do convento.

O primitivo oratório, que remonta ao final do século Xll, é um exemplar românico que se inspira no modelo oriental das igrejas italo-sírias em rotunda, cerrado e murado como uma fortaleza. Era inicialmente uma construção formada por um prisma octogonal centrado numa rotunda de dezasseis faces, consolidada por singelos contrafortes gigantes nos vértices. No prisma central abrem-se arcos levemente apontados que pousam sobre colunas capitelizadas romano-bizantinas.

A charola de Tomar, cuja traça se baseou no tipo de mesquitas sírias, gosto adquirido pelos cavaleiros da Ordem do Templo durante as lides orientais, e por eles aplicada no Ocidente, é um raríssimo santuário da Alta Idade Média que segue o protótipo da Ermida de Omar, em Jerusalém, modelo igualmente aplicado nas Capelas de Eunate em Navarra e Vera Cruz em Segóvia (terras espanholas). No princípio do século XVl, a charola, oratório dos Templários, foi adaptada a capela-mor do novo templo que então se erigiu, tendo duas das faces do polígono da rotunda sido sacrificadas em favor da magnífica nave manuelina. Suprimido então também o elmo ameado de pedraria que a coroava, permaneceu a cerrada cabeceira românica, que, abstraindo da abundante decoração quinhentista, transmite ainda uma ideia do que foi o primitivo oratório. Uma iluminatura da "Leitura Nova" de 1508 representa o convento com a charola, antes das modificações de Diogo de Arruda, provida de coruchéu exterior assente num tambor octogonal (foto acima).

Segundo o cronista Pedro Álvares Seco, foi o rei D. Manuel l, após 1510, que ordenou a decoração da capela-mor do novo templo com esculturas, pinturas e outros elementos. Nas paredes da charola subsiste ainda grande série de pinturas sobre madeira, encomenda régia anterior a 1510, constituída por vários painéis. Trata-se de opulentos primitivos com vincada influência nórdica, talvez da escola do pintor Jorge Afonso. Várias capelas do deambulatório foram ordenadas também durante campanhas de obras joaninas, com pinturas retabulares que, pela colocação, se assemelhariam a predelas das grandes tábuas manuelinas citadas. Desta série apenas estão nos lugares de origem os quadros Santo António Pregando aos Peixes e São Bernando.

Muita coisa ficou por dizer deste maravilhoso Convento de Cristo e da sua famosa janela manuelina (foto acima).
 

CASTELO DE TOMAR

Constituído primitivamente pela torre de menagem, pela alcáçova e por uma curta cintura de muralhas, foi posteriormente ampliado com u largo cordão reforçado por cubelos. Balizava o velho burgo, que no século XV alastrou para a planície. Do antigo castelo, fundado por Gualdim Pais, subsistem vários panos de muralha e a torre grande, que apresenta, embebidas nos parietais, lápides romanas e legendas medievais. O velho Paço Henriquino, que foi alcáçova inicial do reduto templário, reduz-se a alguns trechos muito incompletos, um dos quais ostenta uma janela de verga recortada e um portal em ogiva. Os trechos merlados, em que se rasgam cubelos etorrelas, envolvem o recinto do Convento de Cristo, integrando-o numa unidade arquitectónica que, no seu conjunto, domina a cidade. Uma das lápides que se vislumbram, sumida, na torre templária, sobre a fresta do segundo pavimento, alude a Gualdim Pais e é contemporânea da fundação.
 

 RUÍNAS ROMANAS

A cidade actual provém de um agrupamento populacional romano denominado Sellium, algures existente na margem esquerda do Nabão. Na zona têm sido encontrados inúmeros vestígios da ocupação romana. Assim, em 1952, foram postas a descoberto, no cerrado de João do Couto, algumas sepulturas de uma necrópole, cujo espólio era constituído por resíduos de tijolos, um peso de um tear de barro com marca de oleiro, uma lâmina de faca, argolas de vidro e diversas moedas dos séculos lll e lV.

A 2 Km de Tomar, pela estrada fronteira a Santa Maria do Olival, no sítio da Marmelais, existiu a antiga Nabância, onde numeroso espólio romano tem sido encontrado (estátuas, moedas, mosaicos, ruínas de casario) e onde ainda estão patentes alguns arruamentos da secular urbanização.
 

OS TEMPLÁRIOS

Tal como as estrelas da Via Láctea, os Visigodos dividiram-se em dois grupos e os que tomaram a direcção de Espanha, dirigiram-se a Toledo. Os mais usados continuaram a avançar em direcção a oeste, até Tomar, e a partir daqui espalharam-se em direcção ao norte. Depois de terem conquistado a capital dos Alanos, Bracara, instalaram-se lá e deram-lhe o nome de Braga.

De acordo com as tradições visigóticas, Tomar era um ponto telúrico extremamente propício e esta terra privilegiada foi, posteriormente confirmada várias vezes através da história.

Nesta região, São Bernardo mandou edificar um dos mais belos florões da Ordem Cistercience, ou seja o Mosteiro de Alcobaça que, ainda hoje continua a ser uma das obras-primas mais puras da arquitectura gótica no seu início. Alcobaça fica a cerca de sessenta quilómetros para poente de Tomar e a meio caminho fica Fátima.

Templários ou Cavaleiros do Templo, era uma Ordem militar religiosa, fundada em 1118, distinguindo-se particularmente na Palestina. Em Portugal prestaram relevantes serviços na luta contra os mouros.

No início do século XVl, a Ordem dos Templários era poderosa, rica e corrompida. Diferente dos Hospitalários e dos Cavaleiros Teutónicos, os Templários não se podiam vangloriar de terem feito qualquer cruzada desde o abandono da Terra Santa aos muçulmanos. Recusando encarar uma aliança com os Hospitalários, acabaram por adquirir uma reputação de aristocratas amantes do luxo. Por isso, Filipe "o Belo" de França decidiu que era tempo de reformar a Ordem. Além disso, pensava que, apropriando-se das riquezas dos Templários, podia encher os cofres reais. Tal razão levou este rei francês, bruscamente, a ordenar que se levantasse um processo aos Templários, acusando-os de heresia e de imoralidade. Em 1307, todos os Templários de França, que eram cerca de dois mil, foram presos e sujeitos sem contemplação ao suplício de um interrogatório.

Tendo recebido ordem de obter confissões, até pela tortura se fosse necessário, os inquiridores obrigaram-nos a confessar diversos crimes, actos de imoralidade, ritos de iniciação herética e outros delitos secretos.

Entretanto, os novos inquéritos, ordenados pelo Papa Clemente, revelaram que grande número de confissões tinham sido arrancadas pela tortura ou, até mesmo, apenas pela crença da tortura. Uma das vítimas, por exemplo, depois de ter visto algumas carroças cheias de Companheiros do Templo, que eram conduzidos ao carrasco, acabou por confessar ter morto Cristo!

Por isso, mais tarde, numerosos prisioneiros negaram as confissões que lhes tinham sido arrancadas pela força. Tais afirmações levaram o rei francês Filipe e seus comparsas a sentirem-se na obrigação de defenderem o seu procedimento. Resolveram por isso excitar o espírito do povo, o que provocou, por parte deste, a exigência de uma severa punição dos Templários, considerados como destruidores da religião e da moral. Algum tempo depois, o Papa Clemente V cedeu e aboliu a Ordem, declarando contudo, que a culpabilidade não estava provada.

Os Templários tinham entrado em Portugal em 1125 e uma das figuras mais carismática, foi sem qualquer dúvida o Mestre Gualdim Pais, nascido em Braga e Cavaleiro de D.Afonso Henriques, o primeiro rei de Portugal.

Depois da extinção dos Templários, o rei D. Dinis "o Lavrador" e um dos mais queridos dos portugueses, transformou os Templários na Ordem de Cristo, cujo símbolo, as naus portuguesas levaram a todos os cantos do mundo.

Noutros trabalhos já foi falado o rei D. Dinis, sexto de Portugal que além do cognome histórico de o "Lavrador" também era conhecido por "Rei Trovador".

Um dos Mestres mais famosos da Ordem de Cristo, foi o Infante D. Henrique "o Navegador", filho de D. João l e de D. Filipa de Lencastre, nascido em 1394 na cidade do Porto. Fundo em Sagres (Algarve) uma escola nautica, um observatório astronómico e estaleiros para construção de navios.

Chamou do estrangeiro cosmógrafos e matemáticos ilustres que, com alguns Cavaleiros da sua Casa se entregou ao estudo das cartas marítimas. Todos os anos, uma caravela, armada à sua custa e capitaneada por um seu Cavaleiro ou Escudeiro, partia mar fora à descoberta de novas terras. Quando o Infante D. Henrique morreu, em 1460, deixava reconhecida a costa africana até à Serra Leoa, preparação para o grande feito de Vasco da Gama, a Descoberta do Caminho Marítimo para a Índia, trinta e oito anos depois. D. Henrique, assim como seus pais e seus irmãos, repousam no Mosteiro da Batalha na sala "Ínclita Geração".
 

                               D. MANUEL l "o VENTUROSO" e o CONVENTO DE CRISTO

O sucesso dos Descobrimentos e a riqueza súbita e colossal que deles adveio, fizeram de Portugal e dos seus soberanos os felizes beneficiários da "charola" da fortuna.

O gosto requintado de D. Manuel 1 levou este soberano a edificar numerosos monumentos que marcaram um novo estilo — o Manuelino. Este renascimento artístico espalhou-se por Portugal inteiro, de tal modo que todos os santuários, todos os edifícios pretenderam ordenar-se com decorações manuelinas.

Tomar não foi excepção a esta regra. As igrejas de São João Baptista e de Santa Iria, primeiro, e mais tarde o castelo medieval, que foi enriquecido com o Convento de Cristo.

Detentores de uma verdade arquitectural, os seus construtores souberam respeitá-la e a construção do convento foi adaptada à do castelo tendo em consideração a disposição "cósmica" precedente.

O desvio existente — cerca de cinco graus — prova que a data, no máximo, de 1510 (de acordo com a precessão dos equinócios, e considerando setenta e dois anos por cada grau, cinco graus correspondem a trezentos e sessenta anos).

Os conhecimentos secretos que tinham feito nascer o estilo "francês" aplicados pelo monges de Clairvaux na construção do Mosteiro de Alcobaça e, por outros mestres-de-obras na edificação da Catedral de Évora e nas magníficas realizações góticas da Ilha de França, não se perderam. Fazem parte da herança concedida a D. Manuel.

Na mensagem secular subsiste um princípio essencial do conhecimento chamado "gótico", que resulta da igualdade entre um círculo, um quadrado e u triângulo. Geométricamente, este princípio corresponde a uma determinada quadratura impossível de realizar de acordo com os dados pitagóticos. Estes dados estão inclusos na referida quadratura, mas não podem fornecer a chave, visto que o "Pi" clássico (3,1416) deixou de ser um jogo. A quadratura aplicada a todas as obras de estilo gótico permite a sua análise imediata. E permite igualmente recolhê-las sem possibilidade de erro. Os números nasceram do Apocalipse de São João, e correspondem aliás aos da estrutura nuclear. Trata-se portanto de relações universais. Um círculo de diâmetro invariável e dois quadrados, com o mesmo perímetro e com a mesma superfície que o círculo, constituem a base deste princípio, que alia simbolicamente o Cosmo — o círculo; a Criação — o quadrado; e o Ternário espititual — o triângulo.

Sobrepondo-os sobre a planta do castelo de Tomar, verificamos que todos os elementos, incluindo as torres, correspondem às diferentes coordenadas.

O mesmo princípio aplica-se igualmente à parte do estilo "manuelino" com um desvio de cinco graus. A concordância permanece, fazendo notar a evolução do saber. A cúpula dos Templários é o ponto principal a partir do qual foram feitas as construções posteriores e a célebre "janela manuelina", que é a síntese arquitectural do estilo manuelino, é justamente considerada como a obra-prima da época. Esta evocação sumptuosa (estamos a falar da janela manuelina do Convento de Tomar), está cheia de uma fantasia genial onde uma mesma alegoria reúne símbolos e personagens. Um navegador, de que vemos somente o busto, sustenta com ambas as mãos o tronco de um sobreiro com imensas raízes e a cortiça constitui um elemento decorativo dos dois lados da parte superior da janela. Cordas e algas completam os símbolos terrestres e náuticos. As armas do rei D. Manuel e a cruz dos Cavaleiros de Cristo encimam o conjunto.

A sua construção não se afasta das regras geométricas, cuja tradição respeita escrupulosamente, sobrepondo-lhe toda a alegria dos feitos magníficos que transcreve na pedra numa evocação jovial.

Um quadrado com a mesma superfície que um círculo - cujos lados são prolongados - determina, sobre o círculo resultante do quadrado que circunscreve o círculo inicial, os pontos de um novo quadrado. E assim por diante. É muito simples, e podíamos até dizer que parece ser um princípio elementar, visto que a largura da janela é indicada pelas duas linhas que ligam as intercepções do círculo com o quadrado. Mas há que aceitar a quadratura e conhecê-la ! Tudo isto parece tão elementar que actualmente este princípio parece ser o resultado de pura utopia, uma vez que o nosso século se debruça sobre o estudo de verdades secundárias que não conduzem ao caminho da Verdade primordial. Conhecemos o sucesso alcançado por aqueles que procuraram a verdade primeira e estamos assaz inquietos relativamente ao sucesso dos que desprezam a tradição.

E esta janela conduz-nos até às riquezas escondidas, visto que são sempre ângulos de treze graus que nos são mostrados pela corrente e pela fita que envolvem o tronco nas partes laterais. São os símbolos da Ordem da Jarreteira e do Tosão de Oiro.

Os portugueses souberam ilustrar a lenda dos Argonatas e, mais felizes do que os seus predecedores míticos, descobriram uma Cólquida (antigo país da Ásia aonde os Argonautas, segundo a tradição, foram conquistar o Tosão de Oiro), mirífica que lhes dá nomeada e riqueza.

O conhecimento perdido, a charola, voltou e o Ouro dos Templários ficou novamente em segredo. E Mestre Gualdim Pais já não está no sarcófago. A placa que cobre as suas cinzas tem no entanto algumas marcas iniciáticas.

Qual o papel neste "In Memoriam" do pequeno círculo com oito raios por cima de três traços verticais, símbolos das três posições solares fundamentais e base da cosmogonia dos Templários?

Este lll corresponde a trinta e sete, de onde extraímos o ternário nele contido. E mais uma vez temos o número trinta e quatro. E o número trinta e quatro compreende treze e o seu oriente, assim como vinte e um o número das catedrais góticas dedicadas a Nossa Senhora Virgem Maria, rainha universal e medianeira entre o Céu e a Terra que o homem idealista e inquieto procurará indefinidamente no mito do eterno feminino.
 

O CONVENTO DE CRISTO E SEUS MISTÉRIOS

Os conhecimentos geométricos dos Templários, baseados nas progressões aritméticas e nas relações entre os números com correspondência universais, tinham necessariamente de conduzir os investigadores da Ordem a transpor as portas alquímicas da transmutação. Os Cavaleiros de Cristo acenderam novamente o facho e a disposição das construções manuelinas devia corresponder a esta necessidade.

No Convento de Cristo, não faltam indicações alquímicas e a construção constituí um caminho iniciático que nos é oferecido neste lugar. Para encontrarmos a porta, teremos evidentemente de partir do antigo castelo templário. Na sua linguagem secreta, o princípio alquímico utiliza o ovo como ponto de partida. O ovo alquímico encerra ao mesmo tempo o princípio, o germe e o todo, capaz de desencadear o processo de transmutação por meio da repartição dos electrões; de acordo com o princípio elíptico do movimento giratório dos átomos. O que é verdade no mundo intersideral para os planetas também se aplica à estrutura da matéria. O ovo será portanto o símbolo exotérico deste princípio esotérico. Mas o processo alquímico da transmutação só pode ser desencadeado de acordo com as correspondências terrestres e celestes. Não se pode ser iniciado em qualquer altura nem em qualquer lugar. Somente em determinados lugares privilegiados lhe convém, situados sobre filões telúricos excepcionais. O mesmo acontece com todos os fenómenos de uma determinada alquímica "cósmica".

Foi assim que os maiores "milagres" da Idade Média só se deram em santuários situados sobre filões benéficos e, sempre, a Virgem Maria se manteve associada a estes favores celestes sobrenaturais. Em Portugal, é sobre o filão telúrico de Fátima, que as aparições foram acompanhadas em 1917 de fenómenos solares. A Virgem Maria, continua a ser uma imagem sagrada da ligação fluídica que liga o Céu com a Terra. Foi em 1917 — o dezassete que já conhecemos tão bem - que a Virgem se associou ao Sol, neste lugar modesto e tão mal conhecido como era na época.

Se examinarmos o aspecto geral da fachada do castelo de Tomar, podemos ver não somente que as torres estão regularmente dispostas — de acordo com uma divisão por seis do quadrado do mesmo perímetro que o círculo — mas ainda que todo se inscreve no quadrado com a mesma superfície. Voltamos a encontrar os ângulos habituais e a altura da torre corresponde à posição do Sol ao meio-dia dos equinócios na latitude de Tomar. O caminho em direcção ao pátio interior, que separa o antigo castelo do Convento de Cristo, termina na torre quadrangular (foto acima).

É muito provável que debaixo do solo deste pátio existam uma ou várias salas subterrâneas a que seria possível chegar p ssando pelo poço. É deste ponto, com efeito, que podemos ver, em direcção a oeste, o primeiro sinal do ovo.  Os Templários juntaram muitas vezes ao ovo outro elemento arquitectónico que era utilizado na observação das estrelas em determinadas datas. É o chamado "olho-de-boi", pequena janela circular, cujo contorno permitia obter indicações graduadas. A tradição conservou-o, ou seja, a correspondência entre o Boi e o Boeiro.

Graças ao olho-de-boi, podemos estabelecer vários princípios arquitectónicos relativos ao convento propriamente dito, antes de encontrarmos a cabeça de três faces, o Hermes Trimegisto, que domina o centro da abóbada de uma pequena sala situada perto do refeitório. A cabeça aponta numa direcção segundo a qual, e através de uma janela, podemos efectivamente ver outro ovo. Este conduz-nos, para além da janela manuelina, até ao claustro da Micha e de seguida até ao claustro dos Corvos. A palavra "corvo" sempre foi querida dos alquimistas por encerrar em si duas interpretações secretas da preparação da Grande Obra. A sua realização só pode ocorrer num local escolhido e eleito. Este local fica debaixo do claustro da Micha, que se situa — segundo o eixo manuelino deslocado — num ângulo de treze graus em direcção a oeste.

O claustro dos Corvos faz o mesmo ângulo, perfazendo assim um total de vinte e seis graus, enquanto em onomancia, a análise da palavra "corvo" confirma o número vinte e seis.

No centro do claustro da Micha encontra-se um poço e deste poço partem duas escadas que se enterram no solo. Aqui existiriam as salas de investigação orgânica e de transmutação.

A transmutação só é possível com a intervenção do cloro, cujo número atómico é dezassete (em simbolismo, o 17 é o Número da Estrela. Não nos surpreenderemos portanto, ao verificar que o poço da Micha forma com a janela manuelina um ângulo de dezassete graus. Aliás é esta a direcção seguida pelo olhar do velho capitão que herculamente sustém o conjunto decorativo da janela.

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Veio depois o tempo em que os corvos se calaram e em que os sarcófagos do claustro dos Sepulcros guardaram e seu enigma. Os corvos mantém relações com os mortos e os sarcófagos ficam expostos ao sol da vida que continua a iluminar durante a Primavera o horizonte de Tomar...


Carlos Leilte Ribeiro
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(*) fotos cedidas pelo autor

 

 

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