Meio Segundo de Amor Eterno
Afagavam as espinhas inerentes ao meu rosto luzes verdes, vermelhas;
outras, não sei ao certo se eram azuis ou roxas. Delineavam desenhos
cilíndricos, que ziguezagueavam pelas paredes à prova de
som. Refletiam-se com toda sua artificialidade, poucas vezes amorfas, raramente
dispersas, sobre minha roupa encharcada de suor e cerveja, produzindo uma
mistura abstrata de cores, que entorpecia-me os olhos já sonolentos.
Era madrugada. A música há tempos deixara de me embalar e
causava-me agora apenas um zumbido doloroso nos tímpanos. As pálpebras,
vez ou outra, teimavam em tombar sobre retinas irritadas, de umidade tépida,
mas eu não permitia que o apaixonado abraço dos cílios
durasse mais de meio segundo. Afastaram-se, o reflexo obscuro e assustador
do globo ocular se interpondo entre eles, talvez esqueceram-se, e a única
certeza que permaneceu foi a de que o sono um dia seria imbatível.
Fim.
Helton Aragão
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