Amanhecer Esquálido

O dia amanhece no filtro de papel
Na claridade do óculos dentro da bolsa.
Acorda qual um camelo estrábico
Um querubim paralítico.
O dia amanhece logo depois da veneziana
Um pouco aquém do sujeito que observa
E além daquilo que é percebido.
Acorda como um risco no vazio
Criando espaços que não existem
Ou fingem existir por pura insistência.
O dia amanhece num sol maduro
Prestes a ser colhido
Espremido até o caldo.

Um dia Vita saiu de casa bem cedinho. Arrumou -se com esmero, pegou algumas bolachas na cozinha e colocou dentro da sua bolsinha. Conversou com os seus mortos, ligou o rádio e escutou o jornal matinal, regou as plantas, deixou a louça por lavar, abriu as cortinas da casa, e saiu deixando a porta sem trancar. Desapareceu no espelho da esquina . Escreveu com batom um último verso: "Não me esperem para o jantar".

Marcia Frazão

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