CHARCO

          No silêncio penumbroso, vazio e profundo como o das entranhas da terra, vi o barco no charco com o fantasma do afogado.
          Seu sudário branco deixava o ar pesado e estático como em frias cavernas.
          Abandonei o anzol na água turva e fugi, apavorado, pelo chão escorregadio, onde nenhuma flor anulava as raízes negras.
          Eu ouvi, entre o tumulto de meu coração e respiro, o riso cruel e argentino do espectro em meu encalço.
          Na estrada, território de sol, o vulto retraiu-se e, quando o nó do terro afrouxou, lembrei-me dos peixes perdidos.
          A placa oxidada de "Pesca Proibida", que eu ignorara, preservava a fauna ou o fantasma?
          Um pássaro acima de meu automóvel, gritou que o oásis nirvânico não ficava nas imediações.

Cláudio Feldman

Do livro: Vila Magra, Ed. Taturana, SP, 2006

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