COMEÇANDO PELO EPÍLOGO
            (Um nascimento... comemorando(?) o último Natal do Século e do Milênio.).
          O soldado olhou para o ventre de Eva e viu a intusmescência avançada; era simplesmente uma garota em torno de seus 16 anos, vagando com os olhos vidrados em meio a um bando de presos cujo destivo não seria outro: a morte!
          Num ímpeto último de piedade, pegou-a pelo braço, retirou-a daquele meio, colocou-a em seu jeep enquanto via, não tão passivo, as metralhadoras que cospiam fogo e balas sobre os corpos daqueles pobres coitados que gemendo caíam, uns sobre os outros, sem entender porque tinham que morrer.
          A tropa terminou o serviço, abandonou o local. José, era esse o nome do soldado, dirigiu-se ao seu jeep e, nele encontrou Erodes, seu par constante na guerra, um guerreiro, jovenzinho ainda, mas formado para se tornar um soldado frio, calculista e eliminador sem piedade dos que um dia poderiam vir a ser guerrilheiros um dia. Assim todos eram vistos: crianças, jovens e velhos.
          Erodes chegou no jeeep, excitado pela matança, agarrou Eva, um, vários beijos. Eva o repeliu, sem nenhuma palavra, já não falava mais. A fala de Erodes veio através dos bofetões, socos e pontapés.
Eis que o furúnculo começou a romper. Um bebê se fez anunciar. A intumescência quis vir a furo. Erodes batia e gritava:
          — Venha seu imbecil, ponha tua cabeça nesse mundo que eu quero explodí-la seu guerrilheirinho filho de uma puta!
          E a metralhadora apontava ameaçadoramente para as agonias de um parto, que avançado pelos maus tratos se fazia impertinente.
          Eva gemia, se contorcia, gritava, nem entendia o que acontecia ali, naquele momento, mas exasperava-se para se ver livre do soldado e daquele horror que lhe plantaram no ventre pela força, não do amor, mas do ódio de uma guerra.
          José, mais uma vez, num ímpeto de piedade, talvez, avançou sobre Erodes e, na desconversa, acabou matando-o. Era preciso fugir.
          Eis que surge, afinal, uma menininha, mais uma para ser estuprada pelo mundo. Eva a ignora. Não a quer. Não sabe que a ama. José a enrola em panos verdes do exército e sai em busca de auxílio. Onde? Uma família? Eva já não é mais recebida pelo pai, pelo irmão e pela mãe ( que mesmo em lágrimas é obrigada a lhe virar as costas), afinal ela é um sem-vergonha, uma puta, uma desonrada, não tem mais família.
          José e Eva emprendem uma luta pela sobrevivência, resta-lhes um contato, a Cruz Vermelha. Lá Eva e o bebê teriam o abrigo  necessário. O caminho é longo.
          Os dias passam. As mortes acontecem, a fuga prossegue. Perdem seu jeeep. Vem a chuva, o frio, a fome. Eva não tem leite. Era preciso buscá-lo nas cabras que ainda conseguiam sobreviver escondidas nas montanhas. Uma garrafa vazia e uma “camisinha (preservativo), que o soldado carregava, constiuíram a mamadeira do bebê.
          Um dia, bem cedo,  Eva saiu em busca de ajuda. Nem sabia onde e como, mas saiu, Não houve nunca uma palavra. Só olhares perdidos e o bebê.
          Eva, feia, magra, desengonçada, não servia mais para os prazeres dos solados. Não houve piedade. Para economizar balas, paus serviram para a matança de mais um grupo de supostos guerrilheiros, Eva estava lá e lá ficou para sempre.
          José seguiu sozinho com o bebê.
          Uma criança, mais uma, sem pai, sem mãe, sem família, chegou à cruz vermelha, foi deixada lá por alguém que teve que retornar à batalha, com o coração queimando e os olhos quase cegos pelas águas que continuaram insistindo em cair daquele corpo sofrido.
          No corpo do bebê, um bilhete:
          Sou Eva.
Lucy S. Bortolini Nazaro

 

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