UM PERFEITO TRIÂNGULO
Ao mestre Machado, que tocava o triângulo com maestria...
Ela era do tipo sensual que à primeira vista nos fazia, por mais santos e não intencionais que fôssemos, olhar, voltar e babar, como se tivéssemos saído recentemente do Pinéu, naquela horinha mesma.
Mas o que a distinguia certamente, como boazuda (madames me desculpem) eram aqueles voluptuosos seios, arredondados que cabiam inteiros em antigas taças de champanhe. Eles enchiam sua (minha) mão.
Suas auréolas definidas e levemente rosadas olhando sempre para cima, apontavam o caminho do céu.
E como isso não bastasse, a infeliz mandou tatuar quase ao centro, uma delicada maçã, graciosa, vermelha, que já me enlouquecera por muitos e muitos anos, amém.
Essa fantástica criatura, para mim, só tinha um pequenino defeito, ela era minha, ou me expressando melhor para não dar uma impressão tão clara do meu machismo, ela era a minha mulher. Ela era o doce-da-casa, estão me entendendo?
Bem, em um belo dia, de delirante bebedeira, regado ao champanhe brasileiro, no Clube Pinheiros , com a ocasional turma das sextas-feiras, naquelas tardes de desafogo, conta-que-conta vantagem de mulher, e mais cerveja, emprego novo, lamúrias e vantagens mentirosas de mulher, e carro novo, e conquistas de mulher, e mulher, mulher, mulher para variar... E como se sabia que tudo não passava de lorotas, resolveu-se que todos iriam ter um caso verdadeiro para provar o machismo (nosso). Mas, com o horário da decência já comprometido, deixaram-se os pormenores para o telefone.
Aquela semana inteira discutimos o isso e o aquilo, em febre, aproveitando distrações das amadas esposas e tendo o maior cuidado, porque nenhuma delas era tonta ou de se jogar fora. O aparelho gastou-se. Em resumo, um belo caso futuro, por nós também sermos filhos de deus. O triângulo iria se repetir.
Escarafunchei novamente todos os hábitos da minha doce e gostosa Cecília, para me certificar de non error .
Aproveitei, invertendo o tradicional, suas ocasionais viagens de palestras ao Rio, idas ao dentista, enfim todo e qualquer afastamento da dileta. A caçada iria começar.
No bagageiro do carro, uma mala enorme de quinquilharias protegia outra maleta, onde levava meu arsenal de guerra. Terno impecável, uma camisa de gola alta, preta, para fazer tipo, meu quimono vermelho, para a próxima gueixa, o champanhe, e outros miúdos e importantes, para o que der e vier.
Fiquei impressionado. Como eu era bacana (por Baco!)
Usando a quase esquecida estratégia, muita coisa consegui pelo telefone e à moda da cadernetinha preta, isto é, telefonar para todas. Recados e recados. Em uma tarde especial, apareceu finalmente a grande chance, não iria perdê-la.
Único problema até aí era minha consciência. E tudo tão fácil! Fácil demais, eu diria. As coisas aconteciam sem perturbações. A dileta não era mais impedimento.
Acostumamo-nos a espaçar para quinze dias nossa cervejada, para obviamente termos mais tempo e concentração na caçada. Luta armada.
Arranjei finalmente uma mulher deliciosa, estranha, que me enlouquecia. Contei para todos. Eles também detalhavam: a minha é voluptuosa e conhecedora... ; a minha é frágil mas feiticeira...
Uma bela tarde, falando-se de um lugar para os encontros, Sérgio me deu um ótimo endereço. Resolvemos freqüentar, e, após a festança, reunímo-nos todos para sair e comer alguma coisa. Mas aconteceu um pererequê qualquer com a delicadíssima dama de meu amigo, que se recusou a estender a noitada, e ir conosco jantar, por causa do marido e horário - ela cochichou baixinho para meu amigo.
Mudamos então os planos e ao final, cada um foi para o seu lado. Dirigi-me, pois para o carro e antes que partissem, como de costume, voltei-me para um tchau final. Aquela mulher de meu amigo, de linhas estonteantes, e com o rosto meio coberto por um colorido lenço, virou-se discretamente para mim, e abrindo rapidamente a blusa mostrou-me seus enormes seios, e entre eles, mal percebi delineada... uma rubra maçãzinha.
Cármen Rocha