(releitura do mesmo que foi um dia.)

É quente o chá enquanto espero minha cabeça resolver o caminho a seguir. Ainda agora que outros se abrem. Nem tantos. Mas um em especial que tremo só de pensar que se der o primeiro passo não vou ter como dizer enganos de retornar o pé e ai penso se ainda vou ver teus olhos depois da despedida. As imagens se misturam e eu não sei qual das figuras ri e qual chora minhas escolha e eu ainda não me decidi. Também nem sei se não é tudo ficção de quem vê muita televisão de madrugada e esquece dos telejornais TÃO importantes para desanuviar os pensamentos do que eu quero para encher meus olhos de sangue de nem sei quem morreu do outro lado do oceano e sinto muito e essas coisas e já não consigo dormir direito. O dia chega tão cedo que mal percebo que as horas passaram e o céu esqueceu de deixar o sol por mais algum tempo e apaga as luzes do mundo para me lembrar que é hora de fazer o chá e pensar letras que me corroeram durante as calçadas que andei segurando a pasta de tanta injustiça nesse mundo de homens meio imbecis. Ainda acho que não sou desse planeta embora o analista ria das minhas razões de não ter antenas ou cor lilás saindo dos poros e ainda espero um dia voltar para o meu lar que não este que sinto só de passagem para uma outra passagem infindável de mudanças e caixas e agora gatas que mal sabem meu nome e eu também não sei o nome que dei para cada uma delas. O chá devia estar frio mas a caneca está vazia e não lembro de ter bebido o doce e rio da minha pouca atenção e lembro que o telefone não tocou e também não sei se deveria ligar e dizer algumas coisas repetidas só pra fingir que também disso não lembro direito. O rádio pela décima vez toca a décima música do CD e eu ainda não cansei de cantar a mesma letra imaginando que você acompanha estalando os dedos num quase blues descompassado. E hoje talvez não seja só você que ocupe minhas letras e também não sei se ando tentando fugir e me esgueirar por outro caminho desconhecido só de pirraça para ver como teus olhos vão assustar se é que vão. Assustada estou em pensar que um dia pensaria o que ando pensando que não vem ao caso dizer às claras e também não é da conta de tantas outras pessoas que mal sabem como gosto do meu café e tentam dizer o que é melhor para comer numa tarde de grama verde e céu quase azul demais me fazendo rir até engasgar. Prefiro beber cerveja numa calçada qualquer cantando músicas do passado e fazendo poesia de macacos e mais cerveja misturada com latim e espanhol da canção da poeta que bebeu demais e foda-se porque ela canta para quem quiser ouvir. Enquanto a rua silencia os passos da madrugada de plena segunda-feira. A semana passa enquanto o chá esquenta na panela e eu ainda não me decidi.

Paula Cury

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