CONFISSÕES DE UM (DES) EQUILIBRADO


Sou jovem. Ainda. Alguém com apenas 45 anos ainda é relativamente jovem. Aparência física? Considero-me bonito. Tenho 1,83m, 80kg, olhos verde-claros, cabelos aloirados, um tantinho compridos, lisos. Inteligência? Sou muito inteligente... ou terrivelmente desprovido de massa cinzenta. Depende da ótica que se analise os acontecimentos aqui narrados.
Sou advogado criminalista. Defendo pessoas inocentes ou frios psicopatas assassinos. O que realmente importa é ganhar a causa e rechear a conta bancária. Consciência? Nem sei que palavra é esta. Ética? Só serve para enganar os ingênuos.
Bebo, fumo, fumo, bebo e faço sexo. Existem coisas melhores? Transo com mulheres, homens, meninas, meninos... Até com animais.
Ah, que delícia é ter entre as mãos um corpinho macio e apetitoso! É o maná dos deuses gregos no Olimpo.
Quando beijo e exploro o corpo de uma mulher e sou chupado, lambido por um homem... Oh! Que tortura prazerosa! E no ápice da ebulição carnal, quando penetro a gruta cheirosa e molhadinha da minha musa e também sou penetrado por um falo inflado e ávido por minhas entranhas... Meus olhos reviram de dor e prazer inimaginável.
Loucura? Êxtase? Descortinando o paraíso? Perversão? Ou somente o saciar de um apetite que alimento nenhum sacia?
Agora me encontro neste recinto escuro, fétido, acorrentado. Mãos e pés presos por grilhões de ferro. O sangue jorra das feridas abertas. Não ouço nada. Somente o silêncio e as minhas lembranças fazem-me companhia. Assim não me sinto só.
Fecho os olhos. Meu esquálido corpo dilacerado treme. E vejo diante de mim um grupo de jovens ainda imberbes. Gargalhando, com sua natural despreocupação desleixada, olham-me como se eu fosse um raro animal enjaulado.
Um rapazola de uns quinze a dezesseis anos se aproxima. Fita-me profundamente. Perscruta o fundo do meu ser. A curiosidade dança diante de seus olhos escuros e brilhantes. Toca-me, suavemente. Não percebo desdém e muito menos luxúria. Mas, o quê estou pensando???? Luxúria? Dos meus lábios ressecados saem um arremedo de sorriso. Este meu corpo somente desperta aversão e nojo.
Novamente cerro os meus olhos. E lentamente os torno a abrir. Diante da minha figura esquálida e disforme vislumbro uns rostos pueris sorrindo em minha direção. São aproximadamente seis meninas bem trajadas e muito bem nutridas. Falam algo entre elas. Em seguida lançam-me um piedoso sorriso. Aproximam-se. Tentam curar as minhas feridas e as minhas dores.
As forças me abandonam. Quase não vejo nada. Escuridão. Escuridão sem fim. De relance percebo uma fraca luz se aproximando. Tento fixar os meus olhos naquele ponto. A luz cada vez mais perto. Agora consigo distinguir. Três casais me encaram com desprezo, ódio, medo. Na mão trazem uma barra de ferro. Seus olhares lançam chispas demoníacas. Aproximam-se muito mais de mim, com as barras em punho e começam a desferir golpes raivosos em meu corpo já tão maltratado, ensangüentado e prestes a desfalecer. Encolho-me ainda mais para receber os golpes fatais.
A luz solar enche o meu quarto de claridade. Levanto da cama sorridente e feliz.


Leila Cristina Carvalho

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