Contavam que seus antepassados eram canibais. Ele tinha muitas dúvidas e nunca levou a sério essas lendas que todas as famílias trazem ao longo dos anos.
Mas, apesar de ser indiferente aos comentários, às vezes surpeendia-se pensando no que falavam da avó de sua avó. Devido à sua beleza, contavam que ela foi obrigada a morar com um rústico fazendeiro que a domava e ensinava-lhe os bons costumes dos brancos da época às custas de pancadas.
Falavam que um dia estando só na fazenda, ela foi surpreendida assando um pequeno escravo numa sexta-feira. Uns passaram a falar que o sacrifício do negrinho era pruxaria. Outros, afirmavam que o pretinho assado era realmente para ser comido.
Apesar do parentesco, nada podia afirmar. Mas enquanto recordava este fato familiar, sorria prazeroso ao observar os engenhosos equipamentos que construía para o governo. Neles, podia assistir ao espetáculo dos gestos, ouvir os gritos angustiados das contorções lamentosas dos presos que sofriam, nos seus inventos de tortura.
Wandercy de Carvalho