|
|
|
|
|
|
A cidade de Silves encontra-se numa região que foi habitada na Idade do Bronze, o que se comprova pelos numerosos resíduos dessas épocas longínquas encontradas em escavações. Foi conquistada aos Mouros por D. Sancho l , auxiliado por cruzados dinamarqueses, holandeses, alemães e da Flandres, em 1189. Novamente perdida, só ficou definitivamente na posse dos portugueses em 1240. D. Manuel outorgou-lhe foral em 1504.
"Silves, a antiga Chelb dos mouros, foi também a cidade episcopal desde o século Xll até ao XVl, tendo sido mudada a sede da diocese para Faro no ano de 1577, quando era bispo D. Jerónimo Osório, o humanista gigante e orador eloquente, que causou assombro em Portugal e no estrangeiro.
Desconhece-se o étimo o étimo exacto do topónimo Silves, onde parece existir a raiz latina silv - ,indicativa de bosque ou floresta. A antiga grafia Sylves, que encontra, por exemplo, em Rui de Pina, não prejudica esta hipótese, pois existiram em latim as formas com y na primeira sílaba, em sylva e seus derivados". (Dr. Xavier Fernandes — 1944).
Apontamento de 1900 do Jornal do Comércio:
"Silves é cidade e cabeça de concelho de Faro, com 9.688 habitantes; é servida pelo caminho de ferro Sul e Sueste. Foi tomada aos mouros por D. Sancho l, retomada por Paio Peres Correia, e, pela última vez, por D. Afonso lll em 1249. Castelo muito antigo. O concelho tem 6 freguesias e 29.500 habitantes. Produz figos, alfarroba e amêndoas".
Atestada a presença humana na região de Silves na época paleolítica, os pontos de fixação estável vão estabelecer-se apenas no neolítico, período em que a agricultura permite e implica uma continuidade, uma permanência numa área territorial restrita, com a consequente formatação de povoado. São os menires da Caramujeira (zona também já representada no Paleolítico), são os sítios limítrofes do local em que assenta a cidade, como o nome de Roma ou o ilhéu do Rosário, situado na confluência da ribeira de Odelouca com o rio Arade.
Este último local, o ilhéu do Rosário, irá ter uma continuidade de ocupação detectada, nomeadamente, durante a época romana. Teria sido então um sítio sacralizado, avançando-se a hipótese de nele estar instalado um templo votado ao deus Neptuno, referindo-se em textos do início do século XVlll. A ser assim, a capelinha dedicada à senhora do Rosário que aí viria a ser estabelecida mais não faria senão assegurar a continuidade sacra do local, característica mesmo anterior à época romana.
Outro sítio de extrema importância na história antiga de é o cerro da Rocha Branca. Tratava-se de um povoado amuralhado que teve uma extensa continuidade de ocupação a partir dos séculos Vll a Vl antes de Cristo. Assim, este monte vizinho, a poente e a jusante de Silves, revelou presença humana através de vestígios característicos da primeira e Segunda Idades do Ferro, em que aparece nomeadamente cerâmica grega, demonstrativa de um trato de comércio ligado ao Mediterrâneo oriental. Esta mesma actividade comercial relacionada com o sítio da Rocha Branca irá prosseguir na época romana, como comprova a existência de numerosos fragmentos de ânforas encontrados no local. E a ocupação do cerro prosseguirá pelo menos durante a época muçulmana. Infelizmente, porém, o sítio foi completamente arrasado em 1988.
Tanto quanto se pode apurar da história da cidade, mas já do local do seu assentamento, o seu período de esplendor e de glória situa-se na época muçulmana. É certo que existiu uma "Kilpes, povoação que bateu moeda em época já contemporânea da presença romana em território peninsular. Porém, em pleno tempo de Roma, tempo que tantos vestígios deixou nestes arredores, pouco pode dizer-se de Silves, que são escassos os indícios localizados no seu perímetro urbano.
Será, de facto, na época muçulmana que a cidade portuária de Silves alcançará notoriedade. Particularmente nos dois derradeiros séculos da presença política em território português, a partir do momento em que cai o califado, em que a sua unidade se fragmenta. Surgem então os pequenos reinos de taifas, as cortes locais, uma multiplicidade de centros de cultura e arte, entre os quais enfileira a corte de Silves. É o que vem a acontecer com a dinastia dos Banu Musaíne. Com a pertença do território aos Banu Abbade de Sevilha e com governação de Al-Mutamide e, a seguir, com o governo de Bem Ammar. Depois com os novos senhores magrebinos, primeiro os Almorávidas, que tomaram Sevilha em 1091, a que se segue o domínio da dinastia instaurada pelos Almóadas, que atacaram Sevilha em 1148.
Mas os séculos Xl a Xll vão ser séculos de ouro de Silves. Al-Mutamide e Bem Ammar, poetas, Bem Qasi, senhor de Silves, filósofo, místico, sufi, Messias (Mahdi) do tempo que está a preparar-se para vir. Tempo de desgraça para o sufi, atraiçoado pelo político que também era e que, para fazer frente aos Almóadas, se alia ao cristão Ibne Herrik, o filho de Henrique da Borgonha, senhor de Coimbra. Uma revolta dos silvenses culmina com o assassínio do Salvador no mais famoso dos edifícios da cidade – o Palácio das Varandas.
Mas a maior das desgraças iria acontecer no ano de 1189. É que, no mês de Julho, depois de terem subido o rio, assentam arrais junto a Silves os cruzados do Norte da Europa: flamengos, alemães, ingleses - , a que se juntariam, chegadas por terra, as tropas do rei português, D. Sancho l. O acordo entre ambos os grupos tinha sido estabelecido em Lisboa. Depois da conquista, o rei apenas teria direito a conservar a terra conquistada. As riquezas móveis da cidade pertenceriam aos cruzados por direito de saque.
Um Cruzado anónimo deixou-nos uma descrição de Silves no relato que fez do seu cerco e da sua conquista pela coligação cristã. Diz ele que a cidade "é cingida de muros e fossos de tal arte que nem uma só choupana se encontra fora dos muros; e dentro deles havia quatro ordens de fortificações, a primeira das quais era como uma vasta cidade estendida pelo vale chamado Rovale (Arrebalde ?). A maior estava no monte, e davam-lhe o nome de Almedina, tendo outra fortificação no encosta que desce para o mesmo vale a fim de proteger o canal das águas e um certo rio chamado Arade ou Drake; outro corre para o mesmo, o qual se chama Odelouca; e sobre o canal há quatro torres, de modo que por aqui se provesse sempre d'água em abastança a cidade superior. E tem esta fortificação o nome de Coirasce (Coiraça)."
E foi justamente aqui, com o domínio da coiraça, cortando o abastecimento de água à cidade, que os cruzados conseguiram a vitória decisiva. Vencidos pela sede, os muçulmanos acabam por se render. A 3 de Setembro desse ano de 1189, sai da cidade a alcaide que o cronista designa por Albaino e que parece ser Issa bem Abi Halfs bem Ali.
A rendição estipulava que os habitantes de Silves poderiam deixar a cidade desde que despojados de quaisquer valores. Apenas o alcaide saiu montando um cavalo. A cidade entregava-se às tropas portuguesas do rei D. Sancho l e ao saque dos cruzados nórdicos, que tinham interrompido interrompido com este episódio algarvio a sua derrota pelas terras míticas do ouro situadas no circuito oriental.
Reconquistada dois anos depois pelo califa Yacube bem Yussufe, meio século mais tarde, entre 1242 a 1246, os cristãos viriam a apossar-se de novo – e desta vez definitivamente – de Silves. Terão sido os monges guerreiros da Ordem de Santiago quem, sob inspiração do santo seu patrono, terá submetido a velha urbe muçulmana. Pouco a pouco vai caminhando Silves para o empobrecimento. Não haverá desgraça que não ature, que até um severo Álvaro Pais, no século XlV, há-de verberar os silvenses por polígamos ...
Sede episcopal, vai assim manter-se até quase finais do século XVl. Entretanto, será o próprio assoreamento do rio Arade a contribuir para a perda de importância de Silves. As águas do rio estagnam. Despontam febres arrastadas pelo paludismo. A população rarefaz-se, deserta para o litoral. Na foz do rio desenvolve-se agora uma vila portuária – Vila Nova de Portimão. Em 1539 o bispo Manuel de Sousa pede transferência da diocese para faro. E, em 1577, será aqui, na antiga Xanta Maria de Bem Harune, que se instala com livros, bagagens e múltiplos saberes o bispo Jerónimo Osório.
Daqui para diante Silves vai estagnar. Ainda que, desde mesdos do século passado e nos primeiros decénios deste, a indústria da cortiça, com fábricas localizadas na cidade, mesmo junto ao rio, tenha impulsionado, de novo, o seu desenvolvimento. No entanto, quer a decadência desta indùstria quer a sua transferência para outros locais de Portugal, particularmente na margem sul do estuário do rio Tejo, acabaram por retirar a Silves a sua principal fonte de riqueza.
Em termos monumentais, a alcáçova e a parte da cerca da almedina ainda conservada, em boa parte ainda as velhas muralhas almóadas dos séculos Xll e Xlll constituem a principal riqueza da cidade, contribuindo fundamentalmente para manter o aspecto cenográfico que Silves apresenta quando vista, sobretudo, de qualquer das elevações que a rodeiam.
E, claro está, não poderia aqui ficar esquecido um outro ingrediente que, em termos construtivos, contribui para acentuar a imagem que a cidade oferece. É que, pela sua raridade, o grés vermelho de Silves, com o seu tom carregado, quase ferruginoso, lhe marca indelevelmente o perfil urbano, definido pela cinta e pelos blocos hoje isolados dos restos das suas muralhas.
No antigo edifício da Sé, levantado ainda no século Xlll, supõe-se que tenha desaparecido, destruído talvez em consequência de algum terramoto. A edificação actual, que conserva em estilo gótico a cabeceira e o transepto, parece já datar do século XV. Em meados deste século há notícia de decorrerem as obras da sua reconstrução. Aqui se continuou a trabalhar ainda em tempo de D. João ll, enquanto, mesmo na aurora do século XVl, há notícia de que D. Manuel l mandava "reedificar a Sé com obras novas, ficando um grande e sumptuoso templo".
Para alé da Ermida da Senhora dos Mártires, para além do cruzeiro gótico-manuelino conhecido pelo cruzeiro de Portugal, há que destacar em Silves o Museu Municipal de Arqueologia, estruturado à volta de um poço-cisterna da época muçulmana.
Descoberto no início dos anos 80, entulhado, escondia-se o poço no interior de uma cada antiga, situada mesmo junto da face interior da muralha da almedina, perto da torre que fazia parte da cerca almóada. Trata-se de uma obra de engenharia, monumental, com os seus 16 metros de profundidade. Dado o vultoso investimento a que certamente obrigou poderemos estar, talvez, perante uma obra destinada a fornecer serviço público, a menos que se trate de uma infra-estrutura integrada numa casa rica, num palacete propriedade de uma grande família local.
O museu, orientado segundo um percurso cronológico, diacrónico, expõe um espólio ordenado desde os primeiros artefactos elaborados pelo homem, no Paleolítico, até ao século XVll, época representado sobretudo por cerâmica de utilização doméstica. De particular importância é o espolio muçulmano, resultado das escavações realizadas recentemente, ou ainda em curso, no perímetro urbano de Silves.
Silves, cantada pelos poetas:
Amada pelos príncipes, procurada pelos comerciantes, cobiçada pelos inimigos, foi Silves a mais importante cidade do Algarve (... muito mais fortificada que Lisboa e era dez vezes mais rica e grandiosa em edifícios...), desde a queda do califado de Córdova até à maldição lançada do alto da Jóia, pelo bispo D. Álvaro Pais.
As origens perdem-se na bruma dos tempos, mas diz-se que já os fenícios teriam sido atraídos pela riqueza agrícola das suas várzeas e pelas possibilidades económicas que o rio Arade oferecia. Mas o seu apogeu teve lugar em pleno século Xll, quando Portugal começava a crescer e Ibn Caci governava de Mértola ao Oceano Atlântico. Nessa época, segundo o grande historiador Oliveira Martins, era "cidade opulenta em tesouros e formosa em construções, vestida de palácios coroados pelos terraços de mármore, cortada de ruas com bazares recheados de preciosidades orientais, cercada de pomares viçosos e jardins".
Entre os palácios, contava-se o célebre Palácio das Varandas, o Axarajibe, que inspirou o mais conhecido poema árabe sobre Silves, escrito em Sevilha por Al-Makkari:
De todos os edifícios falados, o único que ainda hoje dar uma visão do conjunto é o castelo, embora os restauros recentes lhe tenham dado um aspecto diferente do que tinha quando se opôs à entrada dos cristãos. É, apesar de tudo, o mais imponente castelo algarvio, coroando à cidade com suas torres e impondo-se na paisagem, seja qual for o ângulo por que seja abordada.
Existe no interior do castelo uma cisterna árabe, onde segundo se conta, há uma moura encantada que se passeia numa barca de prata com remos de ouro pelas águas cristalinas da cisterna e que em noites de São João, entoa belos cânticos de amor. Diz a tradição, que se trata de uma princesa que aguarda a chegada de um príncipe que pronuncie as palavras exactas para a desencantar.
Edificado no cume da colina de Silves, o castelo constitui um dos mais belos e mais significativos castelos de Portugal. Está construído em taipa e pedra ruiva, o que lhe dá uma tonalidade roxo-avermelhada e é construído por um polígono irregular de defesas militares.
De origem remota, julga-se que as primeiras fortificações do castelo sejam fenícias, e que por lá tenham passado igualmente, os romanos. Mas é no período de ocupação muçulmana, comprovado pelas fontes históricas e por escavações arqueológicas, que o castelo toma forma, pois, Silves foi durante quatro séculos a capital muçulmana do Algarve e daí a importância do castelo.
Em 1189, Silves foi conquistada, após um cerco de dois meses, por D. Sancho l, mas em 1191 caiu novamente nas mãos árabes. Só em 1246, é que o castelo e a cidade passaram definitivamente para o poder dos portugueses. Vinte anos mais tarde, D. Afonso lll mandou reedificar e povoar a cidade e concedeu-lhe foral. Foi capital do governo das armas do Algarve até ao reinado de D. Afonso lV, e sede do bispado do Algarve até à sua transferência para Faro em 1577.
A sua importância, porém, não fez com que fosse poupada aos vários terramotos que abalaram a cidade. Forão seis no século XlV, três no século XVL e dois no século XVlll, um dos quais foi o de 1755. Estes dois últimos foram os que causaram maiores danos.
Em 1843, o castelo foi oficialmente entregue à guarda da Câmara, que o utilizou para cadeia até Março de 1947 e nas décadas de 30/40, a Direcção Geral dos Monumentos Nacionais procedeu a um importante restauro do castelo.
Actualmente, está aberto ao público. A entrada faz-se a sudoeste por uma porta em arco de volta perfeita. Segue-se um corredor abobadado, que termina com um portal de arco abatido, onde se dá entrada para a cerca. Ao sair do portal, avista-se o varandim do sul, à direita do qual se ergue a torre ou quadrela do Canto. No caminho para o varandim foi colocada a estátua em bronze de D. Sancho l, o conquistador de Silves, em 1189. À esquerda do varandim do sul encontra-se a Torre do Oriente, também conhecida por torre das mulheres, por nela se ter instalado a prisão das mulheres.
Dentro da cerca, fica a cisterna moura composta de 4 abóbadas sustidas por colunatas, hoje quase completamemnte submersas. Encontramos, ainda, a chamada "cisterna dos cães", que parece ter substituído uma antiga mina de cobre, explorada ao tempo dos romanos. Composta por 6 torres interligadas por um passeio de ronda, sobressai a torre de menagem ou Aben-Afan (o último rei árabe) e à esquerda desta, aparece-nos a Torre do Segredo, assim chamada por ter sido destinada aos presos incomunicáveis.
___________________
(*) fotos enviadas pelo autor.