O mundo está mudando.
        A vida está mudando. Aliás, a vida sempre mudou, para pior, para melhor. Muita gente acha que o passado foi melhor, havia mais respeito, mais dignidade, mais inteligência, mais respeito, menos corpos expostos, mais pureza no olhar. Muita gente acha que hoje tudo é depravação, violência, sexo, despudor e colesterol.
        Quem tem razão? Possivelmente, nossos avós reclamavam de nossos pais e os nossos pais estão reclamando de nós e nós dos nossos adolescentes.
        Na verdade, o que trouxe uma nova forma de ver as coisas e de se relacionar com as pessoas e o mundo foi a sociedade de consumo. Ela modificou as expectativas, criou hábitos, fuzilou as relações pessoas, jogando-as ao chão, pois o que importa na sociedade de consumo é consumir e possuir e para consumir e possuir os padrões sociais de comportamento não servem.
        É um erro acreditar que poderemos ser éticos, morais e respeitosos numa sociedade que exige cada vez mais consumo e mais posse.
        Tudo está a mudar repentinamente.
        São os tempos, sempre atuais, sempre modernos, sempre atrasados.
        A Internet parece desfocar o tempo. Tudo é coisa do passado e tudo parece estar no futuro. Não importam as pessoas ou os desejos. A Internet é a flutuação entre o ser real e o ser virtual.
        Que maravilha!
        Compro, vendo, dialogo, comunico-me, pesquiso, vejo, interajo, formulo, navego, pirateio, ancoro, aporto, copio, sugo, leio, memorizo, aprendo, conheço, escuto, aprimoro, engordo, regateio, sofro e espero.
        O que mais a Internet poderá nos dar?
        O futuro parece não pertencer mais a Deus e sim aos próprios homens.
        Eu posso estar aí com você e posso estar em qualquer canto do planeta. O planeta tornou-se uma bola onde todos os pontos podem ser esquadrinhados, tão rapidamente quanto o piscar das minhas cansadas pálpebras.
        E para começar, faremos contato com as pessoas invisíveis que estão do outro lado das linhas telefônicas.
        Farei meu contato através de uma crônica interativa. Que tal?
        Contarei uma história e depois vocês a complementam. Isso mesmo!! Vocês a complementam.
        De que forma?
        O fim vocês mesmos criarão...
        Usem a imaginação... usem seus conhecimentos comunicativos. É só começar...
 

O MANEQUIM
 

        Lá estava ele, robusto, num provável regime de engorda. Comia, dormia, gastava, fazia quase tudo pelo computador. Depois que descobrira-o, sua vida tornou-se uma nova aventura, a aventura dos internautas, o mundo aos seus pés, a vida ao alcance de tudo que sempre sonhou, o fim da solidão.
        Aos 57 anos, aposentado, juiz desembargador. Homem sisudo, cuidadoso, já com suas manias e defeitos aflorados. Pantufas aos pés, cigarro, café sem cafeína, bolos e biscoitos, sobretudo, e muitos livros espalhados pelo chão, livros a respeito de tudo, absolutamente tudo.
        Um apartamento de aposentado. Um tabuleiro de xadrez, uma TV 29", um vizinho também aposentado, uma faxineira donzela e reprimida, um baú cheio de recordações, a geladeira entupida de colesterol e uma barriga que crescia a olhos vistos. Cabelos acizentados, voz máscula e atraente, profundas marcas de um homem que passou pela vida incólume, sem mácula e sem defeitos aparentes e públicos.
        Estão aí os ingredientes de um internauta na meia idade, com fortes tendências à menopausa cerebral, e com altos índices de sedentarismo. O que mais um homem pode desejar na vida?
        Sim, claro, um lugar ao céu que há muito não era mais de brigadeiro. Um céu sempre cinzento, num apartamento cinzento e com um amigo que joga xadrez, também cinzento e embolorado. Você sabe do que estou falando, um prédio no centro de qualquer metrópole, um apartamento com elevador enguiçado, ma janela imensa que dá para um buraco de rua, entupido de camelôs e pedintes, escadas sujas, um prédio que fora o baluarte da sociedade dos anos 60, hoje, uma decadência.
        Ele tinha tudo ao seu alcance, tudo mesmo. Tudo que um homem poderia ter estava ali aos seus pés. Todas as bugigangas possíveis e imagináveis. Era só descer e pagar a décima parte por qualquer produto, contrabandeado, evidente. Mas ele não apreciava aquela gente. Preferia comprar tudo pela Internet. Tudo mesmo. Até comida pronta, pela tela do monitor, comida de todos os tipos, comida e comida.
        Aquelas pessoas lá embaixo davam-lhe ojeriza, nojo, asco, pavor, medo. E o que mais? Não sei, qualquer coisa que significasse afastamento, distância, vômito, mal-estar.
        Pois bem, Dr. Venâncio foi um homem exemplar. Tão exemplar que nem sequer pensou em se casar. Nunca teve um caso amoroso por mais do que 30 minutos. Nunca tivera a sensação de acordar ao lado de uma mulher, a não ser sua mãe quando vinha visitá-lo, o que, naqueles tempos, era algo difícil. A velha caíra da escada e não podia mais andar. Dr. Venâncio nunca soube o que era a deliciosa sensação de um orgasmo a dois, jamais acariciara uma mulher nua, parecia que tinha nascido em uma prisão de segurança máxima, sem qualquer contato com sexo, a não ser o seu.
        Dr. Venâncio era um homem acima de qualquer suspeita. Conduta ilibada, vestimenta ilibada, os gestos ilibados. Tudo nele cheirava ética, moral e pijamas amanhecidos, cobertos de chocolate quente, derramados pelo sono inerte de horas diante do computador.
Dr. Venâncio tinha apenas um vício: jogar xadrez, ditosamente, meticulosamnte, exaustivamente, com seu vizinho, também aposentado, não juiz, nem advogado, um médico também solteiro, com costumes bem diferentes de Venâncio. Morgado era o exemplo oposto do desembargador. Um homem viril, másculo, sempre alerta com as mulheres, disposto a qualquer aventura, perdulário de preservativos, mestre nos carinhos e afagos, um homem atual, moderno, com o estetoscópio ligado ao seu próprio aparelho genital. Um homem com a sensibilidade do pulsar das asas de uma abelha e a volúpia de uma girafa no cio. Este era Morgado, o homem que sabia seduzir, que tinha a experiência da conquista.
Formavam uma dupla distinta, mas harmoniosa. Entendiam-se, apenas, no xadrez.
Morgado gostava das ruas, das gentes que iam e vinham, dos vendedores, dos gritos perdidos na multidão, das formigas que caminhavam por entre as sarjetas, dos moleques que atravessavam os semáforos com coisas miúdas, roubadas de alguma velha desdentada e, principalmente, das mulheres que faziam ponto no quarteirão oposto.
Venâncio, o desembargador, um homem calado, com as manias do mundo trancafiadas em seu apartamento, um homem com os óculos tão profundos quantos suas olheiras, um homem eficaz, estupidamente eficaz.
Morgado, o homem do mundo, o homem das coisas do mundo.
O xadrez era o elo que os unia, a ponte com a qual comunicavam-se, o processo silencioso que fazia suas mãos locomoverem-se em busca da vitória. Os dois precisavam daquilo, os dois viviam parte de suas vidas para o xadrez e para aquela companhia lúgubre, calada, estática, que um fazia ao outro.
O jogo era uma atitude filosófica diante da vida. Dominar o rei, destrui-lo a qualquer preço, engendrar urdir as melhores estratégias, sucumbir à inteligência do oponente, silenciar quando o tempo não mais lhe é favorável. Todo o imaginário de suas vidas estava contido naquele tabuleiro, era o sonho que se esvaía lentamente, quando as luzes da cidade chegavam com a eletricidade e os homens e as mulheres encontravam seus corpos no anonimato do prazer.
Mas Venâncio descobrira a Internet. Como foi dito, tudo fazia através dela. Comprava e falava. Conhecia gente, discutia e pesquisava. Uma noite precisou encontrar uma loja de departamentos. Você sabe, aquelas imensas lojas que vendem de tudo e nos deixam com redonda sensação de que estamos no interior de um mundo moderno, tão moderno que é virtual. Coisas novas, dando-nos a certeza de que o futuro chegara com a velocidade dos nossos próprios desejos. Uma loja virtual.
Precisava ele de uma calça e uma camisa novas. Onde encontrar? Pesquisou até cansar e enfim, por volta das 4 da manhã eis que surge à sua frente a loja e um fato estranho e curioso.
Venâncio tinha à sua disposição centenas de  opções, modelos, cores, marcas, tamanhos. Roupas para todos os gostos, épocas, gêneros e breguices. Era uma loja imensa, eletrônica, funcionando 24 horas ao dia, sem porteiro, sem segurança, sem crianças correndo, sem senhoras mastigando a dentadura, sem nada. Tudo limpo, arrumado, organizado. Apenas um provedor, alguém do outro lado, roncando às 4 da manhã e sem dar a mínima para as suas vontades. Provavelmente mão-de-obra barata à espera de um chamado, quem sabe da sua namorada ou de algum disque sexo.
O juiz ficou deslumbrado. Parecia estar em uma loja americana, sofisticadíssima. Monstruosa, medonhamente grande e excitante.
Às 4 da manhã? Um homem com seus respeitados 57 anos, vestido com o tradicional pijama de bolinhas e as pantufas de jacaré? Era ele, ali mesmo, maravilhado com a tecnologia  mais sofisticada do mundo? Era ele, naquela cadeira confortável, esperando para encontrar sua calça e sua camisa? Sim, era ele, e não um simples ser humano, não um adolescente qualquer em busca de sexo virtual, de bundas e tetas chapadas na tela de um monitor. Não senhor, era ele, o paladino da Internet, o juiz que deixara a toga para viver na toca.
Mas, como que por um encanto do destino, surge à sua frente algo que o deixa estarrecido, uma coisa de que jamais poderia esperar, sim, isso mesmo, aquilo de que nunca teve coragem de fazer, fez, ali, apaixonar-se, deslumbrar-se, afogar-se.
Era a coisa mais linda do mundo. Aquele vestido, aquelas curvas, aquela cor, tudo era perfeito, tudo era único. Aquele manequim houvera feito nele o milagre da transfiguração. Um babão, um solitário desembargador babão. E por quem? Por um manequim. Um manequim!! Ficou estupefato, dolorosamente paralisado. O tesão tomou conta do seu corpo. Parecia flutuar, o coração desembestou. Paralisou a imagem, copiou-a, recortou-a e depois colou-a no editor de fotografia. Aquilo era real? Um ser inerte mas real. O manequim da sua vida estava ao seu alcance. Um homem só, silencioso para o mundo, conhecera a felicidade na calada da noite.
Abaixo dos seus 15 andares, só se ouvem gritos e os estampidos dos tiros cruzando os becos e atingindo corpos desconhecidos, crivados de dor e solidão, mas ele, num picar de olhos, tendo em mãos os teclados, viu-se terrivelmente apaixonado, instantaneamente apaixonado por um Manequim.
Ali estava ele adorando um ser inanimado, morto, um manequim, Mas não era um manequim qualquer, Era o manequim da sua vida, Não tardou a amanhecer, Tudo ficara claro, o dia resplandecera e os raios penetravam pelas frestas da cortina da sala, Morgado viria para tomar o café às 9, já estava atrasado, mas ele sempre atrasa, nunca foi pontual, Um homem com sede de mulheres não pode ser pontual, nunca, Venâncio estava petrificado com a imagem do manequim, verdadeiramente apaixonado, um homem refém dos seus sentimentos, precisava contar ao Morgado o que tinha acontecido, mas Morgado não entenderia, jamais alguém poderia entender o que se passara com Venâncio, mas era necessário que o amigo soubesse de que ele, Venâncio, estava apaixonado, então quando o amigo entrou no apartamento, Venâncio disparou a dizer de sua enorme felicidade, Morgado imediatamente percebera o que estava acontecendo e questionou, você está apaixonado? Sim, estou, eu a conheci hoje de madrugada, amor à primeira vista, você pode acreditar nisso? Claro que posso, amor pelo computador, mas é lógico que eu posso acreditar, partindo de você eu posso, você vai me dizer que trepou com a sua paixão logo de cara, trocaram carícias pelo computador, um tocando a tela do outro, aposto até que chegaram ao orgasmo, e sem contar o chocolate que você deve ter derramado quando começou a se excitar, não é mesmo? Ah, e ela, provavelmente, tenha dito a você as coisas mais lindas via e-mail, não foi? Não diga isso, foi o amor, eu a descobri, preciso encontrá-la pessoalmente, eu estou enlouquecendo, é o êxtase que me deixou atônito, estou nas nuvens, nunca senti algo assim, com tal ímpeto, parece que o camelo que existia em mim deu lugar ao chimpanzé mais furioso, comedor de bananas, um chimpanzé pronto para saltar de picadeiro em picadeiro, é um vulcão dentro de mim, uma avalancha de emoções e sensações.
Morgado estava desconfiado, mas acreditava, os olhos do amigo estavam esbugalhados, eram os olhos de um homem entregue pela paixão, as mãos trêmulas, ele nunca ousara sequer ter às mãos um simples cigarro apagado, quanto mais uma mulher inteira, ou mesmo virtual, Morgado não entendia o que estava acontecendo, mas admitia que algo muito estranho e até maravilhoso parecia tomar conta de Venâncio, Puxa, disse Morgado, uma paixão dessa, nem mesmo eu que tive milhares nos meus braços, precisamos conhecê-la, vou ajudá-lo a conquistar essa coisa da natureza, esse amor maluco, Venâncio negou-se, recalcitrante, afinal, o amigo era o exemplo cabal da eficiência sexual, mesmo com 53 anos de idade, Não, ainda não, deixe que eu vá só, preciso fazer os primeiros contatos, depois você irá conhecê-la, que tal? Claro, claro, como você quiser.... como você quiser...
Venâncio precisava ir pessoalmente àquela loja, ver, tocar, apreciar aquele manequim, Vestiu sua melhor roupa, apesar de precisar de roupas novas, desceu o elevador e ganhou aquelas ruas de que tinha asco mortal, pegou o taxi e foi à loja que já não era mais virtual e sim real, Entrou, procurou o departamento, falou com a balconista, e enfim deparou-se com o manequim, O Manequim de verdade, o Manequim com aquele mesmo vestido vermelho, cobrindo seu corpo, suas curvas, o Manequim que lhe deu o sentido à sua vida.
O juiz quis saber o preço do manequim, a vendedora disse que não podia vendê-lo, ele insistiu, tanto que a insistência tornara-se inconveniência, Pediu então que mantivesse o Manequim no mesmo lugar com o mesmo vestido, a vendedora, uma mulher com seus 44 anos bem vividos não entendeu e continuava a não entender, Venâncio, por seu turno, fazia questão de que o Manequim e o vestido não fossem tirados dali, mas a vendedora argumentava que isso seria impossível, contra as regras do bom relacionamento comercial, contra o capitalismo, contra a relação de compra e venda, contra tudo que diz respeito às leis de mercado, contra, enfim, o desejo de consumir de deixar-se consumir, contra a sociedade de consumo de quem ela era a legítima representante, vestida com o uniforme do magazine e esperando fazer a felicidade e o endividamento de algumas pessoas naquele dia.
Decepcionado no primeiro momento, o desembargador foi embora, mas parou por alguns minutos na saída do departamento e ali ficou a contemplar seu objeto de desejo, ficou ali, como que pasmado com a descoberta, com o encontro mais importante de sua vida, ali permanecera até que foi alertado por um outro vendedor e então tomou o rumo de casa.
Voltou no dia seguinte, apreciando o monumento colocado no mesmo lugar, parado, imóvel, como uma virgem grega esculpida em sua homenagem, como uma relíquia da Idade Média, como a Língua de Santo Antônio, como as vestes de Jesus Cristo, contemplando, admirando sem parar, aproximou-se a vendedora e Venâncio, então, pediu para falar com gerente, queria alugar o Manequim e o vestido, mantendo-o ali no mesmo lugar, estaria disposto até a assinar um termo de compromisso, lavrado em cartório, especialista que era em documentos e burocracia judicial, mas o gerente também negara seu pedido, de certo o gerente aconselhara o juiz a procurar uma casa especializada em bonecos e manequins para ali comprar o que desejasse para o seu trabalho ou, quem sabe, sua taras pessoais, tudo estava indo mal, mas a vendedora, uma mulher aparentemente culta, de boa estatura, lábios carnudos, cabelos curtos como os de Beth Davis, com os olhos verdes e uma cor morena, percebeu algo diferente no jeito do desembargador, percebeu que sua voz a agravada sobremaneira, pediu então ao juiz que voltasse no dia seguinte, pois ela tentaria ajeitar as coisas, mas sua verdadeira intenção era a de vê-lo novamente.
Feito isso, Venâncio voltou uma dúzia de vezes ao magazine, e ela, a vendedora, cujo nome soava estranho mas delicado, Verônica, a santa que cobrira o rosto, Verônica, uma mulher também solteira, carente, com manias de limpeza, generosa e gostosa, um corpo escultural atrás daqueles 44 anos, uma juventude escondida, alguns sonhos velados, outros sepultados... Uma mulher pronta para o amor, o amor maduro, o sexo maduro, a vertigens das alturas emocionais... Verônica e Venâncio, que tal?
Mas Venâncio estava decidido a ficar com o Manequim, só tinha olhos para ele, ou para ela, não sei como definir aquele objeto de desejo, um verdadeiro objeto de desejo, Nada poderia demovê-lo de suas intenções, continuou insistindo para que o Manequim permanecesse no mesmo lugar, Verônica sugeriu que ele o comprasse e o levasse para casa, teria seu desejo ao alcance de suas mãos, enquanto durasse aquela paixão, paixão, por sinal, não revelada pelo juiz mas intencionalmente visível pela balconista fogosa, Mas como fazer isso se o pedido tinha sido negado pelo gerente?
Morgado excitava-se ao saber que o amigo saía todas as tardes para encontrar-se com o seu novo e único amor, Venâncio ainda escondia a verdade, mas não sabia por quanto tempo poderia fazê-lo, no entanto, as coisas seriam descobertas caso não agisse rapidamente, porém, não poderia levar o Manequim para dentro de seu apartamento, nem poderia continuar afetando a vida profissional de Verônica, a essa altura, já caída pelo desembargador das pantufas de jacaré.
Um impasse passional, essa era a realidade, O que fazer?
Pois bem, Verônica decidiu agir, adiou a decisão o quanto pôde e quanto mais o tempo passava, mas e mais ela tornava-se refém daquele homem de 57 anos, digamos, mais e mais ela se apaixonava por aquela voz e aquela doce insegurança de um senhor de meia-idade, que trazia nos olhos o espanto por estar apaixonado por um Manequim, sem contar uma leve queda por homens que carregavam barrigas avantajadas, um desejo escondido de quem sempre gostara de ver os homens mais velhos da família desfilando com suas barrigas no verão.
Um dia, Morgado insistiu tanto que Venâncio não teve escapatória, levou-o consigo à loja e lá encontraram-se com Verônica, certa estava, ao conhecê-la, de que ela era o grande amor escondido do amigo, mas mal sabia que escondia algo o nobre aposentado federal, o segredo de um Manequim, o segredo de uma vida inteira debruçada sobre aquele corpo sem voz, sem calor, apenas um corpo gelado e que servia para decorar os ambientes impessoais de uma loja de departamentos, apenas isso, uma Manequim que não servia para nada e que podia ser transportado de uma lado para outro... Nada de mais em apaixonar-se por um Manequim, um Manequim que fora descoberto pela Internet, isso parece tão normal, parece corriqueiro mesmo, afinal, os amores perderam o sentido, o toque não existe, as pessoas se divertem com as imagens, com as fotografias, com os movimentos de coisa alguma estampada na tela do computador, é assim mesmo, um Manequim que não tem vida, apenas para Venâncio, o aposentado que se masturba pensando naquele Manequim pelado, o Manequim nu...
Imagine a relação sexual de um Manequim com o seu dono!
Morgado ficou excitado ao conhecer Verônica e Verônica lisonjeada ao saber do amigo de Venâncio, Um triângulo amoroso, uma nova sensação carnal, uma aventura sem precedentes para aquela mulher de 44 anos? Não sabemos, o fato é que Venâncio fez de tudo para transparecer a imagem de que ele e a balconista estavam de caso, mas Morgado percebeu algo estranho no ar, sim, a forma pela qual o desembargador olhava para o Manequim, na certa esperando o momento oportuno de comprar aquele vestido para presenteá-lo à Verônica, que maravilha! Um verdadeiro amor nascia ali aos olhos de Morgado, um tarado invertebrado.
Passaram-se dias até que Verônica tomou a coragem de propor ao Venâncio um encontro, Um encontro? Sussurrou o juiz, Mas como isso pode ser? Eu, um cliente inútil, que não compra nada, você uma balconista linda mas que não é capaz de me vender nada e nós aqui, tentando encontrar uma solução, mas como posso encontrar-me com você? Verônica estava no seu limite, queria a todo custo um encontro, queria alguns momentos com aquela voz macia, aveludada, mas qual seria o argumento? Um encontro com você? Mas não era bem isso que eu estava esperando... Acalme-se, vou lhe dar o que você tanto espera... Ela já sabia das intenções de Venâncio, ele, por sua vez, acalentou a esperança de que a vendedora o trouxesse o Manequim embrulhado para presente, Verônica esperava poder reverter a situação, tinha a certeza de que ao vê-la longe daqueles balcões, sem aquele uniforme verde-caqui, com as unhas feitas, o vestido com dois palmos acima do joelho mudasse de idéia rapidamente.
Marcaram o dia e a hora e o local, meio a contragosto, Venâncio aceitou comerem uma pizza em seu próprio apartamento... O dia chegou, a hora chegou, a campainha tocou e lá estava ele pronto para o encontro final, a posse definitiva do que esperara a vida inteira, o fim do sofrimento, o fim da busca incansável, o fim das torturas masturbatórias, o fim das noites mal dormidas ao lado de quatro travesseiros moles e sem qualquer sensibilidade para o seu ronco desmesurado.
Mas... a surpresa....
 

CRIE O SEU FINAL VOCÊ VAI GOSTAR DA EXPERIÊNCIA...

DISCUTA A IMPORTÂNCIA DA INTERNET HOJE VAMOS REFLETIR SOBRE O AMOR NOS TEMPOS URBANOS

 

 

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