O Aniversário

    Final de tarde, Dirce comenta com sua colega.
    — Ai, hoje o Celso vem me buscar!
    — Sério? Tô louca para conhecer ele!
    — Nossa, ele é um pão!
    — Do jeito que você fala nele...deve ser mesmo!
    — Olha ele aí!
    — Aonde?
    — Esse corcel chegando...o vermelho.
    — Nossa, mas ele é bonitão mesmo!
    — Eu não te disse menina? Tchau!
    Entra no carro, fazendo inveja para a amiga que vai embora de ônibus.
    — Oi minha flor. Como foi de trabalho?
    — Eu estou morrendo de dor de cabeça, trabalhei no caixa hoje!
    — Quer que eu pare na farmácia?
    — Não precisa, em casa deve ter alguma coisa. Também tô com uma dor no pé, tô com uma unha encravada e eu coloquei essa sandália que tá me matando.
    — Eu tenho que passar na minha mãe antes. Vou pegar um carnê que ela me pediu para pagar.
    — Pô Celso, vê se não demora!
    Ele bate palmas no portão, agitando os vira-latas no quintal.
    — Oi mãe!
    — Oi Dico, tudo bem filho?
    — Tudo mãe! Eu estou atrasado, tenho que levar a Dirce para casa. Ela não está muito bem.
    — Tá bom, venham com mais calma para tomar um café com cuque de banana!
    — Beijo mãe. Tchau!
    — Celso, porque sua mãe lhe chama de Dico?
     Sei lá, é desde pequeno! Todo mundo me chamava assim.
    — Mas o que tem haver Celso com Dico?
    — Não sei Dirce!
    — Como não sabe? Deve fazer mais de trinta anos que você tem esse apelido!
    — Dirce...você acha que a sua mãe gostou de mim? – pergunta mudando de assunto.
    — Acho que sim, por quê? Ela nem te viu direito.
    — Só para saber.
    — Ela acha que eu sou muito nova, mas dezessete anos de diferença nem é tanto! Ela tava namorando esses dias com um véio com mais de cinqüenta!
    — Aquele do opala?
    — Não, é um outro que tinha um importado!
    — Mas eu vi ela ontem mesmo com o cara do opala!
    — Ele vive atrás dela...onde você viu a minha mãe?
    — Nem me lembro, foi no centro, eu acho.
    — Deixe eu tirar essa sandália...ai, ai, ai.
    — Está entregue. Quer que eu entre?
     Acho que o chuveiro está estragado. Você sabe arrumar?
    — Sei.
    Dirce entra com as sandálias nas mãos.
    — Oi mãe. Estou morta de cansada!
    — Oi filha. Oi Celso, tudo bom?
    — Tudo.
    — Celso, por um acaso você não é sobrinho do Ernani? – pergunta a futura sogra tagarela.
    — Não, por quê? Não conheço nenhum Ernani.
    — Você é parecido com alguém que eu conheço...acho que aqui da vila!
    — Eu estou morando aqui não faz nem um ano!
    — Ah é! Onde você morava?
    — Eu tava morando em Wenceslau. Morei lá dezessete anos!
    — Já fiz o curativo no meu pé! — grita do quarto —  Mãe, você tem que pedir para a vó ajudar a fazer os     salgadinhos pro meu aniversário!
    — Com quantos anos você está Celso?
    — Trinta e sete, Dona Salete.
    — Pois é, como o tempo passa, a Dirce já vai fazer dezoito semana que vem! E não me chame de dona, sou mais nova que você. Eu tô com trinta e três!
    — Pois é, quando eu vi a senhora, quero dizer, você, eu achei que eram irmãs!
    — Pois é, todo mundo pensa!
    — Amor, vamos! – fala com Celso ao sair do quarto.
    — Vamos Dircinha!
    — Tchau mãe.
    — Tchau para vocês!
    Final de tarde, o casal sai para namorar.
    — Salete! Salete! – gritam no portão.
    — Oh, mãe! Pra que ficá gritando aí no portão? Entra logo!
    — Cadê a Dircinha?
    — Saiu com o namorado.
    — Como que ele é, filha?
    — O nome dele é Celso, parece ser um bom moço, trabalhador, mas é mais velho.
    — Isso é normal né filha! Você quem o diga!
    — Ai mãe, não é bem assim!
    — Sei...
    — Temos que fazer os salgadinhos para a festa da Dirce!
    — Quantos anos ela tá fazendo mesmo?
    — Dezoito, mãe.
    — Nossa, como o tempo passa!
    — Todo ano a senhora fala a mesma coisa!
    Oito de agosto, a data tão esperada por Dirce...
    — Ai mãe, estou tão feliz, agora sou de maior!
    — Que bom né filha! Parabéns, estou muito feliz por você!
    — Parabéns Dircinha!
    — Obrigada vó! Daqui a pouco chega todo mundo.
    Quatro horas da tarde.
    — Todo mundo já chegou, menos o Celso! Estou preocupada!
    — Não se preocupe filha! Daqui a pouco ele che... olha ele aí, não é o carro dele lá fora?
    Sai correndo em direção ao portão, para receber o namorado e o presente.
    — Parabéns meu amor! Você está linda!
    — Obrigada, eu já tava preocupada!
    — Quero que você conheça a minha avozinha!
    — Vó, quero que você conheça o meu namorado. Este é o Celso!
    A pobre velha caiu sentada no chão e deu uma crise de choro. Tremia igual vara verde.
    —Meu Deus, é ele! Esse monstro...
    — Calma mãe, o que está acontecendo?
    — Salete, foi esse monstro que estuprou você quando tinha quinze anos!
    — Claro que não mãe, tenha calma! Não pode ser!
    — Filha você não viu a cara dele, mas eu fui na delegacia!
    — Mãe, aquele era um tal de Dico!
    Ele, que após tanto tempo, esperava não ser mais reconhecido, também fica paralisado. Dirce em estado de choque, olha para o seu amor.
    — Pai?

Rafael Tortato


 
 

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