HISTÓRIA DE KNUT HANSUM

RESUMO

            Abel matara a mulher por acaso.
            Pretendera atirar em Lawrence, seu melhor amigo, que estava deitado com ela no paiol. A bala pegou em Ângela e ela agora repousa sob branca lápide americana.
            Abel viveu vida de vagabundo, porque Lawrence se declarou culpado. Abel deixara, porque Lawrence lhe parecera culpado, e lhe devia a vida, a ele, Abel.
            Houve Olda, que ele amava, e que dormiu com ele duas vezes para vingar-se do marido e ter um filho de um assassino — ele confessara tudo a ela que o desprezara por isso. OU amara deveras?
            Saldados todos os seus débitos, dirigiu-se a Kentucky, para contar tudo sobre o caso de Lawrence e redimir a sua memória, que a família de Lawrence lutava por isso, desde que fora executado pelo crime que não cometeu.

CONTINUAÇÃO

            Quando chegou a Kentucky e declarou tudo, foi um estardalhaço na imprensa. Que Abel era norueguês, esqueci-me de dizê-lo, ou de o dizer.
            Houve quem invocasse a Lei de Lynch. E torrado na cadeira elétrica seria, ora se seria. Do mesmo modo que Lawrence. Mas aí entrou na história o agente de publicidade, o milhardário Albertassi, vejam como foi. E esculhambou com a tragédia. O homem dos fiordes viu-se defendido na imprensa. Albertassi pagou dinheiro vivo para libertá-lo de uma condenação certa.
            Abel não entendia nada. O que ele queria, na vida, era viver em paz, e, se possível, ter o direito de fazer o mesmo ao morrer, mesmo que fosse torrado na cadeira elétrica.
            O cérebro eletrônico computou o resultado do júri popular: sete a dois a favor de Abel. Happy end com Albertassi de mocinho. Sem apelação. Mas o que fizera Albertassi agir daquela maneira? Resposta: sua absoluta falta de talento.
            Remorso, porque conseguira amealhar fortuna cometendo crimes. E um dia entendeu de redimir pela imprensa o que ele julgava um homem íntegro. Assassino, mas íntegro. E o pior é que depois disso recrudesceram as úlceras em Albertassi. Tomou rios e rios de leite. Enquanto Abel se tornava mais magro e melancólico.
            Um dia, Lola, madrasta de Abel, lhe escreveu de Oslo, que ele tivesse cuidado com a saúde, e que ela iria ser mãe outra vez, fecundada por Clemens, seu segundo marido; pois antes era viúva de Borgersen, pai de Abel. E assim viveram Albertassi e Abel, dentro de fossas, até quando terminaram os seus dias. M<as isso foi depois, quando a lei dos homens era ainda mais imperfeita.

Áureo Melo

Do livro: O muito bom sozinho, Record, 1994

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