Vânia

Loira, cabelos longos, olhos verdes; uma menina bonita. Tinha dois irmãos e uma irmã. A mãe de Vânia era separada e, por isto, todos na rua falavam mal dela. Eu achava que a mãe tinha cara de bruxa, mas gostava de brincar com Vânia. Jogo de dama, bolinha de gude ou amarelinha. No esconde-esconde ninguém nos achava, tínhamos esconderijos infalíveis.

Naquele dia escondemo-nos no corredor formado entre a parede da vizinha e as da casa que eu morava. O espaço era exíguo; trinta centímetros de largura por uns 4 de comprimento, cheio de tranqueiras: madeiras cheirando a mofo devido às chuvas constantes daquele verão, vasilhames cheios d´água, uma placa de zinco, uns ferros de construção e muitas telhas já cobertas pelo limo da água que vertera pelas mesmas.

Como sempre fazíamos quando nos escondíamos, levantamos a lamina de zinco e colocamos na entrada do esconderijo, mas desta vez havia mais entulho que de costume, fruto de uma recente reforma e a sobra da obra.

Os gritos da molecada continuavam lá fora: “ Lula atrás do poço, um dois, três; Marisa atrás da coluna, um , dois três...”. A cada criança encontrada, nós nos aproximávamos mais, de forma que não pudéssemos ser vistos pela fresta deixada entre a lamina e a parede.

Em algum momento meu coração começou a palpitar, o dela também. Não era o medo de ser achado. Os gritos ficaram pouco a pouco imperceptíveis, o medo desapareceu. Minha mão tocou os pequenos seios e lábios trêmulos se encostaram sem saber ao certo o que faziam. O tempo parou. Colados, meu coração se encontrou no compasso do dela e, síncronos, aceleraram e desaceleraram algumas vezes.

A noite caiu sem palavras; todos já haviam se recolhidos; a brincadeira acabara. Para eles.

Claudinei Silva

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