Horário de expediente: das 9 às 14 horas
Chego às dez e meia.
— Para que seção
o senhor vai?
— Bem, eu... preciso da
cópia da planta de um terreno...
— O senhor não tem
crachá?
— Não sou funcionário.
— Então precisa deixar
um documento aqui.
Antes do crachá,
me entrega dois canhotos.
— Este, o senhor assina.
O outro, carimba lá em cima.
— Sobe? Décimo-quinto!
— É o terceiro elevador.
Onze e cinco. Hora de almoço.
— Só à uma
hora.
Volto à uma e meia.
— Não podemos atendê-lo
agora. Já estamos encerrando o expediente. O senhor não sabe
o horário da Prefeitura? Às duas horas fecha tudo! Agora
só amanhã, às nove.
Volto amanhã, às
nove. Ao décimo-quinto andar. Exponho meu problema.
— Ah, isso é só
com a Dona Hortência. Ela chega às dez horas. Se o senhor
quiser aguardar, fique à vontade.
Fico à vontade. Em
pé, do lado de fora do balcão.
— Rosana, você vai
buscar mais café? Traga sem açúcar!
— Sem açúcar
não dá! Todo mundo quer o café doce!
— Droga! Então vou
sair mais cedo hoje! Sem café amargo eu não fico!
— Gente, vocês viram
a roupa da Sônia? Que mau gosto! Parece roupa de velha!
— Ah, mas está certo!
Pela idade dela...
— Quantos anos ela tem?
— Trinta e cinco!
— Não acredito! É
sério?
— Claro! Você não
reparou o jeito dela?
— É verdade! Agora
estou lembrando! Eu bem achei que ela tinha uma cara meio esquisita! Ela
estava era disfarçando a idade!
Chega a Dona Hortência.
Junto com o café.
— Aquele rapaz quer falar
com a senhora.
— Você já terminou
os sapatinhos do bebê?
— Não, têm
uns pontos que eu não consegui fazer.
— Traga aqui que eu ensino.
Nesse meio tempo, vem ao
meu encontro.
— Eu preciso da xerox de
uma planta.
— É no oitavo andar.
Departamento de Pessoal. Deixa ver o tricô...
Departamento de Pessoal.
— É no décimo-quinto
andar. Setor de IPTU.
— Fui lá, eles me
mandaram pra cá...
— Espere um pouco. Eu vou
me informar.
Quinze minutos depois...
— Não é aqui,
não. É melhor o senhor perguntar no Protocolo.
Protocolo.
— É no setor de IPTU.
— Fui lá, falei com
Dona Hortência...
— Ah, não é
ela a encarregada. O senhor deve procurar a Dona Sônia.
Dona Sônia.
— O senhor vá à
Seção de Cadastro, fale com o Sr. José, e diga que
fui eu que mandei. Subindo a escada, segunda porta à direita.
Quase mandei que vá...
Cadastro.
— Sr. José!
— Qual deles?
— Olha, Dona Sônia
me mandou aqui, preciso da planta de um terreno.
— Aguarde um momento. O
Sr. José está na outra Seção. Vou ver se ele
pode atendê-lo.
Aguardo vários momentos.
Volta a funcionária.
— O Sr. José está
ocupado. Qual é o terreno?
Em poucos minutos, traz
a planta.
— É essa mesma!
Preciso de uma cópia. Aqui tem xerox?
— Sim, mas o senhor precisa
fazer um requerimento.
— Se tiver papel aí,
eu já faço.
Volta a moça com
um formulário.
— Tem que ser preenchido
à máquina. E juntar xerocópias autenticadas da escritura,
do registro e do IPTU. Os originais o senhor só precisa apresentar
na hora, para conferência.
Após alguns dias,
volto com todos os documentos. (Ninguém conferiu os originais.)
— Correto. Agora só
falta pagar as custas.
— E... onde paga?
— O Sr. tem aí a
guia?
— Que guia?
— Modelo 19. O Sr. compra
em qualquer papelaria, preenche à máquina e paga no banco,
aqui mesmo.
Lá mesmo. Um dia
depois. No cadastro.
— Sr. José! Preciso
da xerox de um lote de terreno. Já fiz o requerimento, paguei as
custas...
— Então é
só dar entrada no protocolo!
No protocolo.
— Precisa carimbar no Departamento
de IPTU.
Departamento de IPTU. A
funcionária carimba.
— Vou levar para o Diretor
assinar.
Volto ao Protocolo.
— O Sr. volta daqui a um
mês, para saber o número do processo.
— Processo?
— Processo Administrativo.
Volto dali a um mês.
No cadastro.
— É sobre o pedido
de uma xerox...
— Qual é o número
do processo?
— É o que vim saber.
— No protocolo eles dão.
Depois o Sr. volta.
Vou e volto.
— Não estou encontrando
o processo. Jussara!
— Estou ocupada! O que é?
— Aquele pedido de xerox...
— Veja se está em
cima da minha mesa...
Não. Está
dentro do arquivo.
— Seu pedido ainda não
foi apreciado.
Desolado e sem esperanças,
avistei em cima da mesa a planta de todo o loteamento. Resolvi ironizar:
— Essa planta, quanto é?
— Um momento, vou verificar.
— Fiquei à espera
da facada. Se apenas uma quadra me custara R$ 9,70, quanto me custarão
vinte quadras?
— Dez reais.
E saí de lá
com a planta dentro de um canudo e, ao observar o cilindro, cheguei à
conclusão de que, num círculo, todos os caminhos levam ao
mesmo lugar.