Amor não correspondido

        — Eu era um pervertido, perdido em tentações, amante do dinheiro e das drogas. Vivia em desgraça, traindo minha família, desprezando meus amigos e convivendo com bandidos e prostitutas. As drogas eram minha felicidade: álcool, maconha, cocaína, crack, provei de tudo; bandido era minha profissão: mão armada, banco, seqüestro, assassinato, fiz de tudo e fui preso; o dinheiro era minha perdição: salário, extorsão, grana alta, tive muito e perdi tudo; as mulheres eram meu êxtase: monogamia, ménage-a-trois, swing, grupal, o sexo em todas as formas. Meus vícios me levaram ao fundo do poço. Fiquei sem amigos, sem família, sem ninguém.
        Pausa. Momento de suspense. Um livro preto na mão esquerda, o microfone na direita. Olha profundamente as poucas pessoas sentadas na arquibancada de cimento. A maior parte é de desocupados. Uns bocejam; outros fazem comentários jocosos; um ou dois olham com interesse o orador.
        — Mas, meus irmãos, nem tudo estava perdido. Encontrei uma pessoa que me fez perceber a minha vida perdida e me indicou o caminho certo. E sabem qual era esse caminho?!
        Suspense. Nesse momento, José passava por ali. Parou e ficou observando.
        — Não sabem o caminho, meus irmãos?! Esse era um caminho que me levou a uma força poderosa, a um amor capaz de me reorientar para a luz, para a salvação, para a vida correta. Essa força tem um nome, meus irmãos! E sabem qual é esse nome?!!
        Aos gritos do orador, alguns acordaram. José continuava observando atentamente.
        — O seu nome era Jesus!! Jesus Cristo, nosso Senhor!!!
        José se abaixa e agarra uma pedra no chão. O tiro é certeiro, acerta em cheio a testa do orador. O sangue é vermelho. Vermelho como a paixão.

Hermes Falk


 
 

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