luto anônimo

1.

O homem desprega a lei do seu rosto. A face desfigurada surge, alma aflita por trás dela. O copo de chá vazio sobre a escrivaninha, o computador desligado, um incenso prestes ao ó e o grande silêncio.

Não mais se veria ao chão, estendido, totalmente inexpressivo, molusco ainda por ser.

2.

A luz desalinha os cabelos encaracolados Dela cheia de seios, alvorecendo. Estende a mão ao longe do passado, ninguém. Sobressalta-se. Agora sente o calafrio, ali despida, duplamente, no avesso do coito interrompido.

3.

A rua devolve a catástrofe. Por que não é pálida como o olhar Dele? Ruídos de uma renga.

4.

Deus escondeu-se para voltar. Quem o reconhecerá? Dele, divino cão postado na hora da sua morte, desconhece Dela. Fecha os olhos com potência, destila bolhas de escuro, tange a dor para a última derrota.

5.

Dele? E Dela sem resposta. É a lei. Dela, arrependida, deita-se sobre o morto, cavalga-o sem ansiedade. Ali será para sempre Dele.

Jorge Pieiro


 
 

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